O Recife completa 487 anos envolvido em uma grande polêmica, que diz respeito a esse prédio aí da foto acima, em estilo eclético, e que é localizado no Bairro do Recife, em área de preservação. O imóvel – na verdade, são dois conjugados – é alvo do Projeto REC Cultural, que além de reforma, restauração, implantação de museu e outras atividades, deverá ter um restaurante em formato de Zeppelin, na parte superior. E é aí que começa a confusão.
O projeto REC Cultural é liderado pela empresa EBrasil, um das maiores grupos privados do país a atuar no mercado de energia. E, portanto, com verbas disponíveis para investir não só no próprio negócio, mas em cultura, a exemplo do que ocorre com magnatas em qualquer parte do mundo. No Recife, tivemos o exemplo do empresário Ricardo Brennand (1927-2020), que colocou recursos próprios na aquisição de obras de arte, e que criou o Instituto Ricardo Brennand (IRB), para acomodar o seu importante acervo. Localizado no bairro da Várzea, hoje o IRB já chegou a ser eleito “o melhor museu da América Latina” pelo site de viagens TripAdvisor. E é um dos museus mais visitados do Recife.
No caso dos imóveis em questão, o problema é que o projeto arquitetônico encomendado pela EBrasil para o Recife Antigo inclui a implantação de um restaurante na cúpula dos dois edifícios, atualmente desocupados e que começam a se degradar. O restaurante terá o formato do Zeppelin (foto abaixo), que tanto marcou a história da cidade no século passado. O dirigível faz parte das memórias afetivas da população recifense, mas há controvérsias na instalação de um restaurante com o seu formato, no alto dos imóveis conjugados (que ficam na Avenida Rio Branco, 23; e Avenida Marquês de Olinda, 58). O corpo técnico do IPHAN foi contra. Mas o Superintendente do IPHAN em Pernambuco, Jacques Ribemboim, o liberou
O #OxeRecife não esgota o assunto aqui, mas procurou ouvir alguns especialistas. Restauração e aproveitamento de imóveis no histórico Recife Antigo todos querem. São muito bem vindos. Mas… quanto ao Zeppelin… aí, a confusão é grande. E promete aumentar.
Veja o que dizem alguns especialistas:
“Sou contra. É uma ofensa à paisagem urbana histórica de Zona Especial de Preservação do Patrimônio Histórico e Cultural (zeph 09), no Bairro do Recife. Não há diálogo desse objeto estranho (que por outro lado é o Zeppelin, e que faz parte da nossa paisagem afetiva e saudosa da história da cidade) com a arquitetura eclética do bairro. O objeto cola em um edifício histórico e macula o sky line, o coroamento da edificação que dialogam com a paisagem. Portanto desvaloriza e fere as edificações existentes”. (Ana Rita Sá Carneiro, Coordenadora do Laboratório do Departamento de Paisagismo do Departamento de Arquitetura da Universidade Federal de Pernambuco).
“Sou contra. Mas não quero abrir mais essa frente de conflito. Tenho que escolher as batalhas que travar, para não perder todas”. (Francisco Cunha, arquiteto, urbanista, consultor -inclusive da Prefeitura – autor de vários livros sobre o Recife e criador das “Caminhadas Domingueiras”).
“Confesso que não conheço o projeto tão a fundo, porque não me debrucei sobre ele. Apenas acho estranho que técnicos do IPHAN com expertise sobre o assunto tenham indeferido o projeto por várias restrições, mesmo sendo instalação provisória, enquanto o Superintende do IPHAN em Pernambuco, Jacques Ribemboim, aprovou o projeto. Ao meu ver, deve ter sofrido muita pressão política para aprová-lo. Mas estou só especulando… Em relação ao projeto em si, se ficar interessante, não criar um monstrengo no bairro do Recife, tão prejudicado por novas construções que lhe descaracterizaram, acho interessante e gostaria de ver o resultado final.Tanto pode atrair turistas, como pode ser um tiro no pé. Mas sinceramente acredito na primeira hipótese, visto a pirâmide do Louvre, em Paris. (Denaldo Coelho, engenheiro, criador e coordenador do Grupo Bora Preservar).
Vivo defendendo o patrimônio verde, histórico e arquitetônico do Recife, mas confesso que minha opinião sobre o assunto ainda não está formada. Já perguntei a várias pessoas se o Restaurante Zeppelin ficará muito visível aos passantes. Dizem que não, que só seria visto a uma certa distância, a partir do Marco Zero, por exemplo. Apesar da divulgação do projeto, não consigo visualizar como se encaixaria na paisagem. Mas antes de ser a favor ou contra, é preciso que se coloque na balança duas situações. E qual é a pior? A degradação dos dois prédios? Ou a restauração dos dois edifícios (a arquitetura será mantida), condicionada a um apêndice , que seria o “zeppelin”? É bom salientar que os imóveis abrigarão acervo de arte e atividades culturais. No centro do Recife, há muitos prédios históricos caindo por falta de uso. Estes serão mais dois, se não dermos uso a eles. Mas é preciso que nos debrucemos em outros casos semelhantes no mundo para, então, emitirmos opinião. (Letícia Lins / #OxeRecife)
Mas o assunto aqui não se esgota. E vamos voltar a ele aqui no #OxeRecife. Nos links abaixo, mais informações sobre o Recife e sobre seus 487 anos.
Leia também:
Recife 487 anos: Elefante Branco do Pina vira biblioteca digital e Parque das Graças é ampliado
Recife 487 anos: Festejos atraem multidões e visitação ao maior navio de guerra da América Latina
Começam as comemorações dos 487 anos do Recife
Recife, 486 anos: programação inclui “Boi Voador”, Viva Guararapes e Bloco das Flores
Recife, 483 anos: bolo gigante, boi voador, mangbeat e carnaval
Recife 482 anos. Vamos de Boi Voador?
Boi Voador, do Recife, pode ganhar segundo prêmio nacional
“Boi Voador vira bloco e faz prévia
Sessão Recife Nostalgia: Boi Voador e Marisstad
Turista, placa apagada e Boi Voador
Recife tem cortejo de bois e Boi Voador
Olha! Recife: Rio, ponte e Boi Voador
Silenciosa relíquia do tempo de Nassau
O Recife através dos tempos
Aos 483 anos o Recife é lindo?
Fotografias que retratam cenas cotidianas do século passado vieram e-book e exposição
Bia Lima resgata fotografias da vida privada do Recife
Sessão Recife Nostalgia: O Kioske do Wilson, que ficava na Rua Nova
O Recife por elas
Hans Von Manteuffel dedica um fotopoema ao Recife
O Recife virado que te quero ver
Nota dez para Recife que te quero ver
Livro Eu, Capibaribe
Aos 483 anos, o Recife é lindo?
Recife, 482 anos. Vamos de boi voador?
Livro mostra o Recife “que se esconde”
Arruando pelo Recife tem nova edição
Faculdade de Direito: O Recife através dos cartões postais
Conheça o Recife através dos tempos
O Recife através dos tempos está de volta
Gisele Carvallo e o Recife de Van Gogh
Dê o Recife de presente ao seu papai
O diário do lockdown da pandemia pelo olhar dos confinados
O Recife pelas lentes de Fred Jordão
Sessão Recife Nostalgia: “Como era lindo o bairro da Boa Vista”
Sessão Recife Nostalgia: Praça Maciel Pinheiro de Henry Ford e de Tia Teté
O Sertão que virou mar no Cais
São José e Santo Antônio ganham livro: viagem por quatro séculos de história
Arte Déco: Miami ou Recife?
Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Andrea Rego Barros / PCR / Acervo #OxeRecife
Tema delicado esse de um restaurante em formato Zeppelin no alto de um prédio histórico. Como a jornalista deste blog, também não tenho opinião formada. Precisaria saber mais, ver a planta, ouvir debates, etc. Pelo que tenho visto parece que até o momento há mais posicionamentos contra que a favor. O JC de ontem trouxe a posição da Fundarpe. Posição contra. Embora a Fundarpe não tenha poder de decisão sobre a questão, seu posicionamento não deixa de ser relevante e imperioso. Enfim, acho mister se discutir e investigar a fundo o projeto, Recife já teve muitas edificações históricas destruídas e descaracterizadas em nome da modernidade. Aguardo do oxerecife mais matéria sobre o tema.
EM TEMPO: Chamou-me atenção a posição do renomado arquiteto Francisco Cunha que a jornalista fez constar no texto: Ele é contra, mas não quer se envolver. ????
Muito interessante seu texto sobre a polêmica da construção do Restaurante Zeppelin no topo de prédios no centro do Recife. Legal ver a opinião sobre diversos ângulos pra gente poder formar uma opinião mais precisa. Parabéns mais uma vez Letícia!!
Sou plenamente a favor desde que se faça um projeto de recuperação do edificio que se encontra em estado de abandono. Sim, o Zeppelin é parte da história da cidade desde o inicio dos anos 30 dando um ar cosmopolita, internacional e fazendo com que ficássemos conhecidos mundo afora numa época tão desafiadora e sombria para a humanidade. Aí está ainda em pé aos trancos e barrancos a sua Torre de atracação, a única do mundo abandonada no Jiquiá que na segunda guerra foi um importante depósito de munições da frota americana bem como uma importante estação de rádio, a NKM junto com a Pina Radio Station.