Em ruínas, casarão do antigo Hospital Magitot, na Várzea, é alvo de licitação para que seja restaurado

Ainda vai demorar. Mas, pelo menos, a luta da população da Zona Oeste do Recife não foi em vão. Após décadas de abandono, de mais de cinco anos de pressão popular e depois que as ruínas tomarem conta do antes imponente “casarão da Várzea”, começa a tramitar na Prefeitura do Recife o processo licitatório para restauração  do prédio do antigo Hospital Magitot. O imóvel, que fica na Rua Azeredo Coutinho, 130, foi inaugurado em 1905 com fins residenciais e sob o nome de Villa Therezinha. Mas a partir de 1944, tansformou-se no primeiro hospital odontológico da América Latina.

O  processo licitatório 012/2023 (tomada de preços nº 004/2023) visa “a contratação de empresa de engenharia consultiva para elaboração de estudos preliminares, projetos executivos de urbanização/ paisagismo, arquitetura, infraestrutura e complementares de engenharia destinados ao restauro e revitalização do prédio Magitot, criação de Mercado Público da Várzea e reabilitação do entorno ao uso de integração socioeconômica, desde a gastronomia, lazer, artes, cultura e turismo no município do Recife”. Já era tempo. É lamentável o que está acontecendo com um dos mais belos casarões da Várzea e que, ainda por cima, tem história.

Além de estar em ruínas, o antigo Hospital Magitot está cercado de poluição visual por todos os lados

Sei não. Mas é preciso mesmo que se pense no entorno, que tem inúmeras barracas, feira, e outros empreendimentos muito mal instalados, que são uma poluição visual tremenda. Restaurado, o  prédio precisa ter vida, utilidade, para não entrar de novo em decadência. Não sou urbanista, mas amo o Recife e adoro o bairro da Várzea. E fico triste com a relação que nossas autoridades têm com o nosso patrimônio, com o que nos resta. Então, se eu fosse autoridade, minha primeira providência seria transformar o imenso terreno no qual fica o Magitot em um belo de um parque. Até porque nele há árvores centenárias.  A segunda seria colocar a Academia do Recife dentro desse novo parque, pois sua construção foi um atentado estético à Praça Pinto Damaso, a Praça da Várzea, que é um dos quinze jardins históricos que têm a assinatura do paisagista Burle Marx (1909-1994). Ou seja, o ideal seria que a Pinto Damaso voltasse ao modelo original e que seus equipamentos “postiços”, inclusive a Academia, fossem para essa nova área de lazer. Terceiro: como a Várzea é um bairro culturalmente muito rico, por que não transformar o velho casarão em um centro cultural?

Infelizmente a Academia instalada no meio da Praça, nesta que é uma obra de arte criada pelo paisagista, funciona como um monstrinho, um intruso em um ambiente tão bem elaborado. As instalações da Academia do Recife foram inauguradas na gestão passada, cuja marca principal era piorar cada vez mais o que a cidade tinha de bom. Já sobre o Magitot não restam muitos documentos a respeito de seus tempos áureos. Apenas a história oral, de testemunhos de seus antigos frequentadores. Uma dessas pessoas é a jornalista Conceição Campos, para quem o antigo hospital faz parte de suas memórias afetivas. Ela costumava ir às festas no belo prédio, com parentes que eram vizinhos do proprietário do hospital. Veja o seu depoimento, para o #OxeRecife, carregado de lembranças sobre o velho prédio.

“Eu era amiga das netas do fundador do Hospital Magitot, o professor Nelson de Albuquerque Melo. Quando havia evento social no Hospital, me convidavam e eu ia com a família. O prédio era muito bonito. Tinha uma escada de madeira, que rangia quando a gente subia. Ela dava acesso à sala onde aconteciam os discursos, os comes e bebes. Olhar da varanda para a rua toda iluminada  era uma festa. Aliás, para os meus doze anos, era uma festa ir ao Magitot. Minha mãe também fez um tratamento dentário nos consultórios do hospital,  onde os alunos de Odontologia estagiavam com a supervisão do Dr. Nelson”.

Na verdade, o Magitot parou de funcionar como hospital no final da década de 1960, após a morte do seu fundador. Porém no anexo construído ao lado do casarão, funcionou uma clínica odontológica que prestou serviços à população até os anos 1980. O  processo para restauração do Magitot, que é um imóvel especial de preservação (IEP) só teve início após a entrada do Ministério Público na questão. Não é para menos. O Magitot fica na ZEPH-07, que é uma Zona Especial de Preservação Histórico Cultural da Praça da Várzea. Breve, o #OxeRecife relata o caso de outro IEP que o Ministério Público entrou na jogada para evitar que ele desabe.

Abaixo, você confere outras informações sobre o bairro da Várzea

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Texto e fotos: Letícia Lins /  Acervo #OxeRecife

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2 comments

  1. Muito triste ver o abandono desse casarão( como muitos existentes na cidade)…
    Eu morei na Várzea quando criança, numa casa grande,onde funcionou depois um Centro Social .Soube que foi demolido.
    Meu pai amava a Várzea de tal forma que lá foi sepultado,conforme vontade expressa dele.
    Infelizmente,Recife é uma cidade que não ” cuida”( palavra tão usada pelos políticos de forma inapropriada e eleitoreira)do seu patrimônio histórico/ arquitetônico. Aliás, patrimônio que está sendo destruído de forma avassaladora,pela especulação imobiliária com a criminosa conivência do poder público( que deveria zelar pela sua preservação e manutenção ).Se não há nem manutenção básica das ruas e parques ,o que podemos esperar?Quem caminha pelas ruas da cidade,sabe da situação deplorável,muita sujeira e abandono total.
    Eu sou uma das revoltadas em pagar IPTU, porque não tenho retorno de nada.

  2. Perfeito Letícia, linda e rica matéria sobre o casarão da Várzea. Também não sou paisagista, mas concordo, essa academia dentro da Praça Pinto Damásio, é monstrego.

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