Tem gente que coleciona as camisetas da Troça Carnavalesca Independente Nóis sofre mas nóis goza, desde o início da agremiação, que surgiu nos anos 70 do século passado e que até 2020 animou o carnaval na Rua Sete de Setembro, reunindo não só antigos foliões da extinta Livro 7, como também aqueles que fugiam da multidão do Galo da Madrugada.
As primeiras camisetas foram improvisadas, pintadas a mão. Depois, o artista plástico Cavani Rosas fez algumas delas. Mas a partir de 1981, todas as outras foram ilustradas pelo cartunista Lailson. Em 2021, não teve carnaval, devido à pandemia. E o principal animador da troça, o livreiro e editor Tarcísio Pereira, infelizmente foi devorado pelas sequelas da Covid-19, depois de lutar dois meses pela própria vida. Como muitas pessoas passaram a procurar a camiseta de 2021, para não interromper a coleção, a Vila 7 está fazendo em seu site a pré-venda das camisetas do carnaval que não houve. Elas podem ser adquiridas até 25 de fevereiro e serão entregues até 03 de março. Há duas versões. Uma na cor preta e outra branca. A camiseta custa R$ 80 e o pagamento pode ser parcelado em todos os cartões.
Também pode ser comprada à vista com débito em conta, PIX ou boleto bancário. É só clicar no link htpps//www.familiavila7.com.br/papelaria-vila7/parceiros. “As duas camisetas têm a imagem do nosso inesquecível Seu Sete, liderando o carnaval em outra dimensão”, afirma Juliana Lins, empresária, filha de Tarcísio e que estava ao seu lado, na “passagem” do pai para uma outra vida. Lailson ilustra as camisetas carnavalescas da troça desde 1981, com criações antológicas e até hoje lembradas por pessoas ligadas ao Nóis sofre. Até porque a troça surgiu, também, como um grupo de resistência à ditadura. Por esse motivo, seu famoso concurso de fantasias levava em conta a sátira social e política, e não brilhos, plumas e lantejoulas, como ocorria em concursos tradicionais.
As camisetas também ostentavam temas inspirados na vida política do país. Em deles ficou famoso e chegou a virar capa de um pequeno livreto, editado através de parceria entre Editora Pirata (Jaci Bezerra), Nordestal (Juareiz Correya) e Livro 7 (Tarcísio Pereira). O livrinho tinha apresentação dessa escriba aqui, porta estandarte e responsável voluntária pela assessoria de imprensa do Nóis sofre e de todos os eventos da Livro 7, enquanto ela existiu. A capa da publicação traz o então Ministro da Fazenda, Delfim Neto, fantasiado de Carmem Miranda e correndo de um faminto, em uma época em que se dizia que “a economia do país vai bem, mas o povo é que vai mal”. Naqueles tempos, o Brasil não contava com redes de proteção social como as de hoje, e a fome era ainda maior.
Houve uma outra ilustração antológica, de 1985 época de redemocratização do Brasil, pós campanha diretas já, ano em que Tancredo Neves tomaria posse como Presidente do Brasil, embora eleito indiretamente. Mas que morreria sem assumir, frustrando milhões de brasileiros, que torciam por um país melhor, mais democrático e que, em pouco tempo, teria o direito de escolher seu presidente em eleição direta, sonho acalentado desde 1964, quando houve o golpe militar. A ilustração traz, também, Fafá de Belém, que era uma espécie de musa da Diretas Já e cantava o Hino Nacional das manifestações de rua. Tal ilustração, histórica ao meu ver, mantenho até hoje com carinho em uma moldura.
Nela, os então Ministros Delfim Neto, Reis Veloso e Mário Andrezza – os mais fortes do último governo militar – assistiam o carnaval comandado pela oposição, ostentando a marca de um pé nas respectivas bundas. Em outras palavras, a ilustração dava um recado: Xô ditadura. As camisetas 2021 trazem Tarcísio Pereira ostentando um estandarte, dessa vez sem o 7, número que sempre o acompanhou em empreitadas comerciais e por toda a vida. O 7 foi substituído por um oito deitado, que é o símbolo de uma outra dimensão, dessa vez a infinita.
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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Ilustrações: Lailson / Acervo pessoal de Letícia Lins