Não sou ciclista. Sou pedestre e motorista. Como pedestre, resolvo 90 por cento de minhas demandas (padaria, farmácia, pagamentos, levantamento de informações para o #OxeRecife, etc). Como motorista, cuido da parte restante (supermercado, praia, cinema, passeios mais distantes). Mas tenho o maior respeito por quem anda de bike, nesse Recife de trânsito que considero selvagem. Por exemplo, todo dia me defronto com motorista apressadinho, que fica buzinando ou xingando, simplesmente porque puxo o carro um pouco à esquerda, na faixa de rolamento, para me afastar de uma bike. Ou melhor, para cumprir a distância regimental, imposta pelo Código de Trânsito Brasileiro. Como rodo por vias movimentadas, sempre encontro esses “apressadinhos”, que querem ultrapassar a todo custo, mesmo que se coloque em risco a segurança do ciclista. E haja buzina. Para mim, esses motoristas não passam, sim, de “mal educadinhos”.
De acordo com o artigo 201 do CTB, ao ultrapassar um ciclista, você tem que dar uma distância de um metro e meio, para que ele trafegue com mais segurança. Mas tem condutor de carro que não entende isso. Ou não quer que a gente cumpra o que a lei determina. Que saco! Esses são daqueles que buzinam para a gente cortar o sinal, mesmo ele estando vermelho, ou sabendo que o avanço pode fechar o cruzamento. Com as bikes, então, é um Deus nos acuda. Vejam só: de acordo com o Detran, nada menos de 2.671 pessoas foram reprovadas no exame de habilitação, porque desconheciam aquela norma. Isso de janeiro até agosto de 2017, segundo informações repassadas ao #OxeRecife. E fora dos perímetros urbanos, também há problemas. “Os ciclistas precisam de mais respeito em todos os espaços, e nas rodovias federais não é diferente”, diz Elissa Urquiza, assessora de comunicação da Polícia Rodoviária Federal.

Felizmente a falta de respeito tende a se reduzir. Pelo menos, a julgar pelo que dizem alguns ciclistas. Pode até demorar, mas a educação no trânsito tem que vir um dia. “Resolvi não usar mais carro em 2013, e desde então, acredito que os motoristas estão menos hostis conosco no trânsito”, afirma Roderick Jordão, um dos coordenadores da Ameciclo. “A maioria respeita, mas o problema é que uma minoria que não respeita é suficiente para colocar a vida do ciclista em risco”, diz Cézar Martins, da Ameciclo e da CicloAção. Há quatro anos, a minha professora de Pilates, Paula Hirakawa, decidiu vender o carro e aderir por todo o tempo à bike. “Acho que a situação evoluiu um pouco, já não escuto tanto buzina de motorista me apressando”, diz. “Procuro sempre interagir com os motoristas ou motociclistas, inclusive avisando que vou entrar ou para pedir a vez no cruzamento”. Para Paula, o vilão do ciclista ainda é o ônibus. “Esses, fazem questão de passar raspando”. Meu filho, Thiago Pereira, é outro que aderiu à bike. Ele rodou de bike por um bom tempo, sofreu um acidente terrível por imprudência de um motociclista, e desistiu desse meio de transporte por cinco anos. Há um ano e meio, decidiu recorrer novamente à bicicleta, para se deslocar de Apipucos (Zona Norte) à Boa Vista (Centro), onde trabalha. No último “teste”, a bike se revelou mais rápida (40 minutos) do que o ônibus (uma hora e meia). E mais ligeira, também, do que o carro (uma hora e cinco minutos). Ou seja, diante do trânsito do Recife, a bike virou uma “mão na roda”.
“Acho que os motoristas estão nos respeitando mais do que no passado, mas não ainda de forma insuficiente para garantir nossa segurança”, diz Thiago. E comemora: “Antes, a regra era parar na esquina, para o carro não passar por cima de você, mas hoje já tem que dê a vez. Eles esperam a gente passar, para entrar depois”. Thiago reclama da invasão indevida nas faixas destinadas a ciclistas, principalmente a da Estrada do Arraial, na Zona Norte do Recife, por onde trafega de duas rodas diariamente. “Os carros estacionam, e me defronto muito com motos, inclusive no sentido contrário”. A mesma queixa faz Roderick: “Há muito desrespeito às ciclovias, sempre invadidas por motos”, conta. E diz que vê, também, muitos veículos grandes ocupando a faixa, sejam caminhão de lixo, do correio ou outros, descarregando. Ele reclama de motoristas que não acendem a sinaleira para indicar que vão entrar, pondo em risco a segurança do ciclista. “Aconteceu na quarta-feira, na Avenida João de Barros, quando o motorista não deu distância nem sinal”, relata. Apesar do nosso trânsito selvagem, inclusive com os ciclistas, há quem ache que a situação não é assim tão ruim. Esta semana Paula hospedou um amigo de Blumenau. E ele achou que os motoristas recifenses não são tão hostis com os ciclistas, quanto na capital onde ele reside. “Aqui até buzinam menos”, ele comentou. Então, deve ser horrível transitar por lá….
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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Letícia Lins e PRF / Cortesia