Leitor do #OxeRecife e companheiro de grupos que exploram a cidade em passeios a pé, Agenor Tenório cobra o destino da placa que existia na Ponte da Torre em homenagem ao ex-líder estudantil e engenheiro Cândido Pinto (1947-2002). Para os que não lembram ou não sabem, principalmente as novas gerações, Cândido foi um dos dolorosos exemplos das consequências geradas pela ditadura militar implantada no Brasil a partir de 1964 e durante a qual muita gente morreu sob tortura nas masmorras do regime. Naqueles tempos obscuros, não existia o chamado estado de direito que caracteriza os regimes democráticos.
E bastava pensar de outra forma para ser considerado “subversivo” ou “inimigo do regime”. Algo semelhante ao palavreado usado hoje pelos seguidores do Presidente Jair Bolsonaro, que chamam de “esquerdopatas” aqueles que não concordam com os rumos do seu governo. Cândido tinha 22 anos quando presidiu a União de Estudantes de Pernambuco (UEP), entidade que teve o funcionamento cassado pela ditadura. Foi enquadrado na Lei de Segurança Nacional, ao participar de congresso da União de Estudantes e não só ele como seus amigos e parentes passaram a ser monitorados e perseguidos. Isso foi em 1968. O pior, no entanto, viria um ano depois, naqueles tempos de chumbo.
Em 1969, Cândido estava perto Ponte da Torre, quando um cidadão encapuzando lhe apontou uma arma, tentando obrigá-lo a entrar em um carro (provavelmente dos regimes de repressão). O então estudante se recusou a atender ao desconhecido, e foi alvejado com dois tiros, um dos quais seccionou sua medula e o deixou sem andar. Viveu mais de três décadas lutando contra as sequelas do tiro e em defesa da redemocratização do Brasil. De tanto conviver com hospitais, clínicas de reabilitação, aparelhos de fisioterapia terminou dedicando-se à engenharia biomédica, virando um profissional muito respeitado no setor. Durante a gestão do PT na Prefeitura, Cândido – que residia em São Paulo – voltou ao Recife para dirigir a Emprel, vindo a falecer quando exercia o cargo.
A memória de Cândido Pinto era preservada na placa que existia na Ponte, que esteve em reforma na gestão passada, quando o Prefeito era Geraldo Júlio (PSB). Ao passar várias vezes pelo local, Agenor se ressente da retirada da placa em homenagem ao militante. Afinal, memória é história. E história é memória. Porém, há uma outra, oficial, no seu lugar. “Passei lá hoje e fotografei. A Prefeitura da Cidade do Recife se apossou do totem onde estava a placa original e colocou uma nova. Para mim, não passa de propaganda de Geraldo Júlio”, reclama Agenor, com muita razão. “Será que a família de Cândido foi consultada?”, indaga. Como a reforma foi realizada pela Emlurb, o #OxeRecife indagou à autarquia sobre o destino da placa. Mas ninguém sabe, ninguém viu. A Emlurb diz que não sabe, sequer, o que tinha escrito na placa.
A resposta da Emlurb: “Estamos tentando identificar aqui na Emlurb como era essa placa. Ela sumiu por conta de vandalismo, e como não foi produzida pela Emlurb (só havia a manutenção nela por nossa parte), estamos com dificuldade de saber o que tinha escrito nela, por exemplo. Aproveito e peço a tua ajuda, caso tenhas imagens dessa placa ou se algum dos moradores que falaram contigo tenha”. Os moradores da Torre, no entanto, dizem que a placa sumiu durante as obras de requalificação da Ponte da Torre. Em uma cidade como o Recife, onde 64 das 79 peças do Parque de Esculturas Francisco Brennand foram roubadas com providências tomadas só quando o caso pipocou na imprensa, o sumiço de uma placa deve ser visto na burocracia oficial como coisa menor. Mesmo que seja para um importante registro de um fato que não podemos esquecer, para que não volte a se repetir na nossa história .
Agora à noite, a Emlurb informou que localizou uma imagem da placa sobre Cândido Pinto: “Achamos uma imagem da placa, vamos orçar e ver aqui para poder repor”
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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Agenor Tenório e Acervo #OxeRecife
Parabéns, Letícia Lins, pela valiosa reportagem!
OxeRecife tem realizado um trabalho exemplar de proteção ao patrimônio natural, cultural e social da cidade. Sem esse cuidado, os gestores negligentes ou mal intencionados vão apagando a memória histórica que faz do Recife uma cidade única, com são únicas as cidades!
E pior, substituindo os símbolos da resistência honrosa à dominação do poder econômico, exatamente por homenagens à esses poderes, não tão ocultos assim, em troca de sabe-se lá que favores.