Considerado como um dos maiores pintores de Pernambuco, Ismael Caldas vira tema de livro

Compartilhe nas redes sociais…

Naquela época, éramos todos jovens. Sendo que uns, do curso básico de pintura da então Escola de Belas Artes, eram ainda mais jovens. E eu me incluía nessa turma. Tinha então 16 anos, mas gostava de andar com os que faziam o curso de nível universitário, que já estavam em um outro patamar. Lembro-me bem de Jairo Arcoverde, Roberto Lúcio, Ypiranga Filho (1936-2019), José Maria Gouveia, Ismael Caldas (1944-2016).  Os dois últimos diziam ser irmãos, mas eram tão diferentes que até hoje não sei se eram mesmo. Também estavam sempre entre estes, os pintores Sérgio Lemos e Fernando Guerra. Sérgio é artista até hoje, mas Fernando optou pela pecuária, cuidando das terras da família na Região Agreste de Pernambuco. As mulheres eram poucas no grupo, e ficava sempre conosco a poetisa Tereza Tenório (1949-2020) que, naqueles tempos, vivia a recitar para nós os seus então ainda desconhecidos mas já bem maduros versos.

Não sei se Tereza também estudava pintura ou se ia lá para desfrutar dos diálogos com tão interessantes figuras, pois não me lembro  de a ter visto em alguma aula de pintura. À distância, eu ficava olhando os contatos dos futuros artistas com outros, já consagrados, que iam dar aulas, analisar os trabalhos, dar notas. O dia mais divertido da semana era o sábado porque nem sempre havia aula, mas todo mundo ia à Escola. Motivo: as manhãs se prolongavam até o final da tarde, com muita conversa em Olinda para onde costumávamos seguir em animado grupo. Andávamos e descíamos ladeiras, víamos os ateliês da cidade histórica, fazíamos algumas inocentes molecagens pelas ruas. Sendo que Jairo Arcoverde era o mais moleque. Coisas de adolescentes e adultos jovens. De Ismael Caldas, lembro-me também dos trabalhos que produzia, quando ainda estudava lá. Ficava impressionada. Tempos depois, seria um artista consagrado, chegando a ser considerado por Francisco Brennand (1927-2019), como “o maior pintor pernambucano”. A definição encontra-se em uma carta de Brennand enviada a Ismael. Os dois eram amigos, brigavam de vez em quando e logo selavam a paz.

Auto retrato de Ismael Caldas, no período em que esteve com a perna quebrada e engessada

A definição de Brennand é uma das informações que consta no livro “Ismael Caldas”, que será lançado na noite dessa quinta-feira (17/8), no Museu do Estado de Pernambuco (MEPE). Editado pela Companhia Editora de Pernambuco (Cepe) em parceria com o Instituto Córdula e incentivo do Funcultura, o volume foi organizado por Raul Córdula, como forma de perpetuar a grandiosa obra de Ismael. “Artista excepcional, ele tem o trabalho muito reconhecido no Recife, e o livro é o melhor veículo para preservar a memória de um artista como ele”, diz Córdula. Ismael costumava ressaltar que “as pessoas gritam demais e dizem pouco”. E preferia a pintura à fala, como forma de expressão. Nem por isso, segundo Córdula, deixou de ser um contestador, principalmente nos sombrios anos de chumbo.

A sátira à política nacional, portanto, esteve presente em sua arte quando criou imagens disformes de generais, em alusão aos personagens da ditadura militar de então (que durou de 1964 a 1985). A  temática também esteve presente na Série Corruptos, Corruptos. Produziu quadros épicos, como a Batalha dos Guararapes. Mas ele também retratou cenas do cotidiano, bonecos, anões grotescos, figuras femininas e até  objetos que nos passam despercebidos no ambiente doméstico. Como, por exemplo, um utensílio tão prosaico quanto um porta-alfinetes que não deixa de ter lá sua beleza. Ismael se definia curiosamente como um “pintante” e ao longo de sua carreira produziu várias séries sobre temas diversos. Até mesmo uma sobre cadeiras, utensílio tão presente ao nosso doméstico dia a dia. Outras séries foram: A loja dos disfarces, Mulher Cambiante, Enigmas de Dodgson, Manual do Perfeito Gatuno, A Sala de Cerimônias, Suinoteca, A guarda do entusiasmo, Vinte personagens para uma peça fictícia, As meninas, Memória do Parque. Também dedicou série a uma de suas paixões: o Jazz.

“Ideias práticas para um construtor de brinquedos” foi uma das séries de Ismael Caldas: drama, ironia,

O lançamento do livro ocorre a partir das  19h dessa quinta-feira, no MEPE, à Avenida Rui Barbosa, 960, Graças. A entrada é franca, mas quem quiser comprar o livro não vai se arrepender. Preço: R$ 200.

Leia também
Mercado Eufrásio Barbosa tem lançamento de livro e exposição sobre Adão Pinheiro
A lírica de Carlos Augusto Lira
Primeiro a fome, depois a lua”. últimos dias para ver a expô de José Cláudio
Exposição cápsula sobre futebol dentro da  Alto Retrato, de Paulo Bruscky
Cavani Rosas na Christal Galeria
Terra Brasilis inicia atividade com expô, na quinta, 20 de outubro
População reclama de falta de conservação no mural de Lula Cardoso Ayres
Exposição “Semprenunca fomos tão modernos”
O artista pernambucano que participou da Semana de Arte Moderna
Marco Zero expõe inéditos de João Câmara
Samico, o devorador de estrelas
Tereza Costa Rego volta à cena
A inesquecível Tereza Costa Rego
Cultura brasileira mais pobre, sem Tereza Costa Rego, grande artista
Tereza Costa Rego no Sebo da Casa Azul
Tereza, uma mulher em três tempos.
Tereza vive. Homenagem merecida à grande artista em várias cidades brasileiras
Joias para rainhas e princesas em livro
História de Janete Costa em livro
Janete Costa: Galeria urbana com artesãos
Batalha do Guararapes, de Francisco Brennand: decadência e tombamento
Outra obra de Francisco Brennand sofre degradação
Pronto projeto para recuperação do Parque das Esculturas  no Marco Zero
Depois de pilhado à exaustão, Parque das Esculturas vai ter segurança 24 horas
O drama do Parque de Esculturas: Proteger o patrimônio não é caro
Instituto Oficina Francisco Brennand: O Recife não merece tamanho desrespeito
Parque das Esculturas pilhado. Cadê a serpente que estava aqui?
Parque das Esculturas e indignação: “Esse post é um pedido de socorro”
Marginais roubam tudo, de escultura de uma tonelada a trator. Punição…
Arte monumental & natureza generosa
Que breu é esse na Torre de Cristal?
Torre de Cristal não pode apagar: Trevas onde devia haver luzes
Mural sobre Restauração Pernambucana precisa de reparos e não de remendos
Fórum Arte Cidadania movimenta o Recife

Serviço
Lançamento do livro “Ismael Caldas”
Quando: 17 de agosto, quinta-feira
Horário: 19h
Local: Museu do Estado de Pernambuco (MEPE)
Endereço: Avenida Rui Barbosa, 960, Graças, Recife
Entrada franca
Preço do livro: R$ 200

Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Divulgação / Cepe

 

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.