Todos os dias, em minha caminhada matinal, passo em frente a esta casa branca da foto acima, construída no início do século passado, e que ficou longo tempo desocupada e quase em ruínas. Há algumas semanas, notei umas peças de cerâmica em um nicho, no seu pequeno terraço. Pensei: “Finalmente, habitada e com um morador de bom gosto”. No último sábado, recebi a visita de Ricardo Bandeira de Melo. Ele chegara com um convite para vernissage na Galeria Terra Brasilis, que inaugura na quinta-feira, 20 de outubro, às 19h.
Detalhe, a Terra Brasilis funciona na mesma casa que tanto me chamava a atenção. Ela fica à Avenida Dezessete de Agosto, 2640, no bairro do Monteiro, localizado entre o de Casa Forte e Apipucos. Porém, a comunidade costuma chamar o local, também, de Casa Forte. Ricardo pertence a uma família com ascendência na aristocracia açucareira do Nordeste. Ainda criança, convivia com as obras de arte que decoravam paredes das casas dos pais, tios, avós. Passou, então, a ter um gosto especial pelas artes plásticas e terminou optando pela profissão de galerista. Ele e a Terra Brasilis, portanto, começam juntos. O também estudante de Direito decidiu antecipar-se à conclusão da reforma que vem fazendo no imóvel, colocando – para já – algumas obras para a exposição que começa amanhã. E que marca o início do funcionamento da mais nova galeria da cidade.
Entre os expositores com obras à venda, encontram-se Gabriel Petribu, Mané Tatu, Tereza Perman, Romero Andrade Lima, Pietro Severi, Alexandre Almeida, Cavani Rosas, Gil Vicente. Também estarão expostas obras de modernistas famosos de Pernambuco e São Paulo. “A Galeria Terra Brasilis nasce com a proposta de enaltecer nossa arte brasileira, mas com foco no grande berço, que é Pernambuco”, comenta Ricardo, que dotou a casa antiga de nova iluminação, ar condicionado e destinou dois dos seus cinco cômodos para expôs. E um outro para depósito do acervo.
Ele manteve a estrutura original, preservou os tradicionais pisos hidráulicos, mas outras mudanças pretendidas ainda não foram realizadas. Estive lá hoje e há muitas obras em andamento. Inclusive no imenso quintal, que possui mil metros quadrados, coisa rara no Recife urbano do século 21. Em dias de vernissage, os visitantes podem estacionar no imóvel vizinho (número 2656), onde funciona o Samadhi Restaurante. O acervo da Terra Brasilis é, em sua maior parte, de aquisição recente. Porém há obras de aquisições mais antigas, como as de artistas representativos do modernismo brasileiro, tais como Djanira (1914-1979), Portinari (1903-1962), Cícero Dias (1907-2003) e Lula Cardoso Ayres (1910-1987). Estes dois últimos estão à venda, porém o de Cícero é uma serigrafia.
Entre estes quadros de propriedade mais antigos, há aqueles que pertencem ao patrimônio familiar e integram as memórias afetivas de filhos e netos de Valquíria Maroja Bandeira de Melo, avó de Ricardo, que tem 91 anos. Nos tempos de estudante, morava no Rio de Janeiro, onde era interna no tradicional Colégio Sacre Coeur. Um dos tios de Valquíria morava no Copacabana Palace, onde convivia com muitos artistas, incluindo Portinari. Nas folgas dos estudos, Valquíria costumava visitar o tio. “Ela pegava o bonde e passava o fim de semana com ele no Hotel”, conta Ricardo. Um dia, lá chegando com o caderno sob o braço, Portinari pediu o material escolar e disse que lhe faria uma surpresa. Era o desenho da própria Valquíria. “Portinari só desenhou retratos de duas mulheres, minha avó e Carmem Mayrink Veiga”, diz Ricardo, referindo-se à mais famosa e inesquecível “locomotiva” da alta sociedade carioca.
Para conferir as novidades sobre a Galeria Terra Brasilis, consulte o Serviço após o “Leia também” . A mostra pode ser visitada até 4 de novembro, quando será desmontada para preparação do primeiro leilão da Terra Brasilis, que reverterá para o Aria Social, projeto social que está completando três décadas.
Leia também
População reclama de falta de conservação no mural de Lula Cardoso Ayres
Exposição “Semprenunca fomos tão modernos”
O artista pernambucano que participou da Semana de Arte Moderna
Marco Zero expõe inéditos de João Câmara
Samico, o devorador de estrelas
Tereza Costa Rego volta à cena
A inesquecível Tereza Costa Rego
Cultura brasileira mais pobre, sem Tereza Costa Rego, grande artista
Tereza Costa Rego no Sebo da Casa Azul
Tereza, uma mulher em três tempos.
Tereza vive. Homenagem merecida à grande artista em várias cidades brasileiras
Joias para rainhas e princesas em livro
História de Janete Costa em livro
Janete Costa: Galeria urbana com artesãos
Batalha do Guararapes, de Francisco Brennand: decadência e tombamento
Outra obra de Francisco Brennand sofre degradação
Pronto projeto para recuperação do Parque das Esculturas no Marco Zero
epois de pilhado à exaustão, Parque das Esculturas vai ter segurança 24 horas
O drama do Parque de Esculturas: Proteger o patrimônio não é caro
Instituto Oficina Francisco Brennand: O Recife não merece tamanho desrespeito
Parque das Esculturas pilhado. Cadê a serpente que estava aqui?
Parque das Esculturas e indignação: “Esse post é um pedido de socorro”
Marginais roubam tudo, de escultura de uma tonelada a trator. Punição…
Arte monumental & natureza generosa
Que breu é esse na Torre de Cristal?
Torre de Cristal não pode apagar: Trevas onde devia haver luzes
Mural sobre Restauração Pernambucana precisa de reparos e não de remendos
Fórum Arte Cidadania movimenta o Recife
Estátua de Ariano no chão
Serviço
Evento: Inauguração e exposição na Galeria Terra Basilis
Quando: Quinta–feira, 20 de outubro
Onde: Av 17 de Agosto, 2640
Horário: 19h
Visitação: Até 4 de novembro, de segunda a sexta, das 10h às 19h. Aos sábados, das 10 às 15h.
Acesso gratuito
Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Letícia Lins e Divulgação / Galeria Terra Brasilis