O que tem a ver a Companhia Editora de Pernambuco (Cepe) e o caminho para que o Dom da Paz vire Santo? Pode parecer estranho. Mas não é, pois tem tudo a ver. É que documentos que foram escritos pelo Arcebispo Emérito da Arquidiocese de Olinda e Recife, Dom Hélder Câmara (1909-1999) e que vão auxiliar no processo de canonização do religioso estão sendo impressos pela Cepe, para que sejam encaminhados ao Vaticano. A remessa – com escritos já divulgados e outras inéditos – ocorrerá ainda este ano.
A informação é da Cepe e de Frei Jociel Gomes, postulador da causa de canonização do Dom. Grande parte desse arquivo foi digitalizado pela empresa há três anos e encontra-se disponível para leitura no site do Acervo Cepe (acervocepe.com.br). O acervo pertence ao Instituto Dom Hélder Câmara, criado para preservar a rica e histórica memória do religioso. A remessa da papelada atende a uma solicitação da Congregação das Causas dos Santos, em Roma. É lá que os documentos serão analisados para posterior emissão de decreto de validade jurídica. O IDHeC selecionou e diagramou para impressão 52.800 imagens, entre 91.627 já digitalizadas pela Cepe. É o que informa Vanuzia Brito, bibliotecária do Instituto. São cinco coleções que congregam cartas circulares, programas de rádio, discursos, correspondências e hemeroteca.
“Nós seguimos na identificação de outros documentos de interesse do Vaticano, guardados pelo IDHeC, e estamos encaminhando todos para digitalização na Cepe”, diz a bibliotecária. No momento, há mais 51 cadernos de meditação (9.500 páginas) e 23 livros (2.753 páginas) para serem reproduzidos. O IDHeC recebe os arquivos digitalizados e se encarrega de organizar e diagramar, antes de devolvê-los à Cepe para o serviço de impressão. “Estamos fazendo a impressão gratuitamente, é o nosso apoio”, diz o superintendente do setor de Digitalização, Gestão e Guarda de Documentos da Cepe, Igor Burgos. Segundo ele, a impressão dos volumes, denominados Escritos de Dom Helder Camara: Processo de Beatificação e Canonização, está prevista para terminar em dois meses. A ação também conta com a parceria da Arquidiocese de Olinda e Recife.

O Vaticano vai receber documentos com a assinatura de dom Helder e outros que indiquem a autoria dele de alguma forma, afirma Vanuzia Brito. “As cartas circulares, manuscritas, são correspondências que ele manteve com um grupo de pessoas. Há, também, correspondências pessoais. Vamos enviar discursos inéditos que ele escreveu para uma determinada ocasião e na hora decidiu falar de improviso, além de discursos em suas várias versões até ficar pronto”, detalha ela. A hemeroteca não contém escritos do arcebispo emérito, mas reúne recortes de jornais, revistas e boletins com matérias que citam o nome do religioso.
De acordo com a bibliotecária, os documentos deixam transparecer a repressão que Dom Hélder sofreu, durante a ditadura militar brasileira quando até a simples publicação do seu nome na imprensa era proibida em todo o Brasil. Postulador da causa da canonização de dom Helder, o frade capuchinho Jociel Gomes disse que a documentação seguirá para o Vaticano pelo malote diplomático da Nunciatura Apostólica, sediada em Brasília. “Quando o processo foi entregue ao Vaticano, em 2019, anexamos 300 documentos. Agora eles solicitaram tudo o que dom Helder escreveu, vamos enviar assim que o material estiver reunido”, diz. Dom Hélder foi muito perseguido durante a ditadura, mas nunca baixou a voz para denunciar os atentados contra os direitos humanos que ocorriam no Brasil pós-1964 e também as injustiças sociais. A humilde casa em que vivia ao lado da Igreja das Fronteiras (foto) chegou a ser metralhada por apoiadores da ditadura, em 1968. Dom Hélder é, até hoje, o brasileiro com maior número de indicações ao Prêmio Nobel da Paz.
Abaixo, você confere informações sobre Igreja Católica, censura e também sobre governantes militares.
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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Foto: Acervo da Arquidiocese de Olinda e Recife