Usina de Arte inaugura editora com livro que conta a história e importância dos Tapetes Casa Caiada

Quem nunca teve como sonho de consumo possuir um bonito tapete com a grife “Casa Caiada” em casa? Entre os anos 60 e 80, eles eram tão cobiçados que cobriam não só os pisos de cerâmica ou madeira, como passaram a servir, também, como ornamento para paredes de residências, hotéis, indústrias, até de repartições. Pois chegavam com força, com diferentes padronagens, que tanto podiam ser abstratas como incorporavam inspiração na azulejaria, em elementos florais ou mesmo na transposição de criações dos nossos artistas, como Francisco Brennand, Pedro Frederico e a estética armorial de Ariano Suassuna. Além disso, a confecção desses tapetes mudou a realidade de um pequeno município da Zona da Mata, Lagoa do Carro, onde muitas mulheres que trabalhavam no corte de cana passaram a ganhar a vida com a arte da tapeçaria.

Mas tudo isso não aconteceu de repente. Na verdade começou pelas mãos de Maria Digna Pessoa de Queiroz e Edith Pessoa de Queiroz, tia e sobrinha. Elas decidiram compartilhar  com outras mulheres os seus saberes relativos à arte da tapeçaria, até então limitados ao ambiente doméstico. As duas inauguram um novo estilo de tapeçaria e até elaboram o Ponto Casa Caiada, em esforço de busca pelas identidades étnicas, artísticas e históricas de nossa terra. Toda essa história  sexagenária de linhas, agulhas, lãs, tramas e cores acaba de ganhar registro em livro: “Casa Caiada – Uma História Entre Linhas“. O livro será lançado na noite dessa quarta-feira (8/3), Dia da Mulher, no Museu do Estado de Pernambuco (Mepe). A noite de autógrafos ocorre a partir das 19h.

Os tapetes “Casa Caiada” incorporam elementos da azulejaria, florais, geométricos, abstratos e regionais

Organizado por Maria Eduarda Marques, o livro tem edição bilíngue, 220 páginas, e marca o início da Editora Usina de Arte, braço literário da Usina de Arte localizada no município de Água Preta, e que funciona em terras de uma antiga indústria açucareira que, com a decadência do setor e a dificuldade cada vez maior na produção de açúcar e álcool, passou a “moer” cultura. Hoje, a Usina que fica no interior de Pernambuco chega a ser comparada com o Instituto Inhotim, que possui o maior museu a céu aberto do mundo, e que vem a ser hoje a maior atração turística do município mineiro de Brumadinho. A Editora pretende em futuro próximo, lançamentos posteriores de biografias de empreendedores da Região Nordeste, cujas histórias ainda não foram devidamente contadas.

Da demanda espontânea de conhecidos e familiares ao mercado internacional, as tapeçarias incorporaram alguns dos principais estilos artísticos de períodos anteriores e contemporâneos à sua trajetória, como Arts and Crafts, Modernismo Brasileiro e Art Déco. Casa Caiada também esteve em simbiose com a literatura e a cultura pernambucanas, contribuindo para a constituição da identidade estética do Movimento Armorial e inspirando-se no resgate regionalista, proposto por intelectuais como Manuel Bandeira e Gilberto Freyre.A atividade revigorou o tradicional ponto cruz com a introdução do Ponto Casa Caiada.

Entre os temas de inspiração para tantos bordados, estão a azulejaria portuguesa, formas geométricas, pinturas étnicas, animal print e a fauna e flora brasileira. Se em décadas anteriores o trançar de linhas era uma limitação imposta “às prendas domésticas de moças” impostas às moças de famílias abastadas, para as mulheres do interior a tapeçaria virou uma opção de geração de renda, em ofício realizado de forma coletiva, acolhedora e colaborativa. Uma vez associadas à Tapeçaria, as mulheres de Lagoa do Carro conquistam sua independência financeira e, muitas delas, libertam-se de estruturas que as aprisionavam, como relações abusivas e trabalho semi escravo. Com versão em português e inglês, a obra propõe ainda uma viagem aos primórdios da arte tecelã, com convite à uma reflexão em torno do desenvolvimento dessa prática no Estado como um marco identitário e patrimonial.

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Serviço:
Lançamento: Casa Caiada – Uma História Entre Linhas (Editora Usina de Arte, 225 págs.)
Quando: 8/3, às 19h
Onde: Museu do Estado de Pernambuco (Mepe)
Avenida Rui Barbosa, 860, Graças
Valor da livro: R$ 300

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