Parece até um objeto espacial. Mas é um bicho marinho, uma raia gigante. Apesar de imensas – podem atingir até oito metros de envergadura e pesar mais de duas toneladas – as Mobulas birostris não possuem ferrões, são inofensivas e encontram-se enquadradas como espécie em situação de vulnerabilidade, podendo chegar à extinção. Felizmente, no Brasil a legislação ambiental proíbe a pesca desses belíssimos animais. Mas o incrível vem agora: elas aparecem com frequência em Fernando de Noronha. Como são jovens, pesquisadores suspeitam que ali funcione um berçário das mantas,como esses animais também são conhecidos. Caso confirmado, o berçário seria o primeiro da espécie, comprovado no mundo. Ou seja, a vida marinha sempre surpreende, naquele santuário ecológico, localizado a 543 quilômetros do Recife, e onde a natureza tem mais é que ser preservada e cada vez menos perturbada (ao contrário do que mostram pretender as autoridades lá de Brasília).
A descoberta dos animais provocou um certo alvoroço entre turistas em Fernando de Noronha, mas o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) impôs restrições no local de agregação das raias. Além de sinalização, banhistas foram proibidos de tocar nas mantas e mesmo de entrar na água, no local da concentração dos animais. Quem desrespeitar a determinação pode ser responsabilizado por crime ambiental. Pelo que se observa, as raias devem usar o arquipélago como alimentação e proteção natural. O curioso é que a observação do fenômeno deveu-se a um fato não natural: os refletores do Porto de Santo Antônio. A partir da iluminação do porto, foi possível observar as raias próximas ao costado. “O local era escuro à noite, mas o vento reposicionou refletores. A luz artificial provocou a concentração de zooplâncton (animais minúsculos) e as mantas passaram a frequentar o lugar para se alimentar”, informa o Projeto Mobulas do Brasil, que monitora as mantas em Noronha.
A descoberta da presença das mantas foi de Fernando Rodrigues da Silva, Sílvio Silva Santos e Doug Monteiro, que são instrutores de mergulho da Operadora Sea Paradise. Já o registro de comportamento – como um incrível balé noturno das raias – foram feitos pelo cinegrafista Fábio Borges, da equipe de investigação da Hydrosphera Produções, que integra a equipe do Projeto Mobulas do Brasil, sendo este o braço brasileiro da Manta Trust, que é considerada a maior instituição do mundo voltada para o estudo da espécie. Em Noronha, quem coordena o trabalho de campo é o mergulhador Guilherme Kodja, que há 15 anos investiga a ocorrência das mantas na costa brasileira e em outras partes do mundo.
De acordo com o pesquisador, está comprovado que a iluminação artificial atraiu as raias, em fenômeno semelhante ao que ocorre em ilhas do Havaí, onde animais da espécie são atraídos pelas luzes de um hotel, desde os anos 1990. Cientistas pretendem descobrir se os animais fazem residência no Arquipélago ou se estão em processo migratório, através do estudo da genética dos animais. “Precisamos saber se esse grupo que aparece em Noronha é o mesmo que ocorre próximo da região do Caribe e Golfo do México, e fazer alguns cruzamentos de informações”, afirma Marcelo Rodrigues dos Anjos, professor da Universidade Federal do Amazonas.
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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Fábio Borges / Projeto Mobulas do Brasil/ Rede Manta Trust/ Divulgação