Não tem prá ninguém. É ele, ele e ele. E não é do Galo da Madrugada que estou falando não… Também, sim, da alegoria. Mas antes tenho mais é que tirar o chapéu para Leopoldo Nóbrega (de camisa estampada na foto). Nunca, antes dele, um artista foi tão amplo na visão social, comunitária, inclusiva e ambiental para confeccionar a escultura gigantesca que, todos os anos, ornamenta a Ponte Duarte Coelho, no centro do Recife, para dar as boas vindas aos foliões. Ou seja, Leopoldo tem se mostrado um artista maior do que pensam que ele é – ou seria – e uma grande figura humana. Um verdadeiro cidadão. Porque ele extrapola o sentido estético da arte. E a alegoria do Galo, que em 2025 terá 32 metros de altura, é a maior prova disso. Então, vamos aplaudi-lo e também a a designer Germana Xavier, Produtora Executiva e como ele, gestora do Espaço Multicultural Arte Plenna, que idealiza, confecciona e dá novos significados ao Galo que será cinco metros maior do que no ano passado.
Inteiramente confeccionado com materiais reaproveitados – como garrafas PET –o Galo traz, ainda, outras mensagens sobre as quais falaremos adiante. Primeiro vamos à questão ambiental, pois talvez seja a sustentabilidade o principal conceito que norteia a criação da alegoria, em 2025. O Galão será ferramenta de educação ambiental, já que todos os cidadãos podem colaborar para a doação de garrafas PET de dois litros, que irão compor a vestimenta de 2025. (Os locais onde podem ser realizadas doações até o dia 22 já foram divulgados, inclusive aqui no #OxeRecife). “Esta ação permite que o cidadão seja co-responsável e faça parte da criação da escultura. Ao depositar as garrafas PET nos pontos de doação, além de se tornar parte integrante e ativa da maior obra de arte a céu aberto do Carnaval do Brasil, o cidadão contribui com o meio ambiente e torna a cidade mais resiliente ao impacto das águas de córregos, canais e rios, destinos finais de descartes incorretos do lixo que produzimos”, reflete Leopoldo.
Tem mais: a convite da agremiação Galo da Madrugada, todas as etapas de construção da escultura estão sendo rastreadas para que possa ser realizada a compensação do crédito de carbono na edição do próximo ano. Será a primeira vez que a maior obra de arte do carnaval do Recife terá esta iniciativa – reduzindo os impactos produtivos como marco no ano da COP 30 no Brasil. E isso é muito bom. Além da pegada ambiental forte – economia circular, ecologia, sustentabilidade – outras temáticas sociais permeiam as inspirações que deram origem ao projeto artístico da indumentária da escultura em 2025 como inclusão, cidadania e cultura popular.
Assim, ao mesmo tempo que o Galo pedirá respeito e deferência à inclusão da população neurodivergente (portadores do TEA), pois ostenta um colar utilizado por autistas, também saúda o meio ambiente, lembrando os jardins históricos do Recife que têm a assinatura de Roberto Burle Marx. Homenageia, ainda, os catadores de materiais recicláveis como protagonistas da educação ambiental, assim como reverencia manifestações culturais e agremiações carnavalescas:o Frevo, os Maracatus de Baque Solto e os brinquedos de La Ursa – lembrando esse legado tão valioso dos povos ciganos em Pernambuco. A paleta de cores do Galo Cidadão Ecológico traz um mix de tons quentes que revisitam o frevo e importantes manifestações de brinquedos carnavalescos.
Assim, o branco, verde, amarelo, o azul e o vermelho, presentes em sombrinhas de frevo, nos brinquedos da La Ursa, bem como nas golas de Maracatu Rural vestem a alegoria. As asas, revestidas de azul, fazem menção à cor alusiva à população autista, que também será rememorada no colar de quebra-cabeças, identificação mundial para pessoas com autismo. Os pés do Galo Cidadão Ecológico ganham sandálias no estilo Muxarabi (com amarrações nos ‘tornozelos’) feitas de pneus reciclados. Inclusive, as sandálias serão replicadas em tamanho humano pelo grupo 3Rs, para revenda aos foliões, cuja renda será destinada às entidades que trabalham com o combate à fome. A seus pés, o Galo contará com um jardim cenográfico upcycle com cerca de 100 flores confeccionadas com materiais descartados. O jardim gigante é inspirado na obra do paisagista Burle Marx e sua relevante contribuição para os jardins urbanos como espaço de arte e tão presentes no Recife, Cidade Parque e cujos espaços abertos e de convivência urbana ao longo do Capibaribe dialogam com o Gigante, que reina sobre as águas do maior dos rios que cruzam a cidade.
O estilo alegórico do design que veste a alegoria é inspirado no pontilhismo armorial dos bordados que adornam os maracatus de Baque Solto, típicos da Zona da Mata Norte de Pernambuco. A escolha enaltece uma das tradições populares mais exuberantes e artesanais para além do carnaval. O figurino buscou um design paramétrico, termo utilizado para codificação matemática das formas geométricas através de programas de computador, em um mapeamento 3D, que ajudará no posicionamento exato de milhares de garrafas que revestirão a escultura de 32 metros de altura e 8 toneladas. Ou seja, a alegoria do Galo da Madrugada não é apenas uma obra de arte. Torna-se, uma ferramenta de cidadania para nós, os humanos, sejamos mais cidadãos.
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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Divulgação
