No Dia da Mulher, o legado dos livros e aquelas que fizeram história

Nesse Dia Internacional da Mulher, e que tantas homenagens se rende às mulheres que estão à frente de instituições ou negócios, eu gostaria de homenagear as mulheres que fazem parte de minha vida e que ajudaram na minha formação por um outro caminho, o dos livros. E elas são tantas que ocupam “somente” cinco prateleiras na minha estante doméstica. São biografias, romances, memórias, cartas, histórias de vida que têm muito a ensinar a todos nós. São mulheres de vários países que deixaram um legado que, de certa forma, nos ajudam a entender melhor o mundo e a nós mesmas. Enfim, quem somos.

A primeira referência vai para Simone de Beauvoir (1908-1986), com quem travei conhecimento aos 16, lendo Memórias de uma moça bem comportada. Depois, devorei tudo que ela escreveu e também suas biografias. Nos anos 1960 e 1970 ela era uma referência para toda uma geração. Também gostaria de citar muitas brasileiras. A primeira é Rachel de Queiroz, que entrevistei muitas vezes. Jovem, foi presa por abraçar a doutrina comunista. Mas não se rendeu ao partidão, quando este tentou mudar o texto do livro que escrevera. “Enrolei os manuscritos, coloquei debaixo do braço e corri para pegar o bonde sem olhar para trás”, me relatou, certa vez com a simplicidade que lhe era peculiar. Mulher de coragem, que merecia um Nobel por ter escrito o Memorial de Maria Moura, uma das personagens femininas mais fortes que já vi na Literatura. Também foi de Rachel que ouvi uma das frases mais duras sobre o significado do amor, quando  referia-se à morte do segundo marido, Oyama: “Quando ele se foi, fiquei privada do meu gênero”. Nunca consegui esquecer uma frase tão forte e dilacerante.

No Brasil, são tantas mulheres a lembrar, seja pela história, pela arte ou pela vida política, que renderam livros: .Maria Quitéria, Anita Garibaldi,  Chiquinha Gonzaga, Olga, Pagu, Tarsila, Clarice Lispector. Ainda no Brasil, vai uma referência para Bertha Lutz (1894-1976), a quem devemos o direito ao voto. Sim, nós mulheres, não votávamos, mas ela liderou uma luta para que pudéssemos ir às urnas. Sua “guerra’ ganhou tanto destaque que, em 1922, chegou a participar do encontro mundial da Associação Geral da Liga de Mulheres Eleitoras, nos Estados Unidos. A realização do seu sonho, no entanto, só ocorreria uma década depois, quando Getúlio Vargas estabeleceu o direito feminino ao voto.

No mundo, são tantas. Creio que até mesmo na ficção, há mulheres que nos ensinaram a resistir, como é o caso de Sherezade, a heroína das Mil e uma Noites, que  ao entreter o Rei com suas histórias, evitou que dezenas de outras mulheres fossem decapitadas. Temos  exemplos de resistência e resiliência na estante: Isadora Duncan, Mayada, Malika, Waris Dirie, Xinran, Frida Khalo,  Domitila Chungara. Não poderia deixar de citar, também, essa figura aí do lado, Rosa Luxemburgo, uma das biografias mais impressionantes que já li. Lutou pelos ideais revolucionários, sem jamais abrir mão do direito ao amor, ao romantismo. Suas cartas ao chato do Leo Jogiches, deixam bem claro isso.

Leo era namorado de Rosa, a quem ela cercava de mimos e carinhos. Mas que era especialista em podar seus sonhos, a julgar pelas cartas que ela lhe escreveu, e que estão reunidas no livro Camarada e Amante. Ela não percebia que ele só a puxava para baixo. Colocava defeitos em seus escritos, até que Rosa trocou o seu “revolucionário” machista pelo filho de uma amiga, bem mais jovem do que ela.

Infelizmente a mulher que conseguiu encantar Lenin e Marx com sua verve, teve um final  trágico. Foi executada por soldados alemães, em 1919. Mas, pelo menos, viveu como quis e amou como pôde. Entre tantas mulheres que fizeram  história, temos que lembrar, ainda a grande Malala Yousafzai, a mais jovem pessoa a ser contemplada com o Prêmio Nobel.  Foi através de um livro – Eu sou Malala (2013) – que tomei conhecimento de toda a  grande história dessa criatura corajosa, que quase paga com a vida a sua luta pelo direito à educação no Paquistão, onde não era permitido o acesso das meninas à escola.  Malala quase morre em 2012, ao ser alvejada por extremistas do Talibã, mas sobreviveu para contar a história, e hoje fez da luta  pelo direito à educação uma missão. Em 2014, foi contemplada com o Nobel da Paz.  Então, viva às grandes mulheres, aquelas que nos deixaram muitos ensinamentos, inclusive a defesa da liberdade.

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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Letícia Lins  e Internet 

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