Uma mãe coruja, na posse da filha desembargadora no Tribunal Regional Federal. Por meritocracia!

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Hoje é um dia muito especial para uma mãe coruja. Daqui a pouco suspendo aqui as atividades do #OxeRecife, para me dirigir à sede do Tribunal Regional Federal da Quinta Região, onde minha filha, Joana Carolina, assume a vaga de desembargadora do TRF5. Na verdade, a posse festiva, porque a formal, já aconteceu desde o dia 16 de setembro, quando ela e dois colegas juízes daqui de Pernambuco foram nomeados. Somando os de outros estados, serão oito  novos desembargadores.  Joana é a primeira mulher a integrar a corte por merecimento no estado. Antes dela, uma outra mulher, Margarida Cantarelli, já tinha integrado o colegiado do Tribunal, mas na qualidade de oriunda da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PE), vaga garantida pelo Quinto Constitucional. Margarida – que foi professora de Joana Carolina na Faculdade de Direito do Recife – atuou na Corte entre 1999 e 2014.

E se autoproclama “mãe adotiva” de Joana, a quem ela muito ensinou e orientou nos caminhos do Direito. Entre os oito novos desembargadores, uma outra mulher, Germana Moraes, também integra o  quadro. Ela é do Ceará  e chega ao cargo por antiguidade. Muito bom, esse marco histórico. Sou de um tempo em que havia muito preconceito com mulheres atuando na Justiça, inclusive na estadual, onde elas chegavam a ser eliminadas dos concursos, antes mesmo da realização das provas. E a exclusão tinha, sempre, um mesmo motivo: eram mulheres. Lembro que, uma vez, fiz uma reportagem para o Jornal do Brasil, onde trabalhava, com desembargadores que eram contra essa terrível e absurda discriminação.  Um deles, Desembargador Agamenon Duarte, com seus espessos bigodões, botou a boca no trombone, ao acusar os colegas de “ginofobia”.  Isso foi no século passado, anos 80, por aí. E depois, felizmente, as mulheres foram chegando ao judiciário, inclusive na presidência do Supremo Tribunal Federal. Ainda bem.

Toque feminino na Justiça antes dominada pelo sexo masculino: jabô de renda renascença, Made in PE

Tenho muito orgulho de minha filha.  Aliás, dos três: Juliana (a segunda) e Thiago (o caçula). Eles não me decepcionam, e sempre me surpreendem com coisas boas. Agora, Joana Carolina foi dedicada, estudiosa, focada, desde criança. Chegava do colégio, tomava banho, almoçava, pegava a bolsinha e ia fazer todas as tarefas. Metódica feito o avô, Osman Lins, que estaria muito orgulhoso, hoje, se vivo fosse.  Teve a sorte, também, de ter um pai livreiro, que também não está mais entre nós, para assistir à posse da filha. Livros nunca lhe faltaram. Teve acesso a todos que precisou. Foi um destino generoso, que ela soube aproveitar muito bem. Mas pequenina, ainda, já mostrava a que veio.  Aplicada na escola, nunca pediu à mãe para orientar nas lições, fossem de matemática, ciências, português. Já mocinha e namorando com Fernando Amorim, hoje seu marido, eu até ficava encabulada diante do futuro genro. É que na hora da festinha, do encontro com os amigos, ou de um baile, Carol ficava em casa. Para estudar. E eu dizia: “Filha, você é muito jovem, precisa se divertir com seu namorado”. Ela  não ia. Só fazia estudar, dedicar-se ao futuro e à carreira que escolheu. Agradeço sempre a Fernando pela paciência dos tempos da juventude.

Carol – como a chamamos em família – é bacharel em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), com mestrado em Direito Público pela mesma instituição. No entanto, começou no ramo logo cedo, ainda na Faculdade, como técnica judiciária do TRF5. Tudo por concurso, sem peixada. Depois, atuou como procuradora do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), advogada da União e Procuradora da Fazenda Nacional. Fiel à justiça, a, lembro que chegava, à  em casa chorando, quase diariamente. Eu ficava em uma silenciosa angústia, acompanhando seu sofrimento pessoal.  Tudo por conta  do seu drama de consciência porque, como Procuradora do INSS tinha “que dar razão a quem não tem”, coisa que ela odiava e ainda odeia. Me perdoe, Carol, a confidência. Mas como juíza e agora como Desembargadora, você sempre soube e saberá utilizar a balança, afinal o símbolo não só do Direito mas do seu signo, Libra. Aliás, o nosso signo. Somos librianas, mãe e filha. Talvez por isso defendamos tanto a Justiça. Ela, nos tribunais. Eu, no meu ofício de repórter, que sempre fui.

O “grilo” como procuradora daquela autarquia mostra apenas quem Joana Carolina é: uma pessoa justa, correta, solidária. O que permeia, à luz da lei, todas as suas sentenças e decisões.  Em 1991, ela ingressou na magistratura federal em Pernambuco. E foi promovida a juíza federal titular em 2003, tendo atuado em diversas varas até assumir a 12ª Vara do Recife. Foi, depois, diretora do Foro da Seção Judiciária de Pernambuco por três mandatos consecutivos, durante seis anos, e juíza auxiliar da Presidência do TRF5 por um período de quatro anos. Antes de ser nomeada desembargadora, era coordenadora do Centro de Inteligência da Justiça Federal em Pernambuco. Minha colaboração para a cerimônia festiva de posse foi bem pequenininha. Ela me solicitou que procurasse rendas de renascença para confecção do jabô da toga. Eu nem sabia o que era jabô. Mas descobri perto da posse. Fui, então, à Casa da Cultura com o estilista e amigo Eduardo Ferreira, que me ajudou a escolher as peças tão delicadas e femininas, com as quais ela se apresenta hoje. Quem sabe para quebrar a tradição de uma justiça secularmente dominada pelos homens.

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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Christine Matos / Justiça Federal e acervo pessoal

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