Arquiteto, historiador, urbanista, professor-emérito da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), José Luiz da Mota Menezes nos deixou hoje, aos 85 anos, após perder a batalha contra o câncer. Seu corpo será velado hoje à tarde, na Academia Pernambucana de Letras, no bairro das Graças. Sem ele, pode-se dizer que o Recife fica mutilado, porque José Luiz era a memória viva da história da cidade.
Mas nos deixa pelo menos 50 livros como legado, boa parte deles sobre o Recife, seu passado, seu traçado original, os casarões, a sua formação urbana. A última vez que o vi foi no Museu do Estado, durante o lançamento de uma de suas últimas obras: “Palacetes e Solares dos Arredores do Recife”, fartamente ilustrado com fotografias que mostram o modo de viver dos abastados da cidade, no século 19. “O livro não é a história da arquitetura, mas a história social de uma cidade em transformação”, disse à época.
Ele me informava que tinha, ainda, muito material para escrever outras obras com foco na cidade. Presidente por duas vezes do Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano por duas vezes deixou como legado uma obra de valor inestimável. Só pela Cepe Editora lançou os livros Mobilidade Urbana no Recife e seus arredores; Ruas sobre as águas: as pontes do Recife, além de Recriação do paraíso: judeus e cristãos-novos em Olinda e no Recife nos séculos 16 e 17, todos publicados em 2015.
Entre outros façanhas, José Luiz foi o responsável pela restauração de prédios como os da Catedral da Sé, Igreja de Nossa Senhora da Graça, antigo Palácio do Bispo (Sítio Histórico de Olinda). No Recife, levam sua assinatura as reformas da Casa da Cultura, Palácio da Justiça, antiga Estação do Brum, antiga Sinagoga da Rua do Bom Jesus e Paço Alfândega. Só por aí, já dá para se perceber a importância de Luiz da Mota Menezes para preservação da memória do Recife.
Nós, que somos jornalistas muitas vezes bebemos de sua sapiência. De repente você está escrevendo um texto, e bate aquela dúvida sobre um fato ligado à história do Recife. E era para José Luiz que apelávamos. Minha amiga Cleide Alves, que passou muitos anos fazendo reportagens sobre patrimônio cultural do Recife sabe disso. De minha parte, perdi as contas das vezes que liguei para José Luiz para pedir ou checar informação histórica. E ele era sempre muito paciente, tinha prazer de nos ensinar, de transmitir.
Em 2017, ele recebeu a mais alta comenda ofertada pela Prefeitura do Recife, a “Ordem do Mérito Capibaribe da Cidade do Recife – Grã Cruz”. Ao entregar a comenda, o então Prefeito Geraldo Júlio (PSB) disse ser José Luiz “baluarte da preservação e construção do Recife”. E era mesmo. O Recife está muito mais pobre. Ele foi foi um dos responsáveis pela conquista do título de Patrimônio Cultural da Humanidade de Olinda, concedido pela Unesco em 1982. O arquiteto tinha a leitura como uma de suas paixões e guarda mais de 11 mil livros na biblioteca de sua casa. Em seu discurso ao receber a comenda, ele orgulhou-se em ter as obras como único bem.
O professor chegou a parafrasear o escritor Ariano Suassuna para agradecer a comenda. “É bom receber a homenagem em vida, porque depois de morto não se vê nada”, brincou. “Para mim é uma satisfação, porque tenho uma relação muito grande com essa cidade. Comecei a conhecer o Recife ainda pequeno, ao lado do meu pai, que me mostrou todos os cantos dessa cidade”, disse ao receber a homenagem, pois ele começou a se familiarizar com os palacetes e solares ainda menino, quando caminhava com o pai pela cidade. O governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), decretou luto oficial de três dias.
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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife