As tartarugas marinhas não sabem distinguir o lixo da comida, então se alimentam de tudo que estiver boiando. Elas chegam a confundir sacos plásticos que acham no mar com caravelas, águas vivas e outros animais que lhes servem de alimentos. Com a invasão desses materiais nos oceanos, os quelônios ficam ainda mais vulneráveis. Não é difícil, por exemplo, a presença de tartarugas marinhas mortas, na areia das praias, nas quais são encontrados aquele tipo de detrito no aparelho digestivo. “Infelizmente, nossos mares estão cheios de plásticos. Assim como a Loirinha, cerca de 80% das tartarugas chegam no programa mortas ou defecando lixo”, adverte a bióloga do Programa Tartaruga Viva, Naiara Tessaro. Um horror, não é? É o caso de Loirinha, tartaruga que foi resgatada boiando, não conseguia se alimentar sozinha, depois de ingerir muito lixo. Coitada da Loirinha.
Já outra fêmea da espécie, Paçoca, foi acolhida com infecção que afetava sua mobilidade. As duas – viva! – acabam de voltar ao mar, como vocês podem perceber nas duas fotos. Elas agora estão recuperadas e aptas a viver no oceano, nessa volta à natureza. O risco é que – como tem se tornado comum – os animais se alimentem de plásticos ou outros materiais que a população sem noção tem descartado onde não deve, e que terminam chegando no mar. Os dois quelônios foram resgatadas e reabilitadas no Programa Tartaruga Viva, que conta com apoio da Eletronuclear e Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Além da poluição dos oceanos, a interação com resíduos de pesca e o atropelamento por embarcações também colocam em risco a proteção dos animais. Por isso, é possível encontrar tartarugas mortas nas praia.
Se estiverem vivas, encalhadas, ou nadando com dificuldade, é preciso acionar ajuda especializada, como o programa Tartaruga Viva, que conta com o apoio da população através do telefone 0800-204-4041. A primeira a ser localizada foi Loirinha. A tartaruga, que passou cerca de três meses sob os cuidados de profissionais do projeto, foi resgatada boiando e não conseguia se alimentar sozinha, após grande ingestão de lixo. O material foi completamente eliminado, depois de longo tratamento, e agora ela está saudável. Paçoca também pôde voltar ao mar recuperada, permanecendo menos de um mês com a equipe para tratamento de uma infecção que provavelmente causou a baixa mobilidade.
Loirinha e Paçoca foram encontradas na região da Piraquara de Fora, em Angra dos Reis, por colaboradores da Eletronuclear que acionaram o programa. Elas são da espécie Caretta caretta. E estão com cerca de 15 a 20 anos de idade. Agora recuperadas, chamam atenção para a responsabilidade de todos em proteger e cuidar do meio ambiente. Durante o processo de recuperação, as tartarugas receberam cuidados para que pudessem retornar ao mar. Medicações, vitaminas, alimentação adequada por sonda, por introdução direta e indireta, e uma série de exames foram necessários para identificar e tratar os problemas de saúde dos animais. Todo o tratamento foi realizado pela equipe de especialistas da Uerj, formada por veterinários, biólogos e técnicos em biologia, além de estagiários, que trabalharam para garantir a sobrevivência dos animais. Para finalizar a missão, entretanto, foi preciso aguardar as condições ideais do mar, além de outras precauções e protocolos de segurança para soltura das tartarugas.
“Para nós é uma felicidade enorme realizar essa soltura. Loirinha e Paçoca chegaram muito debilitadas. Graças a nossa equipe, que trabalhou incansavelmente, as tartarugas estão bem. Se pensarmos que a cada mil tartarugas, apenas uma chega a fase de reprodução para manter a espécie ocorrendo, entendemos a importância da recuperação das duas”, celebra a co-coordenadora do programa, Mônica Dias. O Projeto Tartaruga Viva realiza o monitoramento dessas populações marinhas na área de influência das usinas nucleares de Angra dos Reis, na Baía de Ilha Grande.
Além do resgate e atendimento veterinário das tartarugas, as atividades da iniciativa também incluem educação ambiental na região, coleta de dados, monitoramento da saúde dos animais, registro da ocorrência de encalhes e determinação da causa da morte de algumas espécies. Ao todo, entre 2018 e 2023, o projeto realizou a captura de 121 tartarugas marinhas para fazer a amostragem populacional e averiguar o estado de saúde dos animais. Além disso, foram recebidos 192 acionamentos para auxiliar animais encalhados. Destes, 160 já estavam mortos, com destaque para infecções ligadas a ingestão de lixo, afogamento, traumatismo causado por atropelamento e interação por pesca entre as principais causas. Com a soltura da Loirinha e da Paçoca, sobe para treze o número de tartarugas reabilitadas e soltas pela iniciativa no período mencionado.
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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Projeto Tartaruga Viva