O drama das nossas calçadas

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É cada dia pior a situação das calçadas do Recife. Sejam elas de estabelecimentos particulares (legalmente encarregados pela própria manutenção) ou de áreas públicas (de responsabilidade da Prefeitura). Posso dizer, com a maior segurança, que nem o privado nem o setor público cumprem com o seu papel nessa área. No Centro da nossa cidade dá até medo caminhar,  em bairros como São José, Boa Vista e Santo Antônio. Pois o que a gente vê é situação como esta da foto acima, que fica na Rua Princesa Isabel, bem pertinho da Faculdade de Direito. Como um cadeirante pode se locomover nessa calçada, chegar até o ponto de ônibus, se o caminho é uma buraqueira só? Não dá. E quem não é cadeirante tem risco de cair, tropeçar, pisar em falso em alguma pedrinha solta.

Mas meu amigo Sidney Rocha me revela um outro tipo de preocupação. Dessa vez não com as calçadas desgastadas, mas sim com as que acabam de ser implantadas, na Avenida Conde da Boa Vista. À primeira vista, achei-as mal acabadas, com falhas no assentamento das pedras, trechos no cimento puro, recortes mal desenhados. Mas ele me faz outro tipo de observação:  “A sinalização para deficientes visuais levará a cabeça do deficiente direto para a coluna. Será  preciso usar capacete agora”, ironiza o autor de Guerra de Ninguém. A calçada em questão fica no cruzamento da Avenida Conde da Boa Vista com a Rua da Aurora, mais precisamente na frente do São Luiz. “É a aquela já finalizada do cinema”, informa.  Foi aí que caí na real. Além da obra mal acabada, o traçado relativo ao piso tátil – para pessoas cegas ou com baixa visão – parece não estar adequado. Como não entendo do assunto, recorro, mais uma vez ao pessoal do Cidadania a Pé. Aparentemente, há falhas na concepção da calçada.

Pergunto a Francisco Cunha, urbanista, arquiteto e consultor, e um dos líderes da Cidadania a Pé , criador do Observatório do Recife e coordenador das Caminhadas Domingueiras.  Ele consulta Ângela Carneiro da Cunha, arquiteta e especialista em acessibilidade. Ela informa que a norma do piso ABNT NBR 16537 tem uma exigência sobre distância mínima entre a sinalização tátil e direcional e obstáculos. Diz a tal norma:” Deve haver um metro de distância entre a sinalização tátil de direcionamento e as paredes, os pilares e outros objetos, contando-se um metro desde a borda da sinalização tátil”. Nesse caso, como previu o escritor, a calçada está inadequada mesmo.

Porém a mesma norma acoberta falhas como a da calçada da Avenida Conde da Boa Vista, pois abre para aquilo que a gente entende como risco par cegos. “Eu acho essa norma muito ruim e exagerada. Observe que ela dá a opção de redução da dimensão da distância entre o piso e o anteparo, no caso de adequação de calçadas. É que como se observa no item 7.7.2 (ao lado esquerdo), aquela distância pode ser inferior a um metro, quando os obstáculos – pilastras, colunas – já são existentes. Mas.. e então?

Inferior a um metro? E o piso tátil pode ficar, então, rente ao obstáculo. Sinceramente, mesmo com a norma, custava nada apelar para o bom senso e deixar uma distância um pouco maior entre o piso tátil e a coluna de concreto da calçada?  Mas de acordo com a especialista, “o cego só bate a cabeça quando o objeto está suspenso por uma base menor que ele e sua altura é inferior a 2m10cm. Como orelhões, lixeiras, extintores”. Como a pilastra vai até o chão,  teoricamente a bengala guia do cego pode indicar o obstáculo, livrando-o de levar uma pancada na cabeça. Bom, é o que dizem os especialistas. E você, que acha? Você faria o piso tátil rente com o obstáculo como o da foto (à esquerda) ou daria uma distância maior para melhor proteger o pedestre cego?

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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Letícia Lins e Sidney Rocha / Cortesia

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