Sessão Recife Nostalgia: Nos tempos que realmente girava a Ponte Giratória

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Quando criança, eu adorava ouvir falar em uma tal de “Ponte Giratória” que, no meu entender, parecia coisa saída de livro de histórias de trancoso, como as chamávamos antigamente. É que as pontes pelas quais costumava passar, nos passeios de domingos, eram todas fixas: Ponte da Boa Vista, Duarte Coelho, Buarque de Macedo, Princesa Isabel. E me perguntava: onde ficava essa ponte que girava? Hoje, quando vejo o que dela restou, fico a pensar que o Recife teria uma atração turística a mais, se nossas autoridades não tivessem acabado com ela.

A Ponte Giratória – que infelizmente não mais gira – não povoou só minha imaginação.  Faz parte, também, das memórias afetivas de várias gerações. Nesta semana, o amigo Denaldo Coelho postou um texto sobre o saudoso monumento, em que revela como  o fato de ver a ponte, mesmo sem se movimentar, era uma festa para o então menino e seus colegas e vizinhos. Resolvi republicar seu texto, divulgado nas redes sociais dos Grupo Preservar Pernambuco, do qual é coordenador. Vejam o que ele diz:

“Quando era criança, costumava pedir ao meu pai que passasse pela Ponte Giratória, que chamávamos de Ponte de Ferro, lá pelo final da década de 1960. Era uma verdadeira festa. Meu pai enchia o fusquinha 68, novinho em folha, e lá íamos nós admirar aquela estrutura imponente, que já não girava mais, mas que ainda nos encantava pela sua beleza. Ligando o Bairro de São José e Recife, ela permanecia majestosa, mesmo sem exercer sua função original. Mal sabíamos que seus dias estavam contados. Pouco tempo depois, seria desativada e tristemente derretida como sucata”, lembra.

Giratória vista de um outro ângulo: estrutura em ferro e vão central na extensão, para passagem de trens

E acrescenta Denaldo: “Construída durante a gestão  do Governador Sérgio Loreto e inaugurada em 5 de dezembro de 1923, a Ponte Giratória era do tipo rodoferroviária e foi implantada durante o processo de modernização do Porto do Recife. As obras ficaram a cargo da Société de Construction du Port de Pernambuco, por volta de 1920. Sua localização se dava em frente à ‘Barreta’, uma pequena abertura natural existente nos arrecifes, por onde passavam veleiros com seus altos mastros e barcaças carregadas de açúcar e outras mercadorias, meios de transporte bastante comuns na época”. Lembra que “a ponte era composta por três lances: duas extremidades fixas e um vão central, dotado de mecanismo giratório, o que permitia passagem de embarcações que iam para os Cais de Santa Rita, Abacaxi, Alfândega, José Mariano e o Cais do Colégio, também chamado de Ramos e, posteriormente, do Imperador”.

E acrescenta: “Em suas faixas laterais fluía o tráfego de automóveis e ônibus, enquanto os trens passavam em trilhos do vão central. Quando ia se iniciar a movimentação  da seção, as sirenes disparavam alarmes e correntes bloqueavam o trânsito. Mas durante as manobras, acidentes ainda aconteciam, uma vez ou outra”. Denaldo lembra que com o crescimento do transporte rodoviário, a ponte foi, aos poucos, perdendo suas funções. “Além disso, problemas mecânicos passaram a comprometer o funcionamento da engrenagem, mesmo com sucessivos concertos, impedindo-a de girar”, informa ele, que é engenheiro civil e trabalha no Porto do Recife, onde integra um grupo que pretende implantar um museu sobre as atividades portuárias da cidade, por onde o Recife começou.

“Sem as funções originais, a ponte foi sendo esquecida até que foi desativada na década de 1970, quando ergueu-se uma ponte moderna, de concreto, em seu lugar”  E conclui: “É triste constatar que os governantes da época não tiveram a sensibilidade de preservar esse patrimônio, um dos poucos do gênero na América do Sul, permitindo que um símbolo tão marcante desaparecesse da paisagem recifense. Hoje, poderia estar revitalizado, integrado ao circuito turístico da cidade, gerando renda e mantendo viva a memória de tantas gerações”. Ou seja, Giratória de verdade, agora, só nas lembranças eternizadas pelas velhas fotografias em sépia ou em preto e branco. A Ponte ainda se chama Giratória, apesar de não mais girar e ter sido destruída. No momento, a que a substituiu – em concreto – encontra-se em processo de requalificação, pela Prefeitura do Recife.

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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Museu da Cidade do Recife / Interne

2 comments

  1. Que bonito depoimento!
    A Ponte Giratória faz parte das nossas melhores lembranças e é uma pena que ela tenha sido destruída em nome do ” progresso ” .Uma referência como obra ferroviária e um marco na paisagem do Recife.

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