Autor de romances históricos e à véspera de lançar mais um livro – dessa vez com biografias – o escritor Paulo Santos acusa um “frenesi absolutista” no governo central, diante do desrespeito às instituições democráticas e às ameaças de golpe, desferidas pelo próprio Presidente Jair Bolsonaro. Ele estabelece um paralelo entre o que acontece hoje e a história vivenciada pelo Brasil anos anos 20 do século 19.
“Em 1823, D. Pedro I fechou o Congresso Nacional Constituinte, prendeu oposicionistas e impôs aos brasileiros uma carta magna ‘digna de mim’, nas palavras dele”. Ou seja, tudo que o Capitão almeja. Um Brasil dele. “Hoje vemos um novo frenesi absolutista no governo central do País”. Depois acrescenta, voltando-se para a história de Pernambuco, que sempre esteve na “pole position”, quando o assunto é luta pela liberdade. “O personagem que poderia nos servir de inspiração certamente seria Frei Caneca, que liderou os pernambucanos na luta em defesa da democracia, na Confederação do Equador”. Frei Caneca é um dos personagens abordados em 65 biografias, que constam no livro Pernambuco, História e Personagens, que Paulo Santos lança às 19h da quinta-feira(9/9), em live transmitida pelo Canal da Cepe no Youtube.
Cinquenta dessas histórias foram publicadas semanalmente no Diário de Pernambuco, na forma de minibiografias, entre os anos de 2016 e 2017, como parte das comemorações relativas ao Bicentenário da Revolução de 1817. Quinze outras foram agora incluídas. Na edição constam nomes como Ganga Zumba, Duarte Coelho, Domingos Calabar, Felipe Camarão, Maria Graham, Ana Paes, Frei dos Óculos. Também inclui nomes da história mais recente como Francisco Julião, Celso Furtado e Gregório Bezerra. O principal critério do autor para selecionar os personagens foi que a narrativa das suas vidas lançasse luz sobre diferentes aspectos dos episódios históricos abordados. Ele escolheu padres para realçar o papel da Igreja, militares para assuntos bélicos e políticos para as questões do poder..

Sempre focado no gênero, Paulo Santos escreveu também A Noiva da Revolução, livro sobre o movimento de 1817, que inspirou o premiado filme A Revolução Esquecida, da cineasta Tizuka Yamazaki, com participação do autor no roteiro. O documentário, inclusive, foi vencedor do prêmio TAL, Televisón América Latina, em 2018. “Meu propósito é apenas contribuir para aumentar um pouco o interesse por esse tesouro oculto, por essa verdadeira botija que costuma aparecer nos sonhos de muita gente, pedindo para ser desenterrada: a memória popular do passado pernambucano”, dizPaulo. O livro é interessante para estudantes, profissionais liberais, professores e pessoas de outras profissões que têm interesse na nossa tão rica história. E bota riqueza nisso. Veja o que ele diz:
Ao longo de cinco séculos, Pernambuco esteve na “pole position” política nacional. Nos primeiros cem anos da colonização, era a capitania mais próspera. Olinda, sua capital, era a “Pequena Lisboa” e a “Cabeça do Brasil”. No século 17, começou a ser forjada aqui a identidade nacional, com a expulsão dos holandeses, sem apoio de Portugal, e o Quilombo dos Palmares foi a maior experiência de resistência popular da história brasileira. No início do século 17, a Guerra dos Mascates foi o primeiro ensaio de independência de uma colônia europeia ocorrida nas Américas. Na primeira metade do século 19, tivemos a Revolução de 1817, a Confederação do Equador e a Praieira, nas quais nos batemos radicalmente por liberdade, justiça e democracia – na Praieira, chegou-se a discutir socialismo. E na segunda metade do século 20, com o governo popular de Miguel Arraes e as Ligas Camponesas, fomos manchete nos maiores jornais do mundo. Infelizmente, pouca gente tem consciência disso, e nós, pernambucanos, dormimos em cima de uma botija, ignorando toda essa riqueza.
Apesar de tanta riqueza história, a população não parece estar tão ligada nos homens e mulheres que fizeram Pernambuco. Paulo Santos se queixa de um certo desinteresse da população por sua própria memória, apesar da dedicação de estudiosos, museus locais, Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico, e da Academia Pernambucana de Letras. Mas acredita que também faltam livros, quadrinhos, filmes e seriados que a popularizem. Por isso concentrou seu trabalho na forma.
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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Foto: Divulgação / Cepe