Mulheres com muita história

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Hoje eu não quero falar de números. Eles já estão em todos os jornais, com notícias do tipo violência atinge um  terço das mulheres sofre no Brasil. Também não quero flores nem chocolates, pois isso ganho sempre, o ano inteiro. Também não preciso ser felicitada com foto de um gato lindo, musculoso e peladão, como os que me chegam hoje via redes sociais. Hoje eu quero apenas falar. Falar de mulheres, cujas trajetórias contribuíram para que eu entendesse melhor a vida, a história, o mundo. E que, com seus exemplos, me ajudaram a escolher da melhor forma os meus caminhos.

Judiia polonesa e manca, Rosa Luxemburgo viveu a Revolução e grandes amores no século 19.
Judiia polonesa e manca, Rosa Luxemburgo viveu a Revolução e grandes amores no século 19, e se impôs pelas suas ideias.

E a estante está repleta delas. Da Simone de Beauvoir da minha adolescência (com as suas memórias de uma moça “bem comportada”) à Malala Yousafzai (a paquistanesa que enfrentou o talibã, as balas, um país, pelo direito à educação das meninas, condenadas por um sistema arcaico ao analfabetismo).  Ao longo de minha vida, acumulei uma série de “ídolas”. E a lista é ampla. Inclui mulheres que lutaram pelos seus direitos e pelo que acreditavam. Ou que descobriram formas de amar, vivendo como queriam e amando como podiam.  Que souberam ser felizes. Algumas a um custo muito alto, com cabeças confusas, diante do passo que deram, bem à frente dos costumes dos seus tempos. Ousaram, desafiaram, sofreram, mas ganharam. Viveram.

Rachel de Queiroz, comigo, em sua Fazenda, no Ceará: criadora de Maria Moura, uma das personagens femininas mais fortes da literatura brasileira.
Rachel de Queiroz, comigo, no Sertão: criadora de Maria Moura, uma das mais fortes personagens da literatura brasileira.

Vou tirar aqui o chapéu, para algumas delas:  Sherezade, Rosa Luxemburgo, Frida Kahlo, Alma Mahler, Lou Andréas Salomé, Anais Nin, Waris Dirie, Isadora Ducan, Dorothy Parker, Isabel Allende, Billie Holiday. No Brasil, não  custa citar Tarsila, Pagu, Olga Benário, Rachel de Queiroz, e a nossa Tereza Costa Rego, cuja vida daria um filme. Rosa, Rachel e Tereza têm em comum a luta pelo amor de suas vidas. A judia polonesa, de quem Lenin dizia que “falava o marxismo muito bem”, resistiu às imposições do amante, Leo Jogiches, para quem um revolucionário não tinha direito ao amor. Mas Rosa não ligava para isso. Vivia entre a revolução e o paixão . Até comprava toalha de xadrez, com jarro de flores, para receber romanticamente o amante. Depois, quando tudo acabou, viveu um romance quente com o filho de uma amiga, muito mais jovem do que ela. E isso, no século 19.

Tereza, uma das artistas plásticas mais importantes do País, não se furtou a trocar a família estruturada e o conforto de uma vida burguesa, pela clandestinidade, para seguir o grande amor de sua vida. Já Rachel de Queiroz, com quem tive o prazer de conviver, enfrentou os preconceitos da época com bravura. Aderiu ao Partido Comunista, chegou a ser presa na juventude. Mas desafiou o PC, quando os líderes da legenda, no Ceará, queriam obrigá-la a subverter a ordem criada pela autora, em um dos seus romances. “Eles me disseram que a personagem rica não poderia ser boa, e que a pobre não tinha que ser ruim. Enrolei os originais, botei debaixo do braço e saí correndo, sem olhar para trás, para pegar o bonde. Tive medo que rasgassem o meu livro”, me contou ela, certa vez, em meio ao canto dos pássaros, em sua fazenda “Não me Deixes”, em Quixadá, Sertão do Ceará. Rachel escreveu bastante. Criou uma das personagens mais fortes da Literatura Brasileira: Maria Moura, que passara por um estupro, quando jovem, e que, adulta, desbravava a caatinga com seus cabras.  Rachel casou,  não deu certo. Separou-se. Mas foi dela uma das frases mais marcantes que já ouvi sobre o amor verdadeiro, ao referir-se ao vazio deixado pela morte do segundo marido, o homem de sua vida. “Depois que ele se foi, fiquei privada do meu gênero”.

Texto: Letícia Lins / #OxeRecife

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