Filme “Retratos fantasmas”começa a ser exibido no Recife: centro decadente sem os cinemas

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A noite desse dia 14 de agosto é do cinema, no Recife. E a festa da segunda-feira tem um lado bom e um lado triste. É que às 20h tem a pré-estreia do filme “Retratos Fantasmas”, de um cineasta pernambucano, consagrado e já mundialmente respeitado: Kleber Mendonça. O lado triste é que o longa de Kleber aborda o que era o Centro do Recife com os seus cinemas. E eles não eram poucos: Moderno, Trianon, Art Palácio, Boa Vista, São Luiz, Ritz, Astor, Veneza.  O filme mostra como o Centro ficou hoje, sem essas antes tão frequentadas salas de exibição, que sucumbiram ao avanço da televisão, aos canais por assinatura e sobretudo ao esvaziamento da área central da cidade, tragada pelo temor da violência e pelo avanço dos shopping-centers.

O Recife, como um todo, já foi bom de cinema. Até o final dos anos 1960, a cidade possuía  quase 30 salas de exibição, inclusive em bairros populosos, como Casa Amarela, que chegou a comportar quatro cinemas ao mesmo tempo: Casa Amarela, Rivoli, Coliseu, Albatroz, sendo que cheguei a frequentar os três últimos. E o que dizer do bairro de Afogados, que era tido como a “Cinelândia” recifense? O mais novo filme de Kleber aborda só a área central, e vai ser exibido na noite dessa segunda-feira, no Teatro do Parque. Isso porque o único sobrevivente dos cinemas do Centro, o majestoso São Luiz, de tantas histórias, está fechado há mais de um ano e ninguém sabe quando volta a funcionar. O São Luiz integra as memórias afetivas da população, de uma época em que o centro da cidade tinha seu glamour, e era um dos principais programas de família, aos finais de semana.

Será que o Centro da cidade volta a vicejar um dia sem os seus cinemas e sem o público do Cine São Luiz?

Do São Luiz, pais, mães, filhos e amigos saíam para ver as vitrines de lojas sofisticadas do centro – a Sloper era uma delas – e também para amenizar o calor tomando os deliciosos gelados da Sorveteria Gemba, com suas paredes com espelhos e azulejos. À frente do São Luiz, os jovens sentavam no “Quem me quer”, ali à margem do Capibaribe,  na Rua da Aurora, que funcionava não só como local de “flerte” como também como uma espécie de passarela pela qual passavam novidades no vestuário da estação. Lembro-me também, que ir ao cinema, aos domingos, era quase um ritual. Meus pais e avós contavam que era exigido terno dos homens e “toalete” completa das mulheres, no início do século passado. Menina, ainda, vi uma vez um rapaz ser barrado à entrada do Cine Trianon, no Centro, porque estava de …. sandálias. Naqueles tempos, bermudas e shorts nem pensar…

É que até o fim dos anos 60, homens tinham que entrar calçados no cinema. E eles caprichavam nas meias, no sapato engraxado. As mulheres, de salto alto, e saias preferencialmente. Lembro-me do primeiro filme que assisti na minha vida: Lili, do diretor Charles Walters  (1911-1982). Aos meus olhos de criança, o filme foi uma decepção, um saco, apesar das peripécias da protagonista e seus bonecos falantes. Porque meu encantamento com os vitrais dos jarros aos lados da tela do São Luiz foi tão grande, mas tão grande, que tudo que eu queria era que o filme acabasse, na expectativa de vê-los acender de novo. Infelizmente, os  jarros – tão lindos e luminosos – estão vetados ao público, porque o São Luiz permanece fechado e ninguém sabe quando reabrirá. Aliás, como sempre acontece com o patrimônio artístico, cultural e histórico da cidade. O temor da população é que aconteça com o icônico cinema o mesmo que ocorreu com os outros, que sucumbiram ao abandono. E todos – inclusive a escriba aqui – torcem para que a recuperação não demore tanto quanto a do Teatro do Parque, que passou mais de uma década fechado e só teve as obras concluídas por pressão da população, que fez vários protestos e viradas culturais pela sua reabertura. Hoje, está aí, o Parque, brilhando como teatro e como cinema, já que o São Luiz está fechado.

Abaixo, você confere vários links sobre “Retratos Fantasmas”, cinema, etc. E sobre as extintas salas de exibição do Recife.

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Serviço
Pré-estreia do filme “Retratos Fantasmas”, de Kleber Mendonça
Onde: Teatro do Parque, Rua do Hospício, 81, Boa Vista
Horários: 20h e 22h
Ingressos esgotados para as duas sessões

Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Andrea Rego Barros/ PCR e Genival Paparazzi / Acervo #OxeRecife

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2 comments

  1. Maravilhoso seu texto Letícia! Retratou muito bem o que era ir ao cinemas do centro e principalmente ao São Luiz. Assim como você, tb fiquei encantado com os vitrais do cinema. Dava gosto ver. E foi no São Luiz que adquiri aversão a fila com os filmes dos trapalhões que davam 2 voltas no quarteirão e os próprios Renato Aragão e Dedé Santana vinham, em pessoa, divulgar os filmes!
    Realmente ir aos cinemas do centro era um ritual.
    Minha paixão foi tanta que acabei trabalhando num Vídeo Clube (assim chamados quando chegaram ao Recife) e depois montei minha locadora, que mantive por 11 anos até o mercado ficar impraticável.
    Obrigado Letícia

  2. Concordo com o seu comentário, o centro de Recife era lindo, com vasto comércio e seus cinemas. Tudo funcionava no centro, Correios, Mesbla, Casa Slopp etc. até vir para São Paulo em 1973. Quando visito Recife minha decepção é grande com o que se tornou o centro da cidade, muita sujeira, desorganização, excesso de camelôs e os cinemas todos fechados. Os turistas ficam decepcionados aí visitar Recife. PRECISA MUITA LUTA PARA REVERTER ESSE QUADRO. Recife é rica em cultura, possui uma arquitetura histórica linda, com igrejas e sobrados, que se fosse valorizada arrecaderia muito dinheiro.

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