Um pulmão do mundo totalmente ameaçado. A gente vê o noticiário, assiste o desmantelo dos instrumentos de proteção ambiental, a destruição das florestas, a tolerância – e porque não dizer conivência – com a ação criminosa de grileiros e madeireiros. Mas quando se debruça sobre os números, aí se consegue entender mais o tamanho do estrago. Estrago que só fez aumentar, nos últimos três anos. Durante a Conferência Entendendo a Amazônia especialistas mostraram os riscos que enfrenta a maior floresta tropical do mundo, o pulmão da humanidade.
“A floresta amazônica pode virar uma grande extensão do Cerrado se o país atingir 40% de desmatamento na região ou o aquecimento global chegar a 4°C”, alerta Paulo Artaxo (foto, camisa branca), doutor em ciências, mestre em física nuclear e professor da USP. “Nós estamos a meio caminho desse cenário”, afirma, ao citar os percentuais de devastação na Amazônia. “O índice desmatamento de 2020, por exemplo, chegou a 19%. Em 1988, a taxa era de 5%. A evolução é ainda mais expressiva na comparação com 1975: 0,5% de desmatamento”. Com o aquecimento global, a situação piora, conforme ele mostra: “De 2029 a 2099, é esperado para o Brasil o aumento de temperatura da ordem de quatro graus centígrados a 4,5”, afirma.
E explica a consequência: “Essa elevação pode ter impacto muito importante para a Amazônia”, afirma Artaxo. Para ele, limitar o aumento da temperatura é essencial. “Com a elevação média de 2°C, uma importante parte da Amazônia vai se tornar mais seca do que é hoje. Com 4°C de aquecimento, a perda hídrica será ainda mais significativa.” De acordo com o professor, a Amazônia está em processo de transição, em razão do desmatamento, das mudanças climáticas globais e também do avanço da agricultura. Com a seca no Norte – provocada pela devastação – haverá redução das chuvas no Nordeste e no Brasil Central, onde se concentra a produção de soja e de proteínas animais. No Sul, ao contrário, a precipitação tende a ficar acima do ideal. A própria região amazônica pode ser parte da solução para o problema, já que tem alto impacto no ciclo do carbono e da água.
“A Amazônia armazena 120 bilhões de toneladas de CO2. Isso é equivalente a 10 anos de toda a queima de combustíveis fósseis, globalmente falando”, detalha Artaxo. Entretanto, se não for preservada, essa “bomba de carbono” pode mobilizar o gás para a atmosfera e agravar rapidamente o efeito estufa, afirma o Professor da USP. “O carbono já está sendo dissipado para a atmosfera”, alertou o cientista. “A quantidade de gás carbônico assimilada pela fotossíntese da floresta está diminuindo de tal forma que, hoje, o fluxo líquido de carbono é zero. “Isso acontece principalmente pela mortalidade das árvores”, explica. Para ele, a humanidade tem um grande desafio para os próximos anos. Afinal, a redução de 6,7% na emissão de gases do efeito estufa registrada durante a pandemia precisa ser ainda mais ampla.
Contrariando a lógica de muitos produtores rurais, o ex Ministro da Agricultura, Allyson Paulinelli (foto de terno), afirmou que “o desmatamento não é bom para o Brasil” e que “a agricultura não precisa dele”. Indicado para o Nobel da Paz 2021, lembrou que a devastação dificulta a ação dos chamados “rios aéreos”, os chamados “rios voadores”, que “abastecem” as regiões agrícolas do País. “No Brasil, uma árvore está valendo mais caída do que em pé, mas nós temos esperança de que a ciência mostre o contrário”.
As palestras da Conferência Entendendo a Amazônia estão disponíveis na Internet, na íntegra, até o dia 31 de julho, no site www.entendendoaamazonia.com.br. Ainda dá tempo de conferir.
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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Letícia Lins e Conferência Entendendo a Amazônia/ Agri-Rex