A sede no “mar” de água doce

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Amigão e grande companheiro de viagem – esta é a terceira que fazemos juntos – Fernando Batista é daquelas pessoas para as quais não há tempo ruim. Temos feito longas caminhadas pelas praias de Alter do Chão, em Santarém, no Pará. E são quilômetros nos quais a gente não encontra uma só pessoa ao longo das extensas faixas de areia. Mas hoje fizemos uma besteira: esquecemos de levar água mineral. E o calor era de matar.

A ironia é que estamos às margens do Rio Tapajós, na Região Norte, onde fica o maior       reservatório de água potável do mundo. E ficar com tanta sede, ao lado de um mundão de água é, realmente, imperdoável. Aos meus primeiros sinais do desconforto, ele me deu um conselho. Ficou de quatro na areia e me sugeriu: “Com tanta água na frente da gente, faz assim, e bebe a água do rio como um cachorro”. E bebeu. E ainda ironizou, lembrando Clarice Lispector. “Se você fosse leitora dela, iria aprender a fazer uma coisa diferente todo dia”.

Mas eu voltei do meio do caminho, e passei por cerca de dez barracas, todas fechadas, sem chance de comprar água. Descobri, depois, que a cada semana só uma barraca abre (embora aos domingos, todas funcionem). E a única aberta na sexta-feira, a do Luciano, fica na Praia do Amor, bem longe de onde eu estava. Molhei a língua no rio, e voltei, seca, para comprar uma garrafa de água mineral. Mas no retorno descobri uma praia linda, mais uma, nesse paraíso cheio de belas surpresas. Pois meu amigo seguiu em frente. Somando os percursos dele de de ida e volta, foram oito horas, andando por paisagens desertas, praias selvagens, lagoas,  explorando tudo como gosta de fazer, nas viagens.

Bebendo sempre água como “um  cachorro”, do rio mesmo. Porque as mãos estavam impregnadas de protetor solar e não poderiam funcionar como cuia.  E ele decidiu ao longo da caminhada, beber água do jeito que me ensinara, de quatro, com a boca no Rio. Na volta, e sem sede, comemorou a “descoberta” de três lagoas, a fruta piranga (que não conhecíamos), uma pequena gruta e o silêncio da natureza. “Ao longo do caminho, ele era tão grande que cheguei a ter medo de minha própria sombra”. Quando ele voltou, eu já estava preocupada. Eram quase quatro da tarde. Para descontrair e esquecer a apreensão, eu quase viro um “peixe” de tanto mergulhar nas águas doces e suaves do Tapajós.

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Texto e foto: Letícia Lins / #OxeRecife

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