Em tempos de perseguição aos movimentos sociais, basta uma organização ter um nome de uma figura emblemática nas esquerdas, para sofrer retaliação. Um exemplo é o que acaba de ocorrer com o Projeto Paulo Freire, no interior do Ceará. A iniciativa se destina a desenvolver ações e estratégias para famílias em situação de vulnerabilidade social e insegurança alimentar, em 600 comunidades rurais de 31 municípios do semiárido daquele estado, todos com baixo índice de desenvolvimento humano.
Mas não anda por falta de recursos. Paulo Freire (1921-1997), vocês lembram, é o Patrono da Educação Brasileira, educador e filósofo, execrado pelo atual governo. Autor de livros como Pedagogia do Oprimido, ele é o contrário de tudo que apregoam os arautos da chamada Escola Sem Partido. O Projeto Paulo Freire é um dos prejudicados por novas regras que impedem que estados e municípios sertanejos captem recursos para as áreas de agricultura, através de órgãos internacionais como o Fida (Fundo Internacional para Desenvolvimento Agrícola), que tantos serviços já prestou a produtores do semiárido que praticam a agricultura familiar, tão importante para a segurança alimentar do Brasil e, principalmente, do Nordeste.
Esse tipo de dificuldade será debatido nessa quarta-feira (2/10), em audiência pública com Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados e a Frente Parlamentar em Defesa da Convivência com o Semiárido. O debate terá como tema As contribuições das agências multilaterais na efetivação do direito humano à alimentação do Semiárido. O encontro ocorre no plenário 9, do Anexo 2 da Câmara dos Deputados, em Brasília, a partir das 14h. Segundo o Presidente daquela Frente Parlamentar, Paulo Veras (PT-PE)), a finalidade da audiência “é demonstrar para o parlamento brasileiro a importância de se manter as políticas públicas de apoio ao desenvolvimento do Semiárido”. E nós, que somos nordestinos, sabemos o quanto o homem da caatinga delas precisa.
Na pauta dessa quarta serão abordadas, também, mudanças nas regras de tomada de empréstimos de entes federativos às agências e bancos multilaterais de desenvolvimento. As mudanças impedem, por exemplo, que municípios sertanejos consigam captar recursos para agricultura e desenvolvimento social. Em 2019, já somam muitas as negativas do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão às solicitações para que estados nordestinos possam contrair empréstimos junto àquelas agências, para implementar ações de combate à pobreza no Semiárido.
Tudo porque há resolução em que projetos com investimento em agricultura passam a receber pontuação “zero”, na análise de burocratas federais, o que impede a aprovação para contração de financiamentos. “Desta forma, somente são elegíveis para financiamento projetos de infraestrutura, como os de recursos hídricos, projetos que tratem de inovação tecnológica e de disseminação de novas tecnologias”, explica o secretário de Desenvolvimento Agrário do Ceará, Francisco de Assis Diniz. Para Claus Reiner, diretor do Fida no Brasil, que confirmou participação no evento, “essa audiência vem no momento oportuno porque o desenvolvimento desigual e as mudanças climáticas precisam de uma resposta política e alianças fortes”. E assegura: “O Fida oferece a experiência e os recursos dele para fazer parte
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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Foto: Manuela Cavadas /Asa / Divulgação