Todas as vezes que vejo um desfile de modas – em revista, na televisão, nas redes sociais – fico espantada com a magreza anoréxica das modelos. E alguns estilista acham pouco os sacos de ossos, e ainda carregam em maquilagens que terminam por dar a impressão de que as moças da passarela são zumbis cadavéricos. Já vi desfile com as meninas com olheiras artificiais, batons e unhas pretas (esses, a gente vê até nas ruas), outras até com desenhos na face que lembram caveiras.
E as roupas apresentadas, claro, são irreais. Há alguns dias, assisti um desfile de moda conceito no Paço Alfândega, no Recife Antigo. Havia um “look” que tinha um cone do ombro. Imagina, se eu ou você iríamos ao cinema com um vestido com um cone lateral mais alto do que minha cabeça. Ah… Tenha paciência. E esse é um dos motivos que me leve a registrar, aqui, o desfile da grife Moda Matuta, que vi na passarela montada na calçada de frente da Paróquia do Senhor Bom Jesus dos Remédios, em Afogados de Ingazeira, a 386 quilômetros do Recife. Havia modelos magras, sim, mas a maior parte era de pessoas que, nas grandes cidades, seriam consideradas “fora do padrão”. Mas que, de forma sadia, não estavam nem aí, e assumiram a passarela sem nenhum pudor por gordurinhas a mais. Veja o vídeo do desfile de moda matuta no Sertão:
As roupas, de cortes simples, e muitas confeccionadas com retalhos, serviam para altas, baixas, magras, gordinhas, mulheres peitudas ou despeitadas. Havia gente de todos os tipos físicos, na passarela. Sem nenhuma patrulha estética. Entre os rapazes que apresentaram camisas e calças, nenhum, mas nenhum mesmo tinha barriga de tanquinho ou era magérrimo. Todos tinham suas protuberâncias da cervejinha ou do sendentarismo. E ninguém estava nem aí. Todo mundo desfilou com maior desenvoltura, fosse gordo ou fosse magro.
O desfile fez parte da cerimônia de encerramento da terceira edição da Feira do Empreendedorismo de Afogados de Ingazeira. No desfile foram exibidas roupas, bijuterias, chapéus, bolsas, tudo “Made in Sertão”. O melhor mesmo e o que me atraiu para o desfile, no entanto, foi o fundo musical: ao invés de DJ, música eletrônica, ou algum sucesso da trilha sonora da novela das oito, quem comandou a cena foi a Banda de Pífanos de Santo Antônio, fundada há mais de cem anos. É muito bom que uma feira destinada a fomentar negócios se preocupe, também, em valorizar a cultura local.
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Texto, foto e vídeo: Letícia Lins / #OxeRecife