Capivaras de volta às margens do Capibaribe? Saiba mais sobre o maior roedor do Brasil

Produzido por holandeses entre os anos de 1643 e 1649, o Atlas da Costa do Brasil citava a capivara entre os outros animais encontrados no nosso país, que eles chamavam de “porco aquático”, embora o mamífero não fosse “parecido com os porcos senão na pele e no sabor”. Diziam que ele tinha “cabeça semelhante à de uma lebre”. A descrição do animal informava, ainda, que “vivem nos rios de água doce, mas pastam na terra”, causando grandes danos “aos partidos da cana de açúcar, porque comem seus caules”.

De acordo, ainda, com a mesma publicação, os portugueses costumavam servir-se da carne da capivara. “Apanham-nas cavando buracos, que cobrem de folhagem, nos quais caem ao passar; também são mortos a tiros de fuzil”. Ressaltavam os flamengos: “a carne deles é boa para os sadios, mas feridos ou doentes não devem servir-se dela”. A espécie era abundante naquela época em todo o país. E também no Recife, onde grupos imensos eram vistos ao longo do Rio Capibaribe, cujo nome quer significa “Rio das Capivaras”. No idioma tupi, “kapi’ wara” significa “comedor de capim”. Segundo os pesquisadores, a capivara come  21 tipos de gramíneas, cinco plantas aquáticas, quatro espécies de arbustos e três de Cyperaceaes (ervas). Ou seja,  estavam certos os povos originários, quando denominaram o animal.

Na Av. Beira Rio elas costumam aparecer no início para comer a grama dos jardins, assim como no Parque das Graças

A abundância do roedor ao longo do Capibaribe foi o que deu origem à denominação do rio que nasce em Pernambuco, passa por 42 dos seus 184  municípios, e que termina na nossa cidade, onde deságua no Atlântico. Hoje, com a especulação imobiliária, a poluição dos rios, a degradação das matas ciliares e a densidade demográfica, as capivaras estão cada vez mais raras na nossa cidade. Por isso, quando aparece um pequeno grupo, a notícia   pipoca nas redes sociais, todo mundo comenta,vira até manchete. O fato é que com o crescimento da selva de concreto, os animais foram se retraindo e quase sumiram. Na pandemia, no entanto, durante o isolamento social, elas foram vistas passeando no calçadão da praia de Boa Viagem e até no canteiro de hospitais, como o Esperança, que fica na Ilha do Leite, em uma das margens do Capibaribe. Estavam apenas reocupando os espaços que lhes foram usurpados, ao longo dos séculos.

Há mais ou menos um mês, no início da noite, foi visto um grupo de cinco passeando pela calçada da Avenida Rui Barbosa, pertinho do Parque da Jaqueira. Claro que na calçada, à margem do Capibaribe. Com a implantação de áreas verdes ao longo do Rio – como o Jardim Secreto (no Poço da Panela), o Parque das Graças (nas Graças) e os canteiros da Avenida Beira Rio (Torre) – os roedores, que são herbívoros, voltaram a aparecer, para degustar as gramíneas que encontram. No Jardim Secreto já comeram até as plantinhas da horta. Essas capivaras das fotos foram flagradas por  fotógrafo, amigo e leitor do #OxeRecife,  Veetmano João Mazella (@agenciajcmazella), a quem agradeço a gentileza de tê-las enciado. Ele sabe que a escriba aqui adora um bichinho, e resolveu presentear com essas imagens. Lindas, não são? Capivaras são muito sociais e costumavam andar em grupos imensos, às centenas ou talvez milhares, nos tempos do Brasil Colônia.

Capivara é tida como o maior roedor do Brasil. Aliás, do mundo. No Recife, ainda aparecem em áreas urbanas e nos rios

Depois, passaram a ser vistas em grupos de cem, 30, e agora… seis, sete, aqui no Recife, o que indica que o animal pode estar sofrendo algum tipo de risco. Ela ocorre em todos os países da América Latina (à exceção do Chile), porém no Brasil já desapareceu de regiões como a Caatinga e também não é mais vista no trecho do Litoral do Nordeste que fica entre o Rio Grande do Norte e o Ceará.  Maior roedor do Brasil, a espécie é bem mais velhinha do que a gente pensa, pois há indicações de sua existência há sete ou nove milhões de anos, segundo fósseis encontrados na Argentina.

Em 1648, o roedor foi descrito pela primeira vez por George Marcgraf, como Capy bara brasiliensus- Porcus est fluvialitis. No Recife, pode ser vista em locais como a Mata Atlântica, em parques, e até mesmo em áreas residenciais. Interessante é que ela tem convivido numa boa com humanos. Curiosidade: tem interação com várias aves que comem os insetos que aparecem no seu pelo, ou que usam as capivaras como poleiro ou batedor. Onde tem o roedor – que dizem ser também o maior do mundo – deve ter por perto um joão-de-barro, um carcará, um suiriri-cavaleiro, um gavião carrapateiro e até mesmo um bem-te-vi. Então, está provada a sua importância na natureza. E viva às capivaras no Dia Mundial da Terra!

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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: @agenciajcmazella

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2 comments

  1. Nossa AgênciaJCMazella se sente contemplado c a beleza desta matéria usando as imagens da capivara, além do jornalismo apurado tem uma beleza da jornalista autora da matéria.

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