Ainda hoje, com certa frequência, a gente vê notícias de destruição de terreiros, normalmente praticada por correntes mais radicais de igrejas evangélicas. Mas a intolerância religiosa já foi bem maior, inclusive durante o Estado Novo (1937-1945), quando esta era oficial e implacável. No Recife, um dos focos de resistência foi o extinto terreiro Ilê Axé Yemanjá Sabá Abassamí, que era liderado por Elizabeth de França Ferreira, a Mãe Betinha.
Para resgatar a memória da ialorixá, será lançada nesse Dia Internacional da Mulher, a exposição virtual “Memória de Afeto e Orisha”, que referencia Mãe Betinha. O lançamento ocorre às 10h desse sábado (07/03), com roda de conversa no Endereço eletrônico: https://www.youtube.com/@memoriaorisha. Betinha virou um símbolo da resistência do candomblé à intolerância religiosa, praticada por autoridades da época. Acusada de ser “escória da sociedade” por sua fé, chegou a ser presa várias vezes, mas sempre revidava aos interrogadores da polícia, afirmando ser “uma cidadã, não uma ladra ou assassina para estar presa”.
Além de se mostrar incansável na preservação do culto e das tradições do xangô recifense ao longo dos mais de sessenta anos em que esteve à frente da comunidade do Ilê Axé Yemanjá Sabá Abassamí, ela terminou conquistando o respeito das autoridades policiais e políticas, e atraiu olhares internacionais para o bairro de Casa Amarela, então um dos mais populosos e carentes da Região Metropolitana do Recife. Seu nome talvez pudesse ser Mulher Coragem. Betinha era filha de Luiz de França Ferreira, dono do Jornal O Correio e chefe da Coletoria da Companhia Ferroviária da Great West. Ela também quebrou paradigmas ao assumir, com naturalidade e dignidade, a missão de mãe solo numa época em que os olhares da sociedade julgavam e discriminavam aquelas que exerciam a maternidade sem a presença de um marido.
O designer gráfico Erick Ramon, um dos idealizadores da exposição, destaca a importância do projeto para preservar a memória tanto do terreiro quanto da líder espiritual. “A gente quer fazer com que a memória desse terreiro não morra, porque ele foi muito forte na região enquanto espaço de cura e modificou a vida de muitas pessoas a ponto de atrair até olhares internacionais. E também para que a pessoa de Mãe Betinha não caia no apagamento histórico, já que o apagamento da figura da mulher é algo que a gente vê muito nos candomblés de Pernambuco”, explica. Para Erick, propor uma exposição centrada na figura de uma mulher que lutou contra a opressão do estado para que sua religião permanecesse viva é fundamental para combater o racismo de gênero e religioso nos dias de hoje.

As fotografias e vídeos que compõem a exposição foram selecionadas do acervo pessoal das filhas e filhos de santo do terreiro de Mãe Betinha, sobretudo do babalorixá José Amaro, que participará da roda de conversa de lançamento, nesse sábado (08/03/2024). A curadoria da mostra ficou a cargo de Edelson Moraes, que organizou os registros de modo a refletir o espaço sagrado da casa como local de acolhida sustentada em três pilares: o prédio, as pessoas e as cerimônias religiosas. O site da exposição conta ainda com audiodescrição, promovendo a acessibilidade para pessoas com deficiência visual.
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Serviço:
Exposição virtual Memórias e afetos de Orisha
Endereço eletrônico: www.memoriaorisha.com.br
Roda de Conversa de lançamento:
Data: 8/03/2025
Horário: 10h
Endereço eletrônico: https://www.youtube.com/@memoriaorisha
Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Álbum de família