A questão da segurança em Pernambuco está virando uma piada de mau gosto. Enquanto nove bairros viveram clima de terror, esta semana, com ação de uma quadrilha organizada e superequipada, as autoridades pernambucanas chegam até a questionar o sistema de segurança da empresa vítima, a Brinks Transporte de Valores. Não sei como não questionaram, também, a vulnerabilidade do posto de gasolina que foi bombardeado, dos imóveis cujas paredes foram perfuradas por balas e a da própria população que, por acaso, passasse por ali.
Na verdade, vulneráveis estamos todos nós. A situação não está para brincadeira. Além desse assalto cinematográfico, na Zona Oeste – não tenho lembrança de outro igual em Pernambuco – já somam mais de 580 as investidas criminosas a ônibus, só este ano. Anotem, também, esses números: em janeiro, 479 pessoas foram assassinadas em Pernambuco. Gente, isso é número de guerra. E entre 2015 e 2016, o número de homicídios cresceu 15 por cento no Estado. No que diz respeito aos crimes contra o patrimônio, o salto foi ainda maior no período: 35 por cento. Hoje, andar com um celular virou situação de risco, pois 54 mil foram roubados no ano passado. Se a pessoa estiver sem o aparelho, também corre risco, como a violoncelista Bianca Saturnino dos Santos, que foi impiedosamente atirada de uma ponte por dois marginais, porque não tinha o cobiçado aparelho para “dar” aos bandidos. Ou seja, além de pagarmos impostos sem que sejam revertidos em serviços que merecemos – incluindo a segurança – ainda é preciso ter uma “reserva”, uma espécie de “segurança” material, para atender aos marginais.
Quando se anda por bairros populares do Recife, a situação é muito triste. Os mercadinhos, farmácias e padarias atendem aos clientes por trás das grades. Ou seja, nós, pernambucanos, estamos nas jaulas, como animais. Até mesmo os quiosques que vendem coco, no cartão postal que é Boa Viagem, estão quase todos gradeados, porque não suportavam mais a ação dos marginais. Mas aí, a gente anda mais. Encontra delegacias fechadas ou mal equipadas. Nas praças, os postos de vigilância da Polícia Militar estão vazios. Passem, por exemplo, na Praça de Casa Forte ou na Professor Fleming, na Zona Norte. Tudo vazio. E a população à mercê dos bandidos. Onde você chega, o papo é sempre o mesmo. As pessoas dizem que não vão brincar carnaval por medo da insegurança.
Pois há alguns dias, a Associação de Delegados de Polícia Civil de Pernambuco (Adeppe) enviou uma nota para todos os meios de comunicação, dando apoio a um delegado que se recusou a fazer um flagrante de infração, a pedido de dois PMs. Segundo a nota, “o delegado atuou brilhantemente na defesa de suas prerrogativas contra a interferência indevida de oficiais lotados no Décimo Primeiro Batalhão da PM, os quais tentaram induzir o delegado a erro, com a finalidade de ver formalizadas as prisões dos dois conduzidos, em desfavor dos quais era precariamente imputada, pelos referidos oficiais”. Bem complicada, essa nota.
Tá bom, os oficiais podem até ter exagerado, não sei detalhes. Mas roupa suja se lava em casa, e esse tipo de “nota de apoio” nem precisava existir publicamente. Era assunto para ser apurado pela Corregedoria. E a nota diz, ainda, não ser de hoje que “esta entidade classista vem recebendo notícias oriundas de seus representados dando conta da interferência da PM na atuação das autoridades policiais (civis)”. Sei não… Mas se a PM está fazendo isso, alguma omissão deve estar acontecendo. E pior para nós, cidadãos comuns, que ao invés de vermos as duas polícias lutando, de mãos dadas, contra o crime, se depara com notas corporativistas e inadequadas para a situação e violência a que estamos relegados. Estamos sim, todos ao Deus dará. E não há clima para piadas.
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Texto e fotos: Letícia Lins / #OxeRecife