Esse Festival Janeiro de Grandes Espetáculos é, realmente, uma festa. É se apressar para garantir ingresso, ou você corre o risco de ficar de fora. Por pouco, no meio da semana, não perdi “O Velho em Con(s)erto“, comandado por Valmir Chagas, o Véio Mangaba, que acabou com música e cortejo do público, na parte externa do Teatro Marco Camarotti, em Santo Amaro. No sábado, fui ver pela terceira vez “Capiba, pelas ruas eu vou”, encenado pelo Aria Social. Teatro Santa Isabel lotado e, ao final do espetáculo, um brinde no hall do TSI: um concerto improvisado da Orquestra de Câmara que atuou no musical.
Clima realmente de festa no TSI, e o comentário um só: “quando puder, vou assistir de novo”. Minha amiga dos tempos do Colégio Vera Cruz, Ana Rita Sá Carneiro, arquiteta, levou filha e neta. Disse que vai assistir de novo, na próxima oportunidade, para levar a família inteira. Até o poeta, escritor e imortal da Academia Pernambucana de Letras, José Mário Rodrigues, que foi comigo ao espetáculo, fez o mesmo comentário. Quer ver de novo. E disse mais: “Capiba, pelas ruas eu vou”, merece muitos prêmios. Merece mesmo. É, de longe, o melhor musical encenado em Pernambuco nos últimos vinte anos. Os atores e dançarinos não são profissionais, mas sim alunos do bonito projeto Aria Social, que é comandado por Cecília Brennand, através do qual se faz resgate social de crianças e jovens em situação de vulnerabilidade. Tudo por meio da arte, da cultura. Lindo, não é?
Mas a dica de hoje é “Senhora de Engenho –Entre a Cruz e a Torá”, que é encenada pela primeira vez em uma sinagoga. Aliás, pela segunda. Pois a estreia foi no sábado. No caso, a histórica Zahal Zur Israel, que fica na Rua do Bom Jesus. Só lembrando, a peça que entrou em cartaz em 2012 e já percorreu vários estados chegando inclusive ao exterior, relata o drama vivido pela lendária Branca Dias, a judia que passou a vida driblando a Inquisição. Primeiro, em Portugal. Depois, no Brasil, no século 16, quando fugiu de Lisboa (após ser liberada da masmorra do Santo Ofício) para Pernambuco (onde se disfarçava de cristã na parte externa de sua casa grande, ostentando uma cruz). No interior da casa onde reencontrou o marido, no entanto, o que valia era Torá, a “Bíblia” judaica.
Portanto, hoje, mais uma oportunidade de assistir esse bonito e criativo espetáculo, que retrata a vida e morte de Branca Dias, com rigor histórico. Não percam. Acho que tem todo um clima se a encenação é no prédio onde funcionou a primeira sinagoga das Américas, um marco da história judaica em Pernambuco, no Brasil e no mundo. Branca Dias, por sua vez, é uma das personagens femininas mais lembradas da nossa história, mas são muitos os mitos a seu respeito. A peça teatral derruba alguns deles e enaltece outros, desconhecidos por grande parte da população. É encenada pela Companhia Popular de Teatro de Camaragibe, sob direção de Emanoel David D’ Lucard.
Curioso é que a peça tem uma outra figura lembrada na nossa história e na Literatura: Bento Teixeira, autor da Prosopopeia, tido como o primeiro poeta épico em terras tunipiniquins. Interpretado pelo ator Pedro Dias, ele era amigo de Branca, foi corneado pela esposa e até havia quem suspeitasse que a relação entre os dois era mais do que uma simples amizade… Naquele tempo, imaginem! Lembrete: A vida de Bento Teixeira e de sua mulher Filipa é retratada no livro “Rios Turvos”, biografia romanceada escrita por Luzilá Gonçalves Ferreira. Ela mostra que, cansado de tanta traição conjugal, Bento apunhala a esposa. O que ele não sabia, é que ela reservara para ele uma punhalada ainda maior. Filipa era o que se chama hoje de ninfomaníaca. Sempre achava um homem para se divertir, fazendo de Bento o primeiro corno oficial de Pernambuco no Brasil Colônia. Cansado e desmoralizado, ele resolve “lavar a honra ” – como se dizia na época, matando a mulher com um punhal. Mas o fato é que, segundo o livro de Luzilá, a própria esposa já o havia denunciado a Inquisição, antes de morrer, deixando o marido traído em situação difícil. Se não me falha a memória, ele foi preso e deportado para Portugal.
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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Foto: Neluce Sedícias e Robson Araújo / Divulgação
Bento Teixeira primeiro corno oficial de Pernambuco no Brasil Colônia! Tai, gostei do dito rs… O fato foi abordado com humor na apresentação de ontem. A maioria se conteve, mas eu soltei uma risada, nada de extravagante, mas soltei. Realmente, bem engraçado o jeito como o fato foi abordado. Gostaria de ler o livro de Luzilá citado aqui. Mas é difícil. Tempos atrás procurei um livro dela e não achei. A contatei e ela me disse para entrar em contato com a editora. Quanto a montagem da peça, apreciei demasiado. Apenas achei o potencial vocal da atriz que faz Branca um tanto fraco. Muito da sua fala não chegou aos ouvidos da plateia.