Sessão Recife Nostalgia: Passeio pelos palacetes de barões e viscondes do século 19 no Recife

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Hoje foi dia de percorrer a antiga Estrada dos Manguinhos, atual Avenida Rui Barbosa, que no passado era um corredor da aristocracia pernambucana. Dizia o saudoso arquiteto, professor e historiador José Luiz da Mota Menezes que, tirando o Recife Antigo, a via é a que tem maior concentração de casarões antigos e palacetes preservados do Recife. Eram 81, dos quais só restam 14, número suficiente para se mergulhar no estilo de vida do séculos 18 e 19, quando a economia girava em torno da produção de açúcar, do algodão, da exportação de produtos agrícolas e da venda de manufaturados importados.

E a Rui Barbosa concentrava os milionários da época, que ocupavam solares, palacetes e chalés cheios de charme. Eram habitados por brasileiros ou estrangeiros, alguns com títulos de barões ou viscondes. O passeio, feito nesse domingo com o Grupo Bora Preservar, saiu do Parque da Jaqueira e foi até o Parque Amorim, passando pelo Solar da Jaqueira, Academia Pernambucana de Letras, a mansão de Henry Gibson (hoje pertencente à família Batista da Silva), Museu do Estado (antiga residência do Barão de Beberibe), Ilha de Kosta (ex residência da família Othon Bezerra de Melo). E ainda: Palacete do Visconde de Loyo (atual sede da Arquidiocese de Olinda e Recife), Solar da família Amorim ( onde funciona uma unidade da Universidade de Pernambuco). Por fim, o Solar Tavares da Silva, os dois últimos, e já bem pertinho da esquina com a Avenida Agamenon Magalhães.

Ao longo da caminhada , que é gratuita, três guias (Denaldo Coelho, Suzana Abreu e Emanoel Correia) se revezaram para contar detalhes de cada imóvel do caminho, quem construiu, quem morou, a importância dessas famílias e como alguns dos seus membros viraram nomes de vias como a Rua Amélia e a Avenida Malaquias. A primeira parada foi no Solar da Jaqueira, um bonito chalé que preserva a fachada original, com suas colunas de ferro e lambrequins (ver links abaixo). O chalé pertenceu a Elvira Mendes, filha do Barão José Rodrigues Mendes. Mendes foi o proprietário do casarão com construção datada de 1870, e no qual funciona hoje a APL. O solar está incluído por especialistas entre as mais belas casas em estilo classicista do mundo. Somente. Daí, a próxima parada foi na chamada Mansão de Henry Gibson,  datada de 1847.  Naquela época, os casarões eram cercados de pomares, e a Mansão foi a primeira a ser cercada por jardins, muito bem planejados.

Em seguida, parada no Museu do Estado, antiga residência do Barão de Beberibe, já na esquina coma Rua Amélia. Um pouco mais adiante, onde funciona o Restaurante Ilha de Kosta, encontramos um casarão construído em 1850 em estilo colonial, mas em 1920  passou por reforma, com a qual se mantém até hoje. Othon era industrial, comerciante e mais tarde fundou uma cadeia de hotéis. Quem diria que a sede da Arquidiocese de Olinda e Recife foi no passado a casa de um visconde? Pois a edificação – construída entre 1840 e 1842 – pertenceu ao Visconde de Loyo e mantém sua planta original.  Por fim, Palacete da Família Amorim, já na esquina da Avenida Agamenon Magalhães, onde morou o Comendador Antônio Marques Amorim, produtor de cana e rico comerciante. Em estilo eclético, possui 1.270 metros quadrados de área construída, lustres importados, onze cômodos e ladrilhos ingleses.

Seu jardim em estilo  francês foi destruído para virar estacionamento de uma repartição estadual. A família Amorim é centro de uma das lendas urbanas mais conhecidas do Recife, a do Papa Figo. Ele tinha uma doença para cuja cura os médicos recomendaram que comesse muito fígado. A partir disso gerou-se no Recife o boato do Papa-Figo, que andava com um saco para roubar crianças, das quais o fígado seria retirado para curar o milionário. História macabra, mas ainda hoje muito presente no imaginário popular. A última visita foi o solar que sobrevive em frente ao Colégio Vera Cruz, erguido no século 19 pelo capitalista Herculano Alves da Silva. Segundo nosso guia Emanoel Correia, “ele era dono de vários prédios que alugava ao Império e a particulares” e também possuía muitas terras na Soledade. Lembro que em meus tempos de colégio, o terreno do solar se estendia por todo o quarteirão, hoje ocupado por prédios de empresas, repartições e residenciais. No final dos anos 1960, o casarão era habitado pela família  Tavares da Silva. Depois passou a ser ocupado por repartições.  A edificação já foi ocupada pela Emprel e  onde hoje funciona lá uma unidade do TRE. Datada do século 19, essa imponente construção foi retratada por Emil Bauch, em álbum de gravuras sobre a paisagem urbana do Recife. O álbum foi produzido em 1850.

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Texto e fotos: Letícia Lins / #OxeRecife

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One comment

  1. Ótimo texto e fiel Letícia, ao que ocorreu na caminhada do Bora Preservar sobre os Casarões da Rui Barbosa! Obrigado pela matéria e pela participação!
    ????????????????????????

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