Na noite da última quinta-feira, compareci à Passa Disco, para o lançamento dos livros Breu (Geraldo Maia) e Saxofone Áspero (Marco Polo Guimarães). É sempre bom encontrar amigos de minha geração e até mesmo colegas dos divertidos tempos do Colégio Vera Cruz. Conversa vai, conversa vem. E eis a pergunta: “Você está feliz no Brasil?” Assim, de sopetão. A frase interrogativa é a “senha” que serve como justificativa para alguém dizer que vai morar no exterior.
E não é só por causa do “breu” que se instalou no horizonte do País, onde a cada dia surge uma nova e milionária falcatrua, com o meu, o seu, o nosso dinheiro. Aquela indagação aconteceu no meio de um diálogo entre o poeta José Mário Rodrigues (que está de mudança de um apartamento para outro, no Recife) e o cantor Gonzaga Leal (que vai morar em Paris). Gonzaga veio do Sertão, foi acolhido pelo Recife onde fez carreira como terapeuta e intérprete de velhas e clássicas canções. A pergunta partiu de Gonzaga, que está arrumando as malas, como muita gente começa a arrumar, para morar em Portugal. Tenho vários amigos com esse tipo de plano.
E porque as pessoa viram “refugiadas”, se o Brasil não é a Síria? Não, não é a Síria, mas os números da violência que temos, no País, lembram os de uma área em guerra civil. Não há mais segurança para a pessoa andar na rua a pé, para ficar em casa, nem para andar de carro. Seja no Recife, em Olinda, no Rio de Janeiro. Em Pernambuco, estão aí os 8.063 casos de crimes violentos contra o patrimônio, registrados, só no mês de fevereiro deste ano. E 416 homicídios computados no mesmo período, segundo dados oficiais da própria Secretaria de Defesa Social. Essa quantidade é menor do que 2017 (496 no mesmo período), porém é muito mais do que os números registrados nos meses de fevereiro de 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016. Em 2017, nada menos de 5.427 pessoas foram assassinadas no nosso Estado.
Ou seja, números e vidas perdidas, temos de sobra para nos preocupar. E parece, agora, que nos querem, também, impor o medo de gritar. Em Olinda, é muita coincidência que a arquiteta Maria Soares dos Anjos, a Baixinha – figura querida e popular na cidade – tenha sido assassinada, dias depois de ter prestado queixa à polícia contra arrombamento de sua residência, localizada no Sítio Histórico. Ela foi assassinada em casa. Daqui a pouco será feito um protesto contra a violência, em Olinda. No Rio, uma das vozes diferenciadas, nesse mar de lama em que se transformou a política brasileira – é executada, juntamente com o condutor do veículo, em que viajava. Com isso, calam a voz de Marielle Franco, que saiu da Favela da Maré para erguer seu grito contra a truculência, a prepotência, a injustiça. Mas o mundo gira, e outras vozes como as de Alice e Marielle eclodirão. Ninguém, ninguém mesmo, vai se calar.
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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife