Pernambuco zera leitos psiquiátricos: Pacientes vão para casas terapêuticas ou voltam às famílias

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Pernambuco encerra a semana com duas grandes notícias, ambas na área de saúde. A primeira é que o Estado zerou, no mês de agosto, o número de leitos psiquiátricos em hospitais de longa permanência. Os pacientes deixam o ambiente sinistro dos hospitais e passam a residir em casas terapêuticas ou voltam para o convívio da família.   A segunda notícia é que foi realizado aqui o primeiro transplante ósseo em um serviço estadual de saúde em PE, no caso o Hospital Otávio de Freitas, procedimento que poderá ser estendido ao SUS.

No primeiro caso, a iniciativa pode dar a impressão de que não há mais atendimento com internação para pacientes psiquiátricos. Não, não é isso. É que, por muitos anos, os hospícios impunham tratamento desumano a pessoas com doenças mentais, até que teve início a luta antimanicomial, que estabelece outro modelo de atendimento. E que preconiza a implantação de residências terapêuticas, que livram os pacientes do pouco saudável ambiente psiquiátrico hospitalar. Como repórter, pude testemunhar ao longo da profissão, casos estarrecedores de atendimento em hospitais e pude ver, também, como os pacientes tiveram melhor qualidade de vida morando em casas, com direito a acompanhamento médico. O pior exemplo testemunhei no Hospital Alberto Maia, no município de Camaragibe,  na Região Metropolitana, que encerrou as atividades em 2010. Mas lá percebi, também, como melhorou a qualidade de vida dos pacientes, quando começaram a ser abrigados em casa. Cheguei até a entrevistar alguns, antes e depois da mudança. Não foi uma conversa fácil, mas terminei com colhendo opiniões terríveis sobre a vivência deles no manicômio. Depois, a mudança de água para o vinho.

A Secretaria de Saúde informou que o Hospital Colônia Professor Alcides Codeceira (foto abaixo), em Igarassu encerrou as atividades. Era o último com leitos psiquiátricos de longa permanência.  Isso quer dizer que, agora, não há mais nenhum paciente com transtorno mental grave com longo tempo de internação residindo em instituições psiquiátricas. Em trabalho integrado com a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), as equipes técnicas da Secretaria, junto às gestões municipais, conseguiram reinserir as últimas 78 pacientes moradoras do hospital ao convívio em sociedade e comunitário. Isso no núcleo familiar ou em serviços residenciais terapêuticos (SRTs). Estas residências terapêuticas são locais de moradia em espaços urbanos voltados para pacientes com transtornos mentais, institucionalizados ou não.  O Codeceira funcionava desde 1950, mas o processo de fechamento começou em 2020. Alguns dos pacientes tinham duas décadas de internação.

Funcionando desde a década de 1950, O Codeceira fecha as portas e zera os leitos psiquiátricos em hospitais.

“A proposta é não apenas desinstitucionalizar os pacientes, como também reinseri-los na sociedade, conferindo-lhes a cidadania, um direito básico de todo ser humano”, pontua o secretário estadual de Saúde”, André Longo.   Todo o processo de desinstitucionalização foi acompanhado e fiscalizado pelo Ministério Público de Pernambuco (MPPE), um dos principais órgãos de controle da sociedade (ainda bem!) . Em 1999, Pernambuco possuía 16 instituições hospitalares psiquiátricas: 13 privadas/conveniadas ao SUS e três sob gestão estadual. Ao todo, eram mais de 2,9 mil leitos psiquiátricos. Neste período, o estado ocupava a terceira colocação entre as unidades federativas com maior concentração de leitos SUS de Psiquiatria do Brasil, ficando atrás apenas dos estados do Rio de Janeiro e São Paulo. A partir dos anos 2000, o Estado avançou no processo de desinstitucionalização com o fechamento e/ou descredenciamento das instituições psiquiátricas, ao passo que ampliou os serviços substitutivos na Rede de Atenção Psicossocial. Atualmente, Pernambuco conta com 115 leitos de urgência e emergência em psiquiatria, todos no Hospital Ulysses Pernambucano (HUP), mais conhecido como Hospital da Tamarineira. A unidade é voltada especificamente para estes casos, além de 163 leitos integrais de saúde mental em hospitais gerais.

Entre os demais dispositivos da RAPS, Pernambuco possui 146 Centros de Atenção Psicossocial (CAPs); 18 Consultórios de/na Rua; 07 unidades de acolhimento; e 105 residências terapêuticas. Todos esses equipamentos funcionam sob gestão municipal, com o apoio do Estado. Além disso, Pernambuco tem 366 beneficiários do Programa de Volta para Casa (PVC), iniciativa federal que concede auxílio financeiro a pessoas com transtornos mentais com histórico de internação em instituições de longa permanência a partir de dois anos ininterruptos, seja em hospitais psiquiátricos ou em hospitais de custódia. A outra novidade é que nesta semana, a equipe de traumatologia e ortopedia do Hospital Otávio de Freitas (HOF) realizou um importante passo para a especialização do atendimento de pacientes no Sistema Único de Saúde (SUS) em Pernambuco.  É que a unidade realizou o primeiro procedimento de transplante ósseo em um serviço da rede estadual de saúde. O HOF – que realiza atendimentos de alta complexidade em traumato-ortopedia – está iniciando o processo de solicitação de credenciamento junto ao Ministério da Saúde para se tornar unidade transplantadora na área.

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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: SES / Divulgação

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