É triste, mas é verdade. O drama do secular edifício em estilo eclético, onde funcionou o Diário de Pernambuco (“o mais antigo jornal em circulação da América Latina”), não tem data para terminar. Infelizmente. É que o Governo do Estado informou, através da Fundarpe, que ainda não tem ideia do que vai fazer com ele. Não há informação nem mesmo sobre uma eventual restauração do imóvel. Caindo aos pedaços, o prédio faz parte não só da história da cidade, como também integra as memórias afetivas da população, ao lado de outros monumentos icônicos do Recife como a Faculdade de Direito (foto abaixo), o Ginásio Pernambucano, o Teatro Santa Isabel, o Teatro do Parque e o Mercado de São José.
O problema é que enquanto os imóveis acima citados, também localizados no Centro da cidade, encontram-se em pleno funcionamento, aquele que serviu de sede ao velho Diário de Pernambuco está em ruínas. E o que é pior, sem destino certo. Não há, sequer, notícia de restauração tão urgentemente necessária. No último passeio realizado pelo Grupo Caminhadas Domingueiras, todos os integrantes lamentaram o abandono da antiga sede do DP, ao passar pela Praça da Independência, onde fica o imóvel. Na verdade, tomaram um choque. A decadência é apenas o retrato da situação dramática em que se encontram bairros como Santo Antônio, Boa Vista e São José, que passam por processo de esvaziamento que toma conta do cada vez mais decadente e abandonado centro do cidade, para os quais as autoridades ainda não encontraram um jeito eficiente de revitalizar.
Fundado em 1825, o DP foi o vigésimo quarto jornal a surgir, desde o início oficial da imprensa no Estado. Mas só instalou-se no prédio da Praça da Independência em 1903, onde funcionou até 2004, quando mudou-se para o bairro de Santo Amaro, de onde saiu em 2016 para o Recife Antigo. Ao longo de sua trajetória, o DP sobreviveu a censuras, empastelamentos e até foi proibido de circular, como ocorreu algumas vezes entre 1911 e 1945. Sendo este o ano que mais marcou a sua história, quando o estudante Demócrito de Souza Filho foi assassinado a tiros na sacada do prédio pela polícia política de Getúlio Vargas, no dia 3 de março. (No mesmo protesto contra a ditadura, morreu o carvoeiro Manoel Elias, que estava na Praça da Independência. A redação do DP foi invadida, porque forças getulistas não queriam permitir que o jornal publicasse o assassinato do estudante que defendia a candidatura do Brigadeiro Eduardo Gomes à presidência. Por conta da confusão, o DP ficou sem circular entre os dias 4 de março e 8 de abril, voltando às bancas por força de mandado judicial. Sete meses depois, Getúlio Vargas seria deposto).
Logo após ser desocupado, o prédio do Diário de Pernambuco foi comprado pelo Estado, na gestão do Governador Jarbas Vasconcelos, em 2004. O seu objetivo era instalar no edifício todo o acervo do Arquivo Público de Pernambuco (que atualmente funciona na Rua do Imperador, porém possui documentos armazenados em outros locais, como na Rua Imperial). Posteriormente decreto de desapropriação incorporava o prédio ao patrimônio da Fundarpe, que tombou o edifício. Em 2011, o então Governador Eduardo Campos prometeu transferir o prédio para o Porto Digital, que instituiu concurso nacional para revitalização do edifício. O vencedor chegou a ser divulgado. Ao substituir Campos, o então Governador João Lyra Neto ratificou a promessa, e determinou à Secretaria de Administração (SAD) que providenciasse a burocracia para a cessão do prédio ao Porto Digital. Mas este informou ao #OxeRecife que o processo nunca foi concluído, motivo pelo qual desistiu da intenção de ocupar e reformar o edifício. E nada mais falou. O projeto do escritório vencedor do concurso (Estevan Barin Moreira, RS), foi então engavetado.
Portanto a responsabilidade pelo destino do prédio não está mais nas mãos da Secretaria da Administração, mas da Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco. Em nota lacônica, a Fundarpe informa ao #OxeRecife que “a nova gestão estadual está avaliando uma destinação para o imóvel da antiga sede do Diário de Pernambuco, localizada no Bairro de Santo Antônio”. Já a SAD, confirma que “o imóvel encontra-se incorporado ao patrimônio da Fundarpe”, mas que mesmo assim “ para o processo de preservação patrimonial do prédio, realizou a remoção de entulho, instalou tapumes e conta atualmente com um posto de vigilância armada 24h no local”. Isso depois que marginais e vândalos já haviam levado, portas, janelas e até o relógio que durante muitos anos marcou o compasso da vida de Santo Antônio, quando o bairro “às cinco da tarde, mais se assemelha a um festim”, como descrevia Carlos Pena Filho no “Guia Prático da Cidade do Recife”.
O “festim”, no entanto, virou tristeza. Hoje, a estátua do poeta, na Praça da Independência, onde fica o velho prédio, complementa a imagem de abandono do Centro. E caso o Governo não tome logo uma providência, a ruína do prédio histórico só fará aumentar, como sempre acontece com velhos imóveis, quando desocupados e sem uso. O que seria uma lástima a mais na preservação da memória de um Recife cada vez mais verticalizado e que dá as costas para a própria história. Agora,uma pergunta. Será que a torre dele não corre o risco de tombar, como aconteceu (por falta de manutenção), em 2018, com a da Faculdade de Direito do Recife, também inaugurada no início do século passado. Abaixo você confere outras informações sobre patrimônio histórico e artístico do Recife, e pode saber o que aconteceu com a torre da Faculdade de Direito, após tombar.
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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Letícia Lins e Acervo #OxeRecife