Quase santo, Dom da Paz ganha livro escrito pelo último padre que ele ordenou

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“Ex-padre”, o jornalista Félix Filho (foto acima à esquerda) está relançando um livro que havia se esgotado desde 2018. A iniciativa é da Companhia Editora de Pernambuco (Cepe). E é muito oportuna, pois a publicação é sobre ninguém menos que Helder Câmara (1909-1999), o chamado Dom da Paz.  Intransigente defensor dos direitos humanos, um dos idealizadores da Teologia da Libertação, perseguido pela ditadura e o brasileiro que mais recebeu indicações ao Prêmio Nobel da Paz, o religioso está prestes a ser reconhecido como santo pelo Vaticano.

Já Félix foi o último padre da Arquidiocese de Olinda e Recife ordenado por Dom Helder, em agosto de 1984. Após três anos de sua ordenação, tornou-se vigário de Ponte dos Carvalhos, distrito do município do Cabo de Santo Agostinho, onde conheceu sua futura esposa, Fernanda. Hoje é um dos mais combativos militantes da causa dos padres casados, considerados pela Igreja como desertores, denominados ex-padres como forma de desacreditá-los.

O livro Além das ideias – Histórias de vida de Dom Helder Camara, conta 36 fatos cotidianos do bispo, prestes a ser reconhecido santo pelo Vaticano. “Minha intenção é apresentar o nosso querido Dom ao maior número de pessoas, de todas as classes sociais. Gostaríamos que conhecessem Dom Helder como nós, na sua intimidade, no relacionamento com as pessoas, no cotidiano”, diz o autor. Numa das histórias, Félix conta que Dom Helder não possuía carro e nem costumava usufruir do automóvel oficial da Arquidiocese, um direito à disposição do arcebispado. Quando precisava, saía às ruas em busca de táxi. Mas na maioria das vezes não chegava a andar nem 100 metros sem que um ou mais cidadãos motorizados parassem para lhe oferecer carona. Os amigos o advertiam do perigo em aceitar a oferta naqueles tempos sombrios de repressão política, quando vivia sob ameaça constante imposta pelas forças de repressão que sustentavam a ditadura. O Dom nunca se intimidou,  nem mesmo quando sua casa foi metralhada.

Félix conta: “Num dia, ao sair de casa a pé, como sempre fazia para pegar um táxi na esquina mais próxima, notou que um carro diminuiu a velocidade e se aproximou da calçada. Colocando a cabeça para fora do veículo e dirigindo-se ao arcebispo, o motorista gritou: ‘seu filho da p…’. Dom Helder não se fez de rogado. Olhou calmamente para o motorista e respondeu de pronto, com um bom humor que lhe era característico nessas situações: – Deus te leve, meu querido irmão. A mulher do motorista olhou para o marido e disse: ‘Taí o que você queria!.’’

De outra vez, o Dom foi celebrar uma missa, mas percebeu que o frade que ia fazê-lo estava cansado e sem interessem em ajudá-lo. Dirigindo-se ao religioso, o Dom despediu o franciscano. E dise: “Não se inquiete, meu bom irmão. Tenho comigo o meu anjo da guarda, e ele me auxiliará na missa. O frade não acreditou e desdenhando repetiu, com sorriso nos lábios: “Seu anjo? Seu anjo?”. Neste momento, conforme relato do próprio Helder, aconteceu algo maravilhoso. “Pareceu-me ocorrer algum fenômeno elétrico… a igreja se viu tomada por intensa luminosidade e o pobre franciscano tombou de joelhos, tremendo e chorando o tempo todo”. Seria um dos milagres que podem entra em análise para levar o Dom à condição de Santo?

Félix Filho é jornalista profissional, trabalhou no Diário de Pernambuco, Jornal do Brasil, Estadão, TV Manchete, TV Globo Recife e Secretaria de Imprensa do Governo de Pernambuco. Cursou também Teologia no Instituto de Teologia do Recife (Iter). Foi o último padre ordenado por Dom Helder Camara na Arquidiocese de Olinda e Recife. Por duas vezes foi diretor do Arquivo Público Estadual Jordão Emerenciano. Membro do Comitê Nacional do Programa Memória do Mundo da Unesco. Cineasta com participação ativa no Movimento Super-8 de Pernambuco. Félix também é autor do livro Um retiro popular – Quaresma e Semana Santa em Escada (Paulinas, 1987).

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SERVIÇO
O livro já está à venda nas livrarias da Cepe (Museu do Estado, Centro de Artesanato de Pernambuco, Mercado Eufrásio Barbosa e na sede, em Santo Amaro)

Preço do livro: R$ 35,00 (impresso) e R$ 14,00 (e-book)

Texto:  Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Divulgação / Cepe

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