Pensem em um filme. Primeiro longa dirigido por Hilton Lacerda, Tatuagem consta entre os cem melhores filmes nacionais de todos os tempos, conforme a respeitada lista da Associação Brasileira de Críticos de Cinema. A inclusão ocorreu em 2015. Agora, a produção pernambucana acaba de virar tema de livro: A invenção de Tatuagem, que será lançado no próximo sábado (20/11), no pátio térreo da Fundação Joaquim Nabuco, no Derby. Antes haverá exibição do filme (15h), seguido de debate com os autores do livro: Paulo Cunha, Marcos Santos e Geórgia Cunha. É uma boa oportunidade para se rever o filme . E, principalmente, para quem ainda não o assistiu. A exibição será gratuita.
Para os que não lembram: Tatuagem se passa no ano de 1978, em plena ditadura militar. O filme foi feito na cidade de Olinda que, naqueles tempos, funcionava como centro de contestação ao regime e também à hipocrisia social. Além da presença de “ripongas”, de artistas e de sua histórica oposição ao regime, a cidade tinha um grupo teatral chamado Vivencial Diversiones. Implantado no meio de uma favela em um “teatro” que lembrava um barracão, seus artistas se fantasiavam de travestis e contestavam não só a política, mas também a moral vigente então. Não demorou, e o Vivencial fez o maior sucesso, inclusive entre a classe alta e média. Em Pernambuco, o Vivencial Diversiones teve papel libertário e cultural tão importante quanto o grupo Dzi Croquetes para o Brasil.

Tatuagem reproduz mais ou menos aquele clima contestador de Olinda. Os seus personagens pertencem a uma trupe irreverente, chamada Chão de Estrelas. O líder do grupo é Clécio Wanderley, interpretado pelo sempre impecável Irandhir Santos, perfeito no seu papel de artista marginal (no sentido de estar à margem). A principal estrela do Grupo é Paulete (Rodrigo Garcia), namorado de Clécio. Um dia, Paulete recebe a visita do cunhado, Fininha (Jesuíta Barbosa), que é soldado do Exército. Encantado com a libertinagem do grupo, Fininha é logo seduzido por Clécio.
O problema é Fininha conviver com as duas realidades: a da vida livre e desregrada de Wanderley e a dureza da disciplina militar, em plena ditadura. Por aí, já dá para se imaginar a história. Os sessentões e setentões que frequentaram o Vivencial e Olinda facilmente associam personagens a figuras reais, como Guilherme Coelho (diretor do Vivencial), Jomard Muniz de Brito (poeta, professor, contestador), Pernalonga (ator, que andava vestido de mulher pelas ruas de Olinda à noite). As comparações e lembranças são inevitáveis. Mas Paulo Cunha ressalta
“Hilton sempre disse que não queria fazer uma reconstituição de época, mas algo que olhasse para o presente. Mas eu fiquei impressionado como o personagem Paulete lembrou Guilherme Coelho, inclusive fisicamente. É claro que tem um tanto de Jomard Muniz de Britto no professor Jubert. Mas tem um clima, um tom, que parece muito preciso e que levou direito aos anos 1970”.
A publicação do livro A invenção de Tatuagem é iniciativa da Companhia Editora de Pernambuco (Cepe). Hilton Lacerda ficou surpreso ao ver “as memórias eclodirem de maneira tão viva no livro”. E acrescenta:
“E isso precisamos muito: manter-nos atentos e provocadores, mesmo sobre as nuvens cinzas que pairam sobre nosso país.
E os três autores leram diferentes tipos de tratamentos do roteiro, estudaram fotografias de cena, consultaram materiais de direção de arte (cenografia, figurinos, adereços), assim como retomaram as obras que inspiraram o diretor: livros, filmes, história. Além das análises e resgate das filmagens, o livro é ricamente ilustrado com fotografias realizadas durante as filmagens. Paulo Cunha tem outros livros publicados pela Cepe, um deles também sobre cinema : A aventura do Baile Perfumado – 20 anos depois e Geneton: Viver de ver o verde mar.
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SERVIÇO
Lançamento de A invenção de Tatuagem
Data: 20 de novembro
Horário: 17h
Onde: Sessão Cinemateca, no Cinema da Fundação do Derby, às 15h, com exibição de Tatuagem, de Hilton Lacerda.
Quanto: Entrada gratuita no limite de 100 espectadores. Com protocolos anti-Covid usuais. Às 17h, no pátio térreo da Fundaj do Derby, lançamento do livro.
Valor de venda: R$ 70,00 (livro impresso)
E-book: R$ 28,00
Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Divulgação