Algumas vezes em que caminho no entorno da Praça de Casa Forte me defronto com um frutinho amarelo, espalhado aos montes, pelo chão. Não sou bióloga, porém não consigo disfarçar a curiosidade quanto às espécies de árvores e, por esse motivo, costumo perguntar aos passantes se sabem o nome daquele fruto. E as respostas são as mais variadas: “cajá”, “mangaba”, “abricó-de-praia”. Teve gente que disse até que era “araçá”. Um funcionário da Autarquia de Manutenção e Limpeza Urbana (Emlurb) me informou, no entanto, que a árvore se chama “graci” e que é natural da Amazônia, sendo a “única dessa espécie que existe no Recife”.
Fiz pesquisa no Google sobre essa árvore graci – este seria o nome popular – mas não constou nenhuma informação. Então procurei a agrônoma Nelbe Krause, da Emlurb, que é uma das responsáveis pela vegetação das praças da Região Política Administrativa 3 do Recife, que tem cerca de 30 bairros, incluindo Casa Forte, que fica na Zona Norte do Recife.
Entre outros bairros que ficam na RPA 3, estão Apipucos, Dois Irmãos, Tamarineira, Jaqueira, Graças, Espinheiro, Aflitos e Poço da Panela, alguns deles com áreas verdes, remanescentes de Mata Atlântica. “A planta é uma Pouteria sp, porém não sei se é o único exemplar no Recife, mas com certeza é a única da espécie na RPA 3″, informa a agrônoma.
A Pouteria é um gênero botânico que pertence à família Sapotaceae, na qual calcula-se que haja pelo menos umas 325 espécies no Brasil, algumas das quais já encontram-se praticamente extintas na natureza. É o caso da Pouteria do Rio de Janeiro (Pouteria stenophylla). De acordo com os pesquisadores, dependendo do fruto, as pouterias atraem papagaios, tucanos, sabiás e sanhaçus. Nelbe experimentou um fruto da Pouteria de Casa Forte. “Achei saboroso, um pouco ácido, e dizem populares que funciona bem contra desinteria”. Dependendo da espécie, uma pouteria pode ter de quatro a 24 metros de altura. Entre os frutos produzidos por algumas das espécies encontram-se o manguito, o sapoti, abiurana, caimito, o abricó-de-praia. Mas, finalmente, qual seria o nome do fruto da Pouteria sp de Casa Forte? Segundo Nelbe, é “abiu”.
O abieiro é uma planta nativa da Amazônia e das regiões costeiras de Mata Atlântica. E quanto à Praça de Casa Forte, como vocês sabem, é hoje um jardim histórico, tombado pelo Iphan. Pois foi o primeiro projeto paisagístico em área pública com a assinatura de Burle Marx (1909-1994), que depois se tornaria mundialmente consagrado. Quando ele redesenhou a Praça decidiu dividi-la em três jardins: o primeiro dedicado à diversidade de espécies do território brasileiro, nas quais incluiu árvores de biomas como Cerrado, Caatinga, Mata Atlântica. No segundo (central), ele utilizou plantas da Amazônia. E o terceiro dedicou a plantas exóticas, provenientes de outros continentes como Ásia (Malásia) e África (Madagascar).
Alguns trabalhos acadêmicos relacionam a presença de 57 espécies, 52 gêneros e 27 famílias botânicas na paleta histórica original da Praça de Casa Forte, uma das mais bonitas do Recife e que ganhou fama pela presença de vitórias régias, que hoje não mais ornamentam seus espelhos d´água. Lembro-me quando, ainda criança, via as plantas aquáticas na Praça. Eram belíssimas. E fiquei encantada quando vi no livro didático do colégio, que era uma espécie da Amazônia, então uma região cheia de mistérios para a então criança. Aqueles números e nomes de espécies constam da publicação Praça de Casa Forte, jardim histórico e patrimônio cultural de Pernambuco, na qual o autor, Joelmir Marques da Silva não faz nenhuma referência à Pouteria sp. Será que plantaram depois? O projeto de Burle Marx para a Praça de Casa Forte – que já existia antes – data da década de 1935. E não é só a vitória-régia que não existe mais ali. Outras espécies relatadas na paleta sumiram ao longo do tempo.
Nos liinks abaixo, você poderá conferir curiosidades sobre outras árvores existentes no Recife e em outras regiões do Brasil.
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Texto e fotos: Letícia Lins / #OxeRecife