Figura incrível, uma grande artista e uma mulher que viveu como quis e amou como pôde. Assim era Tereza Costa Rego (1929-2020), uma das pessoas mais maravilhosas que conheci em minha vida. Uma pessoa com um P maiúsculo. Não é à toa, portanto, que em vida tenha ganhado uma biografia à altura de sua história. E que após sua morte, sua arte continue rendendo novas publicações. No próximo dia 20 de janeiro, às 19h, será lançado o livro de arte A liberdade em vermelho, com textos de vários autores e obras das diversas fases da pintora modernista. O lançamento será no Museu do Estado. E além da publicação, será inaugurada uma exposição no Espaço Cultural Cícero Dias, que fica no mesmo Museu. A mostra poderá ser visitada até 27 de março.
Tereza é considerada a principal voz do modernismo pernambucano. Filha da aristocracia açucareira já decadente, nasceu “para enfeitar o piano da sala”, como ela mesma dizia. “Não hesitou, contudo, em quebrar o piano”, escreve Bruno Albertim, amigo e biógrafo de Tereza. Aos 15 anos, ela entrou na Escola de Belas Artes do Recife. Foi lá que conheceu e ficou amiga de artistas como Francisco Brennand, Aloísio Magalhães e Reynaldo Fonseca, e teve como professores Vicente do Rego Monteiro e Lula Cardoso Ayres. Em 1949, ganhou do Salão de Artes Plásticas de Pernambuco uma viagem a Paris. Nessa época já ficaram conhecidas obras povoadas por sinhazinhas como instituição do patriarcado, como escreve Bruno, também curador da exposição, juntamente com Marcus Lontra. Depois, Tereza começou a pintar mulheres despidas, figuras constantes em seu trabalho. Elas incluem as célebres cenas de bordel, que chegaram a motivar a realização de uma expô, no Recife.
Ela contava que, menina, ouvia os irmãos e os amigos descrevendo cenas das farras vividas nos cabarés e inferninhos da época, que aguçaram as suas fantasias e terminaram por alimentar sua criatividade sobre o assunto, o que renderia bom espaço em sua pintura.
Engajada na pintura regionalista, transpassa os limites do modernismo brasileiro. A formação em História pela USP, também renderia temas para sua arte: Batalha dos Guararapes, O Massacre dos Índios, Canudos, Ceia Larga Brasileira, A Árvore da Vida, Mulheres de Tejucupapo, entre outros. Acompanhou de perto, também, os acontecimentos políticos dos anos 1960, quando começou a viver uma história de amor com o dirigente do Partido Comunista Diógenes de Arruda Sampaio, em plena ditadura militar. Com ele, entrou na clandestinidade e passou a se chamar Joanna. Exilou-se no Chile, na Europa e na China. Em Olinda, Tereza tinha uma “relação de amor” com o calunga mais famoso do Brasil: o Homem da Meia Noite (foto lateral, acima). Ela esperava o desfile do boneco gigante com “a emoção de uma noiva que espera o noivo na janela”.
O calunga passava, parava e a reverenciava em frente à moradia da artista, na Rua do Amparo, onde ela mantinha também seu ateliê. Fantasias carnavalescas à parte, Tereza não teve chance de viver em paz no Brasil com o grande amor de sua vida. Em 1979, quando o casal voltou ao país, Diógenes morreu de infarto fulminante. Com a perda, decidiu que não seria mais a companheira do líder revolucionário, seria mulher e pintora. Já o livro A liberdade em vermelho foi editado pela Cepe. A obra é repleta de fotografias de suas criações, além de textos inéditos.
Os textos do livro são assinados por artistas, curadores e escritores como Raimundo Carrero, João Câmara, Clarissa Diniz, Marcus Lontra, Bruno Albertim, Denise Mattar, Cida Pedrosa e Ana Mae Barbosa. Além de depoimentos de amigos e da própria Tereza, que permeiam as páginas do livro, cujo projeto editorial é assinado pela jornalista, escritora e neta de Tereza, Joana Rozowykwiat. O lançamento ocorre dia 20 de janeiro, às 19h, no Museu do Estado de Pernambuco (Mepe), no bairro das Graças, Zona Norte do Recife, e é acompanhado de uma exposição no Espaço Cultural Cícero Dias, com curadoria dos jornalistas Bruno Albertim e Marcus Lontra.
A mostra é realizada pela Cepe, Secretaria de Cultura de Pernambuco (Secult-PE/ Fundarpe) e Mepe. O co-curador, escritor e jornalista Bruno Albertim, amigo íntimo de Tereza, conta que essa exposição está sendo pensada há alguns anos, antes mesmo de a artista falecer. Objetivo: “Nacionalizar” sua obra.
“Ela queria muito ver sua obra exposta em grandes museus do Brasil.”, diz Bruno. Para possibilitar o contato com as obras, de acordo com a filha da artista, Joana Rozowykwiat, houve um trabalho prévio de pesquisa, que localizou obras de períodos diversos. “Algumas delas muito antigas, da década de 40, quando a artista ainda assinava como Terezinha; outras mais recentes, mas que nunca haviam sido expostas”, revela a jornalista. “A liberdade em vermelho é um convite a conhecer e se aprofundar no trabalho de Tereza Costa Rêgo. É uma forma de ampliar o alcance da sua produção, levando toda a sua beleza, potência e reflexões que ela provoca a outros públicos e lugares”, resume Joana. O Espaço Cultural Cícero Dias fica localizado no Museu do Estado de Pernambuco. A exposição vai ocupar todo o ambiente, do hall às três galerias do 1º andar. Ao todo, serão 47 obras dispostas por 607 metros quadrados. Agende-se, portanto.
Abaixo, você confere mais informações sobre Tereza Costa Rego e outros artistas pernambucanos.
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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Divulgação / Cepe