Hugo Dubeux lança livro discutindo o “homem selvagem” e a masculinidade

Estou em casa em uma noite chuvosa, quando alguém toca a campainha. Era um rapaz jovem, Hugo Dubeux, com um “livro”, segundo me informou. Abri a porta e recebi a “encomenda”. Mas não era um só um livro, era mais alguma coisa. Uma caixinha branca, com um conteúdo agradavelmente perfumado.  Havia dois sonhos de valsa, uma flor, um release em canudo amarrado com um lacinho, um marcador de livro e o próprio volume com poemas de sua autoria.

Achei a apresentação do trabalho muito criativa. Até porque o Sonho de Valsa não sei porque motivo, considero como o chocolate mais emblemático, um símbolo de sonho, de dança, de festa. Até aparece na música “Folhetim”, de Chico Buarque: “qualquer coisa assim, como uma pedra falsa, um sonho de valsa”, não é? O que me surpreendeu, no entanto, foi o título do livro, no meio de tanta delicadeza: “Existe um homem selvagem”. No sábado (25/5), a partir das 9h, o poeta nascido em Santo André (SP) e residindo no Recife, estará na Praça da Várzea, onde faz apresentação de sua obra literária, seguida de debate aberto com o público e recital poético. A ação conta com parceria do Gema (grupo de psicologia da UFPE), e alguns exemplares serão distribuídos.

Kit de apresentação do livro “Existe um homem selvagem” em nada lembra o adjetivo do título da obra

No mesmo sábado, às 14h, ele estará presente na biblioteca comunitária da Associação Cultural Esportiva Social Amigos (Acesa Ong), no Alto José Bonifácio, Zona Norte do Recife. Haverá várias atividades – recitais, roda de conversa, diálogo aberto, partilha de processo criativo e distribuição gratuita de exemplares – que terminam com oficina de escrita poética com o autor. Novas atividades acontecerão, ainda, no dia 3 de junho, quando Hugo ministra oficina on line, por meio da plataforma Zoom. São vinte vagas e as inscrições já podem ser feitas no instagram ou no seu site  (@hugodubeux ou www.hugodubeux.com). Podem participar pessoas acima de 16 anos.

No dia 6 de junho, ele estará na Erem Amaury de Medeiros, em Afogados, às 9h para as mesmas ações. Ao final de todo o périplo, ele espera ter distribuído 120 livros gratuitamente.    Li o volume. Observei os versos, mas um poema me chamou a atenção. Ele termina assim: “comece sua viagem/ pois existe um homem selvagem/ e para sua salvação/ ele é toda a solução”.  Ligo para Hugo e pergunto, o que é “um homem selvagem” e por que, no verso, ele é a “solução”. Mas o “selvagem” de Hugo é bem diferente daquele que vem, logo, na cabeça das pessoas. É um “selvagem” no bom sentido, do homem que se aproxima mais da natureza. Ah, bom…

Sobre o homem selvagem, diz ele:

“Quando penso no homem selvagem, faço uma provocação decolonial. Em tempos de estados inteiros devastados pelas águas e o calor tomando cada vez mais espaço, passou da hora de nos olharmos como seres da natureza. Com a colonização se construiu uma ideia de que o selvagem (da selva) seria algo violento, agressivo, irracional. E a partir dessa mesma ideia fomos construindo uma sociedade afastada da natureza, da mata, da selva. Eu ressignifico esse olhar, abordando um homem selvagem enquanto este vive em harmonia com a diversidade natural da vida e da poesia, assim como nos encanta a natureza todos os dias”.

A preocupação com o “homem selvagem” permeia todo o livro de Hugo, que quer levar o debate a praças, escolas, associações de bairro. Ele divide os seus poemas por quatro capítulos: O ar de pulmão meu; Exílios; Um garotinho alado, de tocha acesa; Amores e utopia. Há, ainda, o epílogo “Aceno“, que é poema de adulto assumidamente bissexual, emocionalmente mais maduro, mas que conversa com uma criança que não sabia como deixar sua sensibilidade masculina.  Além de escritor,  po Hugo é arterapeuta e produtor cultural. Mas sua alma é de poeta e sua preocupação de cidadão no mundo, é com o “homem selvagem”.

“A ideia é um convite para que os homens se aproximem do homem selvagem que lhes habita. Entendendo este como não afastado de suas emoções, de seu corpo, mas sim visceralmente conectado com a vida. Ou seja, um convite para um nosso horizonte. O crescimento urbano nos distancia de nossos atravessamentos com a natureza. Atacam a diversidade de gênero, buscam padronizar comportamentos, higienizar tudo. Ou seja, uma vida cada vez mais asfaltada e menos apaixonada, mais individualizada, menos poética. Por isso, esse convite para que não abandonemos a poesia e a vida que nos trouxe até aqui”.

Portanto, quem quiser conhecer de perto Hugo Dubeux e seu livro, é só seguir a programação acima. “Eu tenho ele dentro de mim/ como um lobo correndo/uivando nu pela floresta/ descompromissado / com possíveis emaranhados / em seus pelos / eu tenho ele como/ a chuva da seca/ como a comida da fome/ o sol da escuridão/ ou a lua dos namorados”. E viva ao “homem selvagem”! No bom sentido, claro!

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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Divulgação e Letícia Lins/ #OxeRecife

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