A ideia era um dia de atividades, para chamar a atenção para o descaso com o qual vêm sendo tratadas as duas casas em estilo modernista que ficam na Avenida Rosa e Silva, no bairro das Graças. Ambas são consideradas Imóveis Especiais de Proteção (IEPs), mas estão em ruínas, sem que nem o poder público nem proprietário tomem providências. Janelas e portas foram roubadas, as paredes estão caindo e os jardins encontram-se tomados pelo lixo. Nesse sábado, o Grupo Direitos Urbanos e a Troça Carnavalesca Empatando Tua Vista pretendiam ocupar o imóvel, para um protesto contra a omissão das autoridades para com o patrimônio arquitetônico do Recife.
Nos jardins, mesmo em meio ao lixo, haveria palestras abordando temas como A arquitetura modernista do Recife e Plano Diretor e Lei das Edificações. E também atividades com oficinas sobre azulejos, hortas urbanas e origami. As manifestações, no entanto, não ocorreram. Às pressas, os proprietários dos imóveis fecharam os acessos com tapumes, ação que ainda era concluída hoje pela manhã, durante a chegada dos manifestantes. A providência contou com autorização do Departamento de Proteção e Patrimônio Cultural do Recife.
Um dos coordenadores do Grupo Direitos Urbanos, Leonardo Cisneiros, estranhou a iniciativa do proprietário com a autorização da Prefeitura. Lembrou que os imóveis encontram-se há tempo em processo de degradação e só, agora, às vésperas do protesto, foi providenciado material de proteção. Com os tapumes, ficará mais difícil para a população monitorar o que acontece com os imóveis. O grupo teme que sejam demolidos. Os manifestantes não desistiram de protestar. Colaram cartazes nos tapumes, que alertavam: “Essas casas são patrimônio histórico municipal”. Assim, a população toma conhecimento da importância das duas para preservação da memória do Recife. Os cartazes também indagavam: “O tapume vai proteger o patrimônio ou esconder a demolição?” Também conclamavam: “Turistas, venham conhecer o nosso patrimônio histórico”.
Destacavam a Lei de Crimes Ambientais (9.605/98), que estabelece pena de reclusão de um a três anos e multa, para quem – entre outras iniciativas – “destruir, inutilizar ou deteriorar bem especialmente protegido por lei”. Os cartazes lembram, ainda, que pelo Código Penal considera-se causa “a ação ou a omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido”. No caso dos dois imóveis, tem ação e omissão. Ou então, conivência mesmo. Até porque até hoje ninguém entende como o Conselho de Desenvolvimento Urbano permitiu a destruição de um lindo sobrado do século 19, ali ao lado, no qual funcionava a Padaria Capela. Ele foi demolido, virou estacionamento e agora o terreno foi ocupado por uma farmácia que em nada contribui para preservar a memória da cidade. Do jeito que a coisa vai, não é de surpreender que os dois imóveis sejam demolidos. Mas de uma coisa todo mundo pode ter certeza: barulho não vai faltar.
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Texto e fotos: Letícia Lins/ #OxeRecife