Finalmente, foi esclarecido o surto misterioso da coceira que incomoda moradores de pelo menos 21 municípios de Pernambuco, incluindo o Recife. Ao contrário das hipóteses inicialmente levantadas, a urticária nem é escabiose (sarna) nem intoxicação pelo uso excessivo de ivermectina, remédio que foi erroneamente usado por muitos brasileiros, como forma de se “prevenir” da pandemia do coronavírus. As erupções cutâneas são atribuídas a uma mariposa do gênero Hylesia, que solta pequenas cerdas (flechetes), que provocam o desconforto ao contato com a pele das pessoas. O fenômeno não é inédito nem no Brasil nem no Continente.
Publicações científicas mostram, no entanto, que não é a primeira vez que se observa o fenômeno em nosso país. Em 1960, o problema foi detectado em Serra do Navio, no Amapá . Em 1980, em Montes Claros, Minas Gerais. O mesmo inseto já provocou um surto no Litoral de São Paulo, no século passado. Só em Bertioga – a 127 quilômetros da capital paulista – foram notificados 612 casos nos anos 1980. Entre 1989 e 1991, lesões cutâneas idênticas às notificadas no nosso estado foram constatadas em doze municípios daquela região. Há publicações com eventos do mesmo tipo no Peru, na Argentina, na Guiana Francesa e no México.

O surto em Pernambuco apareceu no mês de novembro. E foi tratado como de causa misteriosa inicialmente. Teve gente que chegou até a supor que tivesse sido provocado por algum produto químico na água. Na quarta-feira, a Sociedade Brasileira de Dermatologia pôs fim, finalmente, ao mistério que acometeu inicialmente comunidades que residem nos bairros de Dois Irmãos e Sítio dos Pintos, que ficam em área de reserva de Mata Atlântica, no Parque Estadual de Dois Irmãos. Investigação realizada pelos dermatologistas Cláudia Ferraz e Vidal Haddad Júnior mostrou que as dermatites eram provocadas pela mariposa do gênero Hylesia.
De acordo com os pesquisadores, o inseto provoca problemas em várias partes do país, durante a época de reprodução. Eles entram em ambientes domésticos, atraídos por focos de luz. E aí liberam cerdas corporais minúsculas “que penetram profundamente na pele humana e causam a intensa dermatite observada”, segundo publicação da SBD. Os pacientes relatam pruridos, sensação de queimação e manchas vermelhas na pele. Ou seja, um surto de “dermatites pápulo-eritêmato-pruriginosas, com aspecto urticariforme”. Autoridades sanitárias de Pernambuco recomendam telas nas janelas, evitar luzes fortes à noite e não varrer a casa, dando preferência ao pano molhado na limpeza, se for encontrado o inseto em suas dependências. Porque a varrição ajudaria e espalhar as cerdas tão infectantes.
Não sei se as mariposas nas residências têm a ver com algum desequilíbrio ambiental. Lembro-me que nos anos 1980 do século passado fiz uma viagem a Salgueiro, no Sertão pernambucano. Onde eu chegava, tinha gente com erupções na pele, feridas feitas. Descobri que elas foram provocadas por um insetinho chamado potó, que se via aos montes em todos os lugares. Lembro-me que ao parar em um posto de gasolina para abastecer, as bombas estavam pretas, cobertas com o bichinho. Ele pousa na pele, e quando a pessoa o tange ele solta um líquido que queima a pele. O potó surgiu após um longo período de estiagem, quando seus predadores – pássaros, mamíferos, sapos, lagartos – praticamente sumiram com a seca. Aí, o bicho proliferou que foi um horror…
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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Letícia Lins e reprodução da Internet