Torturado em praça pública em 1964, Gregório Bezerra ganha homenagens

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Os aliados o chamavam de “o homem de ferro e flor”. Para os inimigos, lideranças da direita, ele era um agitador, o terror da família e ameaça à propriedade privada. Para as pessoas que o conheceram pessoalmente – cheguei a entrevistá-lo várias vezes, inclusive quando retornou do exílio – Gregório Bezerra mostrava duas características: coerência política e ideológica pois ao contrário de muito político oportunista, jamais vendeu sua consciência aos poderosos de plantão. Tinha, também, um lado doce como pessoa. Adorava crianças e as crianças o adoravam, em tempos em que os comunistas eram tidos como “devorador de criancinhas”. Lembram dessa expressão horrorosa? Fui testemunha de quanto era carinhoso com os pequenos. Sempre rebelde, Gregório talvez tenha sido o único “inimigo do regime” (a ditadura militar implantada em 1964) a ser torturado em praça pública.

Sim, ele foi torturado na Praça de Casa Forte, uma cena de barbárie que foi assistida inclusive por crianças e adolescentes que estudavam no Colégio Sagrada Família, ali localizado. Entre 2023 e 2024, o Recife ganhou duas estátuas dedicadas ao líder comunista. E nessa quinta-feira (5/12), o saudoso líder ganha duas lembranças. É que a Secretaria Executiva de Direitos Humanos do Recife (por meio da Gerência de Articulação e Direitos Humanos, Memória e Verdade) realiza um ato “em homenagem ao político e defensor da democracia Gregório Bezerra”. A iniciativa integra a programação da 11ª Jornada de Direitos Humanos e ocorre hoje em dois momentos. A primeira etapa da solenidade será às 14h30, com uma visita guiada ao recém assentado busto de Gregório Bezerra na Praça de Casa Forte. Que fica, aliás, defronte da Praça, ao lado do antigo Hospital Gomes Maranhão.

Das janelas do colégio desse prédio ainda existente, o Sagrada Família, estudantes assistiram as torturas

Já às 16h, a homenagem seguirá para o Memorial da Democracia Fernando Vasconcelos Coelho, no Sítio da Trindade (no bairro de Casa Amarela), onde está localizado outro busto em tributo ao líder político. O Memorial da Democracia, para os que não sabem, é uma iniciativa pioneira, pois trata-se do primeiro do Brasil a lembrar as atrocidades cometidas nas masmorras da ditadura no século passado. E os locais escolhidos para a ação possuem simbolismo muito forte.  A Praça de Casa Forte ocupa um lugar central na história de Gregório Bezerra e do País. No dia 2 de abril de 1964, durante os primeiros dias do golpe militar, Gregório foi submetido a uma das mais brutais sessões públicas de tortura já registradas no país.

Após ser preso na cidade de Cortês e transferido para o Forte das Cinco Pontas, no Recife, ele foi levado ao Quartel de Moto-Mecanização do Exército, situado no bairro de Casa Forte, onde sofreu espancamentos, foi amarrado por cordas ao pescoço, e foi forçado a caminhar sobre britas após seus pés serem mergulhados em ácido. O episódio, assistido por moradores e freiras que tentaram intervir, tornou-se um marco da violência do regime militar e da resiliência de Gregório Bezerra (eu já não estudava no Sagrada Família, mas lembro das ex-coleguinhas que moravam na minha rua comentando o fato. Éramos crianças e não entendíamos ainda o que acontecia).   Mesmo sob tortura, ele jamais delatou seus companheiros de luta.

Torturado em praça pública, Gregório Bezerra foi recolhido à antiga Casa de Detenção,atual Casa da Cultura

Órfão, Gregório Bezerra(1900 – 1983) enfrentou a fome e começou a trabalhar ainda criança como empregado doméstico, em casa de família aristocrata. Sua missão era lavar pinicos dos patrões, segundo relata em suas memórias, o que o deixava revoltado diante do abismo entre as classes sociais em que ele vivia e à que servia. Foi analfabeto na infância e na adolescência, e aprendeu a ler já adulto, tornando-se sargento do Exército e militante do Partido Comunista do Brasil (PCB).

Tornou-se líder do Levante Comunista em Pernambuco, deputado federal mais votado do estado em 1946, e um incansável defensor dos direitos trabalhistas. Preso diversas vezes, foi libertado em 1969 em uma troca de prisioneiros articulada após o sequestro do embaixador americano no Brasil. Exilado durante a ditadura, Gregório Bezerra voltou ao país após a anistia de 1979, deixando como legado sua inabalável luta pela democracia e pelos direitos humanos. Sua história é lembrada em poemas, livros, músicas e filmes, consolidando-o como um símbolo de resistência.

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SERVIÇO
O quê: Ato político em homenagem a Gregório Bezerra
Quando: Quinta-feira, 5 de dezembro
Horário: 14h30: Visita ao busto na Praça de Casa Forte; 16h: Visita ao busto no Memorial da Democracia, Sítio Trindade

Texto e fotos: Letícia Lins / #OxeRecife e redes sociais (Gregório)

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One comment

  1. Gregório Bezerra deve ser homenageado infinitamente. Foi o maior mártir – arrisco dizer – da luta contra o golpe militar, a ditadura e contra as injustiças sociais desse país. As homenagens que recebe hoje são merecidíssimas. E o dia em que foi torturado em praça pública merece ser celebrado todos os anos nas escolas e instituições públicas do estado. Gregório Bezerra, nome que não pode ser esquecido.

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