Hoje de manhã vivenciei uma história maluca. Estava fotografando uma vítima de arboricídio, quando um “lavrador”, dizendo-se residente em Bezerros (Agreste de Pernambuco) me interpelou, ali, na Rua da Harmonia, em Casa Amarela. Ele estava à procura de um veterinário, cujo nome prefiro não citar. Mas não estava encontrando o endereço, pois nem nome de rua havia no papel que ele carregava no bolso. Estivera no Recife há 20 anos e, ao ver as mudanças, não reconheceu mais o mesmo destino no qual estivera há tanto tempo. Acostumado aos limites do sítio, perdeu-se na cidade grande. Cuidado, se você for abordado ou abordada na rua por tipos como esse. Fique ligado. É golpe.
No pequeno pedaço de papel o nome (fictício, claro) do profissional escrito, e um vale que lhe garantiria receber R$ 33 mil do “doutor”. É que o “veterinário” que “cuida” do gado do lavrador e de sua família, costuma “comprar” bilhetes nas lotéricas. E, já marcados, revende nos sítios do interior quando “visita” seus clientes para vacinar os rebanhos. Quando um bilhete é premiado, ele paga algum valor ao sortudo e fica com o resto. Pelo menos, isso foi o que eu entendi ao ouvir a história que Antônio, um falso caipira me contou,ao me parar no meio de minha caminhada. E ele estava no Recife para “receber” o dinheiro prometido pelo veterinário, mas não achava o endereço. Não tinha ideia, no entanto, de que tinha virado um “milionário”.
Me pediu ajuda e a um senhor que passava no momento no local. Moral da história: os R$ 33 mil não foram pagos ao lavrador, lá no interior, porque no momento em que o veterinário foi na sua casa, ele “estava for”a. E a mãe não sabia onde “estava” o bilhete premiado. Antônio o tinha guardado em uma gaveta. Então, veio com ele ao Recife. Pois só receberia os R$ 33 mil entregando o bilhete ao veterinário. E nos mostrou o bilhete. Era um prêmio de um único ganhador, superior a R$ 4 milhões. Ou seja, eu estava diante de um milionário que ia ser “ludibriado” por uma pessoa que ele conhecia. Mas na verdade, tanto o caipira quanto o senhor bem educado que apareceu para ajudar eram vigaristas. Uma dupla de vigaristas, aliás.
“Lá no sítio teve um vizinho que ganhou uma vez e recebeu R$ 30 mil do veterinário. Ele sempre faz isso. Revende bilhete marcado prá gente, e quando sai algum prêmio ele nos paga em dinheiro”, contou Antônio, mostrando-se totalmente “ingênuo”. O senhor disse ser auditor da Receita Federal. E prometeu ajudar Antônio e a desenrolar o pagamento do prêmio na Caixa Econômica. Disse até que falara ao telefone com o Gerente, na Agência da Ilha do Leite (não sei se falou mesmo ou fingiu que falava). Analfabeto, o lavrador aceitou a ajuda. E queria que eu fosse junto. Os dois disseram que iam à Caixa Econômica Federal, retirar a quantia do bilhete premiado.
Por segurança, enviei a informação via Whatsapp à minha gerente, na Caixa Econômica. Pedi apenas para ficar alerta sobre um cidadão que vai chegar lá com o “pobre novo rico” da Quina. Relatei que o premiado é um analfabeto e pedi cuidado para que ele não fosse, por uma segunda vez, enganado por outro vigarista. Não sei o que aconteceu. Mas, a princípio, fiquei preocupada com Antônio porque, pelo visto, o “bom moço” estava disposto a fazer de otário o lavrador analfabeto. E sem testemunha. Confesso que fui dormir intrigada com essa história. E fiquei a pensar quem era o golpista ou os golpistas. Procurei o nome do “veterinário” na Internet, mas o homônimo que achei não mora no Recife. Fiquei sem saber se o trabalhador rural era um vítima, ou se se fez de vítima no Recife para aplicar golpes com seu desenrolado e aparente “salvador” urbano. Depois, eu soube que esse é um golpe comum e que uma dupla de vigaristas havia sido presa no Recife. O “milionário” falso e seu auxiliar. Não sei se são as mesmas pessoas, porque os nomes nãoforam divulgados.
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Texto e foto: Letícia Lins / #OxeRecife