A Várzea de “Nos tempos do Imperador”: Igreja ostenta a Coroa na fachada

Quando se fala no bairro da Várzea, dois lugares aparecem, logo, na nossa memória: o Instituto Ricardo Brennand e a Oficina Francisco Brennand, programas imperdíveis não só para turistas, mas também para os moradores do Recife. Mas uma outra  grata surpresa  do ainda bucólico bairro da Zona Oeste é a Imperial Matriz de Nossa Senhora do Rosário (foto acima), que passou por reforma recente e ficou uma graça. Aliás, uma restauração merecida. Porque a igreja tem história, pois ali funcionou a primeira capela da Várzea. Erguida em 1612, posteriormente seria transformada em igreja e ganharia o título de “imperial” de ninguém menos que Pedro II, o imperador.

Curioso, não é? Pois a igreja – sede da Paróquia da Várzea – é tão imperial, que ostenta  até o símbolo do Império, sob a cruz que identifica  o catolicismo. É que em 20 de novembro de 1859, Dom Pedro II visitou a Várzea, segundo a Paróquia, “para se inteirar desse novo sítio histórico”. E concedeu ao templo o título de “Imperial Matriz de Nossa Senhora do Rosário da Várzea”,  com direito” a levar a coroa imperial na fachada”. A viagem dele ao Nordeste inclusive vem sendo retratada na novela Nos Tempos do Imperador, que encontra-se em exibição na TV Globo, com ator Selton Melo interpretando o monarca. No capítulo  atual da novela, o Imperador está Bahia, em viagem ao Nordeste que incluirá Pernambuco.

Em 1648, foi sepultado Dom Antônio Felipe Camarão no cemitério da capela, como era comum na época.  Ele era “governador dos índios e figura de destaque nas lutas para a expulsão dos holandeses da Capitania de Pernambuco”. Escavações recentemente realizadas pelo Departamento de Arqueologia da Universidade Federal de Pernambuco (Ufpe) localizaram um cemitério de vítimas das duas batalhas dos Guararapes (1648 e 1649). “Infelizmente, o local dessas escavações atualmente está coberto com porcelanato,  ao invés de coberto com um vidro grosso que nos permitisse ver vestígios desse passado tão rico de nossa história”, lembra  Carlos Alberto Alves da Silva, que serviu como guia do Grupo Andarapé em nossa incursão pela Várzea. Ele nos levou até a sacristia, onde as pessoas eram enterradas. Naqueles tempos, cemitérios públicos não existiam e os católicos abastados se enterravam nas igrejas, “para ficar perto de Deus”, como se dizia naqueles tempos.

A igreja foi a primeira paróquia do Brasil sob os cuidados da Congregação dos Padres do Sagrado Coração de Jesus.  Em 1837, a Matriz tornou-se paróquia, deixou de ser em 1838, e voltou a ser – novamente – em 1846. Passou por reforma entre 1868 e 1872, nada restando da antiga capela. Passou por restauração recente, já no século 21. Na mesma rua onde fica a igreja “imperial”, situa-se – também – a  Igreja Nossa Senhora do Livramento, ao lado da qual há um prédio antigo. Não encontrei informações sobre o conjunto religioso, mas de acordo com o livro Monumentos do Recife (Rubem Franca) trata-se “do antigo  Seminário Menor dos Padres do Sagrado Coração”. Todos ficam na Rua Francisco Lacerda, na qual havia, também, a Igreja Rosário dos Pretos, onde casaram o francês e Júlio Adurand e a escrava alforriada Feliciana,  que viveram uma linda história de amor no século 19,  fato já relatado no #OxeRecife. e que você pode conferir no primeiro link abaixo. A foto dessa capelinha, da qual não restam nem ruínas, está fixada em pequena moldura, na sacristia da Imperial Matriz de Nossa Senhora do Rosário. Vá lá que você vê…

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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Letícia Lins e Andarapé 

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5 comments

  1. Não só os abastados se enterravam nas igrejas, mas se enterravam nas igrejas todos aqueles, e eram quase todos, porque todos tinham que ser católicos, que pertencessem a uma irmandade ou confraria que construísse sua própria Igreja, e havia igrejas e confrarias e irmandades desde a dos potentados, a Irmandade da Santa Casa de Misericórdia, as irmandades e confrarias de escravos e negros forros que construíam suas Igrejas de N. Sra. do rosário dos Homens Pretos, às dos Homens Pardos, poe exemplo São Gonçalo e Livramento no Recife, Guadalupe em Olinda. Havia , ainda como demonstrativa a Igreja da Conceição dos Militares no Recife, e havia a da Irmandade de São João dos Militares em Olinda. Ninguém queria ir para o inferno, maso céu era necessário se enterrar em solo sagrado, o que significava no soli de uma igreja, e para isso era serr de uma irmandade, ou confraria que tivesse apropriedade de uma igreja e, consequenemente de um solo sagrado como passagem para o céu.

  2. As datas das duas batalhas dos Guararapes no texto estão corretas? Século XIX?
    Eu achava que tais confrontos foram em 1848 e 1649. Houve outros conflitos bélicos chamado de Guararapes no período oitocentista citado no texto?
    Agradeço pela explicação

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