Goiana: Sobrado que abrigava abolicionistas precisa de restauração

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Há alguns dias, fui assistir o filme “Malês”, dirigido por Antônio Pitanga, que reproduz a história daquele que é tido como o maior levante de escravizados do Brasil, e que ocorreu em 1835, na Bahia. Recomendo. O filme tem um bom roteiro, uma bela fotografia, direção equilibrada, muito ritmo e ótimos intérpretes. E é imperdível sobretudo por falar de um fato tão importante e que é menosprezado na maioria dos livros didáticos. Infelizmente.

Acredito que a nossa história esteja recheada de heróis anônimos, dos quais nem sempre tomamos conhecimento. Nem na escola nem ao longo de nossas vidas. Dos que deram o sangue pela libertação dos cativos africanos na Bahia, no Levante dos Malês, poucos são os que sabem os seus nomes, concordam? E são, todos heróis. Como herói foi Zumbi dos Palmares. Como herói  foi Malunguinho, líder do Quilombo do Catucá, em Goiana, Pernambuco, que até virou divindade nos cultos da Jurema (religião que mistura tradições africanas e indígenas).  Não lembro dos Malês nem de Malunguinho nos livros didáticos nem da minha infância, nem da infância e adolescência dos meus filhos, e nem dos meus netos.

Portanto, precisamos estar sempre atentos a personagens esquecidos, porque como se diz, a história que nos repassam nas escolas é a dos vencedores. O resto, muitas vezes é só apagamento. Porque lembro disso agora? Porque precisa de restauração urgente essa casa de azulejos azuis, que fica no número 288 da Rua Marechal Deodoro da Fonseca, também chamada de Rua Direita, no centro de Goiana, a 60 quilômetros do Recife. É que o casarão sediava reuniões abolicionistas, que terminaram por levar o município a libertar os escravizados antes mesmo do Brasil. Foi o que aconteceu em março de 1887, quando sua Câmara Municipal decidiu por lei, libertar os negros. Goiana foi o primeiro município a tomar a iniciativa em Pernambuco. A Lei Áurea, valendo para todo o país, só seria decretada em 13 maio de 1888. Não lembrava do feito libertador. Mas ganhei um refresco de memória  na última visita  que fiz à cidade, com o Grupo Bora Preservar.

Pelo menos duas entidades abolicionistas funcionavam em Goiana, no século 19: o Clube do Cupim e a Terpsicore.  O Clube arrecadava fundos para libertar os escravizados. Já a Terpsicore “roubava” escravos dos senhores de engenho e os enviavam para o Ceará, onde a escravatura já havia sido suspensa. Nesse caso, contava com ajuda do esperto sapateiro Basílio Machado, que se infiltrava nos plantios de cana, ganhava a confiança dos patrões e, depois, arquitetava o plano de fuga dos cativos. Grande Basílio…

Goiana foi a primeira cidade de Pernambuco a acabar com a escravatura, antecipando-se à Lei Áurea

Ele contava com a cumplicidade de José Pires Vergueiro, que escondia os fugitivos em sua olaria, até que conseguissem enviá-los para o Ceará. (Tal qual faziam no Recife José Mariano e sua esposa Olegarina, que embarcavam os fugitivos pelo Rio Capibaribe a partir do Poço da Panela, de onde eles seguiam em canoas para o Porto, e iam de navio para aquele estado onde africanos e descendentes já haviam sido libertos).

O pioneirismo de Goiana nessa área está expresso na bandeira  e no brasão do município, que ostenta uma águia com corrente rompida, em alusão à libertação das amarras impostas aos escravizados, já que foi o primeiro município em Pernambuco a tomar oficialmente a iniciativa. Bela história! E lá em Goiana é o que tem de sobra…

Nos links abaixo, informações publicadas no #OxeRecife sobre a cidade e outras relacionadas ao Grupo Bora Preservar.

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Texto e fotos: Letícia Lins / #OxeRecife

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