Quase santo, Helder Camara é tema de novo livro: “O Dom que vive em nós”

Ele está  quase virando Santo.  O processo de sua canonização já está  em curso com quase toda a documentação sendo examinada pelo Vaticano. Todo o material a respeito foi digitalizado pela Companhia Editora de Pernambuco (Cepe). Agora a Cepe anuncia o lançamento do livro  O Dom que vive em nós – Helder Camara e a igreja no meio do povo. A noite de autógrafos ocorre a partir das 18h  do dia 23 de novembro na sede da Arquidiocese de Olinda e Recife, no  prédio mais conhecido como  Palácio dos Manguinhos (Avenida Rui Barbosa,  409, Graças).

O livro é assinado por Pedro Eurico, atual Secretário de Justiça e Direitos Humanos de Pernambuco.  Pedro deve mesmo ter muito o que contar. Ele conviveu durante longos anos com o Dom da Paz, quando era  advogado da então atuante Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese, que se marcava pela luta em defesa dos direitos humanos e contra torturas e arbitrariedades impostas às pessoas que eram consideradas inimigas do regime pela ditadura. Como a menção ao simples nome do Dom era vetada na Imprensa pelos militares, era a Comissão de Justiça e Paz  que falava, com informações publicadas nos jornais de todo o país.  O livro traz 23 entrevistas com pessoas que de alguma forma conviveram e colaboraram, direta ou indiretamente, com o trabalho de dom Helder (1909-1999). Tais relatos – alguns inéditos – revelam que ideias e atitudes defendidas por dom Helder permanecem vivas, como a defesa da liberdade e dos direitos humanos e a luta contra injustiças. “O livro é um importante resgate e registro dessas memórias”, informa a Cepe. E deve ser mesmo.

Um desses testemunhos, claro, é do próprio autor. Até porque ele iniciou sua carreira de advogado naquela Comissão, na década de 1970, a convite do próprio Dom Helder,  para defender presos políticos e moradores de ocupações de terra. “Dom Helder é uma presença decisiva em minha vida. Falo no presente porque ele continua vivo em mim e em tantos outros que conviveram com ele”, diz Pedro. “Por isso esse livro, um projeto que me acompanha há muito tempo, e que agora será lançado pela Cepe, com o relato testemunhal de tantos que estiveram ao seu lado”, acrescenta. Ele lembra que “são memórias que possivelmente estariam restritas a quem conviveu com o Dom”, diz o advogado.  E destaca que, com a publicação,  essas memórias vão ser registradas para os leitores e para a história. O Dom da Paz, como era conhecido, está a caminho de virar Santo.

Então, os relatos de todos que conviveram com ele ganham ainda maior importância histórica pelo seu papel na Igreja Católica, sua defesa da Teologia da Libertação e sobretudo sua luta contra o arbítrio. Mesmo nos tempos mais obscuros do regime militar, Dom Helder levava esperança aos que conviviam com ele. “Depois da noite escura vem a luz da madrugada”.

“Revelar esse Dom vivo como muitos dos valores e ideias que sempre defendeu em vida e que continuam tão urgentes é falar sobre temas muito pertinentes e necessários para a defesa dos direitos humanos. Dom Helder foi um grande líder do movimento da não violência ativa, o que está mais atual do que nunca”, declara Pedro Eurico. “Se dom Helder Camara estivesse entre nós, sem dúvida, estaria nos fazendo ver que a pandemia tem feito tanto mal e provocado tanta morte não apenas por causa do coronavírus e sim pela indiferença social, pela insensibilidade de governantes diante da dor do povo e, principalmente, pela forma de organizar a sociedade, na qual a solidariedade e o bem comum não são prioridades”, escreve no prefácio o Arcebispo de Olinda e Recife, Dom Fernando Saburido.

Editado pela jornalista Danielle Brito Alves, o livro começou a nascer em 2019, quando se iniciaram as pesquisas e entrevistas nos municípios pernambucanos de Jaboatão dos Guararapes e Glória de Goitá, e em Brasília. As conversas resultaram em 23 horas e quarenta e nove minutos de depoimentos que revelam experiências e reflexões a partir de acontecimentos das vidas de irmã Aurieta, Lucinha Moreira, Roberto Franca, padre Reginaldo, irmã Carla, frei Aloísio Fragoso, padre Ernannes Pinheiro, irmã Consuelo, Iêda e padre Jayme, frei Tito, dom Sebastião Armando, Chico de Assis, padre Vito Miracapillo, Socorro Ferraz, Gilbraz Aragão, Abdalaziz de Moura, Henrique Mariano, Leda Alves, Teresa Duere, Divane Carvalho, João Bosco e Marcelo Barros. O livro tem 492 páginas recheadas por rico acervo fotográfico pertencente à Arquidiocese e ao Instituto Dom Helder Camara (Idec).

O livro relata, através das entrevistas, fatos e reflexões sobre temas como a morte do padre Antônio Henrique (1940-1969), sequestrado, torturado e brutalmente assassinado pela ditadura militar; a atuação no Recife da Comissão de Justiça e Paz; a luta por moradia defendida por dom Helder; a relação da política com a religião e a igreja Católica; a importância dos pobres serem evangelizados pelos pobres. “Ele era um ‘agitador’ social, um Luther King, Gandhi, um Mandela, hoje seria Malala Yousafzai”, compara Pedro Eurico.

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Serviço:
Lançamento do livro O Dom que vive em nós – Helder Camara e a igreja no meio do povo (Cepe Editora), de Pedro Eurico
Quanto: R$ 80 (livro impresso) e R$ 32 (E-book)

Quando: 23 de novembro
Horário: 18h
Onde: Cúria da Arquidiocese de Olinda e Recife (Avenida Rui Barbosa, 409, Graças)

Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Idec/ Divulgação

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