Durante muito tempo, eles foram de grande utilidade no interior Nordeste, sendo usados para o transporte dos sertanejos e também para carregar água, principalmente nas grandes secas. Depois, estiveram perto da extinção na Caatinga, onde eram abatidos em um grande frigorífico, que exportava suas carnes para o Japão. O extermínio virou um escândalo ecológico, houve protestos e o abate foi suspenso. E os jumentos voltaram a aparecer nas estradas poeirentas do Sertão, mas diante da grande “oferta” perderam valor de mercado. No final do século passado, em alguns locais, valiam tanto quanto um guaiamum. Agora, os jumentos voltam a ser alvo de cobiça, e… correm novos riscos. No centro da questão, outro país asiático: a China. Em defesa do jumento “nosso irmão” – como ressaltavam o cantor Luiz Gonzaga 1912-1989) e o Padre Antônio Vieira (1919-2003), defensor da espécie – haverá protestos pela vida dos animais neste domingo (30/7).
Manifestações contra a matança de jumentos ocorrerão em pelo menos quinze cidades, incluindo o Recife. É que o tão bíblico animal (teria conduzido Jesus em sua entrada triunfal em Jerusalém, no domingo anterior à sua morte) corre risco. Pois os jumentos estão sendo dizimados para atender à demanda de um produto chamado ejiao, extraído do colágeno de sua pele. De acordo com a medicina tradicional chinesa, o ejiao auxilia na circulação sanguínea e no tratamento de problemas como a anemia. Diz a representante da The Donkey Sanctuary na América Latina, Patrícia Tatemoto, que não há evidência científica sobre as propriedades medicinais do material. Bióloga, ela lembra que para atender à demanda, seriam necessárias 4,8 milhões de peles de jumento por ano. “É uma demanda impraticável, pois não há essa quantidade de animais no mundo e como a produção regulamentada nas fazendas tem custo proibitivo, a atividade ocorre de forma extrativista”, diz a bióloga. Pelo que se vê, a situação é a mesma do passado, quando os jumentos eram capturados nas rodovias e sítios para o abate e chegaram perto da extinção, o que motivou o Padre Antônio Vieira a organizar um protesto na cidade de Petrolina, no Sertão de Pernambuco.
Tatemoto acrescenta: “Esse comércio internacional lucrativo para um seleto grupo de empresários chineses, tem implicado em modus operandi de captura e compra, transporte irregular, confinamento e abate para exportação do couro”. De acordo com os ambientalistas, os exterminadores de jumentos já passaram por 19 países da África e alguns das Américas Latina, de onde foram expulsos pelas autoridades locais e entidades protetoras da espécie. Segundo as entidades, até fêmeas prenhes são sacrificadas. “O abate desses animais é cruel e absurdo. É um crime que irá extinguir os jumentos. Eles sofrem durante o transporte, além de serem acondicionados em locais com pouca água e comida. Estimamos que 20% morram pelos maus-tratos a caminho dos matadouros”, alerta a advogada e coordenadora da Frente Nacional de Defesa dos Jumentos, Gislane Junqueira Brandão. Muitas ações rolam na Justiça contra a matança dos jumentos.
Um lembrete: o ejiao pode ser cultivado em laboratório, sem que os animais precisem sacrificados. Por conta da demanda, a população da espécie vem caindo a cada ano.
“Os jumentos são animais resilientes que participaram ativamente na construção do país, sobretudo no Nordeste. Importantes artistas brasileiros como Luiz Gonzaga, Chico Buarque e Cândido Portinari já reconheceram estes animais em suas obras como pertencentes ao patrimônio cultural imaterial nacional”, lembram os organizadores dos protestos. Os animais até figuram em livro que virou um clássico sobre a espécie: “O Jumento nosso irmão”, do Padre Antônio Vieira, reunindo textos populares, eruditos, religiosos e profanos sobre o animal, e que dedicou sua vida em defesa asinino.
Veja os locais onde haverá protestos contra o abate de jumentos:
Recife/PE, Centro Cultural Cais do Sertão – Armazen 10, Av. Alfredo Lisboa, s/n, às 15h, dia 30/07
Maceió/AL – aguardando confirmação de local e horário), dia 30/07
Natal – RN Parque das Dunas – Bosque dos Namorados, Av. Alm. Alexandrino de Alencar, s/n – Tirol, às 15h, dia 30/07
Florianópolis – SC – Praça Hercilio Luz – Centro, às 14h dia 30/07
São Paulo – SP – Av. Paulista (em frente ao MASP) às 14h, dia 30/07
Rio de Janeiro – RJ – Local: Orla de Copacabana (em frente ao Copacabana Palace) às 14h, dia 30/07
Salvador – BA – Local: Farol da Barra, às 9:30h, dia 30/07
Aracaju (SE) – Local: Parque da Sementeira, às 16h, dia 30/07
São Luís – MA – Local: Av. Litorânea (em frente a Barraca do Henrique) às 15h, dia 30/07
Fortaleza – CE – Local: Av. Beira Mar (em frente ao mercado de peixes), às 16h, dia 30/07
Porto Alegre – RS – Parque Farroupilha – Redenção (em frente ao expedicionário), às 10h, dia 30/07
Rio Grande – RS – Balneário Cassino na Av. Rio Grande (junto ao multipalco), às 14h, dia 30/07
Curitiba – PR – Praça Santos Andrade, centro, às 15h, dia 30/07
Belo Horizonte – MG – Av Afonso Pena, 1055, Centro – Feira Hippie (concentração em frente ao antigo Mercado das Flores), às 10h, dia 30/07
Brasília – DF – Eixão, altura da 208 – Norte, às 12h, dia 30/07
Confira mais informações sobre a Caatinga, onde os jumentos ainda são de grande utilidade.
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