Pensem em uma trabalheira, dedicação e toda a paciência do mundo. Só pode ter sido assim, que Sílvia Barreto, Sylvia Couceiro, Cibele Barbosa e os museólogos Albino Oliveira e Henrique Cruz se debruçaram sobre um gigantesco acervo da Fundação Joaquim Nabuco, para escolher – como curadoras e curadores- as peças da exposição “Elas”, na qual revelam séculos de “apagamentos e exclusões”. Ao mesmo tempo que contam histórias de luta de mulheres por reconhecimento, visibilidade e igualdade. A mostra será inaugurada às 17h da quinta-feira (15/8) no Museu do Homem do Nordeste e a equipe conseguiu reunir de 300 itens. Entre eles: publicações, fotografias, vídeos, discos, rótulos comerciais, cartões postais, esculturas, peças artesanais, cartazes de filmes protagonizados por mulheres (foto acima). O acervo examinado vai do século 17 até os dias atuais.
A ação vai ampliar em 450 metros quadrados a área de exposição do Muhne, marcando a reabertura do primeiro andar, que estava fechado “somente” há 16 anos. Detalhe: Ao longo de 75 anos de existência, a Fundação foi acumulando e preservando um acervo de 800 mil documentos e outros itens. Porém apenas uma pequena parte é sobre mulheres ou por elas produzida. “Sem contar que, quando representadas, elas foram fotografadas, pintadas, desenhadas, esculpidas e descritas quase sempre por olhares masculinos”, lembra Moacir dos Anjos, coordenador Geraldo Muhne.
No acervo de esculturas do Muhne, por exemplo, menos de 15% das peças têm autoria feminina. No Cehibra (Centro de Estudos da História Brasileira), os dados não diferem. Dos 3,5 mil folhetos de cordel, apenas 2,3 por cento foram escritos por elas. Dos 1.166 autores identificados no acervo, somente 14,3 por cento são mulheres. Das 156 coleções iconográficas, 5 por cento possuem nomes femininos. E das 233 coleções textuais, só 3,5 por cento têm nomes de mulheres. E apesar da desvalorização e do pouco reconhecimento, as mulheres deixaram sua marca em produções intelectuais, artísticas, literárias e musicais. Ou seja, lutaram.
“O próprio nome do Muhne pode ser entendido como uma síntese de práticas institucionais que antecedem sua criação e que, por muito tempo, persistiram. Essas práticas influenciaram a criação de um acervo cultural, histórico e artístico que, consistentemente, priorizou autores homens, notadamente os brancos, em detrimento de autoras mulheres, principalmente as negras”, adverte Moacir. “Era importante para nós que o tema da exposição fosse algo que chamasse a atenção do público, que fizesse a sociedade se envolver”, pontua Silvia Barreto.
“O mais interessante durante a pesquisa foi ver, ao acessar imagens do passado com os olhos do presente, quanta misoginia havia condensada num mero rótulo de cachaça, numa escultura de barro ou na capa de um disco. Imagens que circularam e naturalizaram o desrespeito”, diz Sílvia. Ou seja, o público vai ter sim, muito o que ver e aprender com a expô. “A proposta era tornar essas mulheres visíveis, e deixar clara a necessidade de acabar com fases de exclusão”, mas sim “mostrá-las como protagonistas da história, acentuando o protagonismo de muitas delas”, afirma Sylvia Couceiro.
“Em meio a tantos apagamentos e exclusões, revelar as obras dessas artistas é uma forma de contar suas histórias na luta por reconhecimento, visibilidade e igualdade”, evidencia Cibele Barbosa. Entre os destaques de “Elas”, a curadora cita videoarte da sérvia Marina Abramović; a partitura original Marcha Número Um do Vassourinhas, composição de Joana Batista Ramos; e a calunga Dona Joventina, que passou 30 anos nos Estados Unidos até ser doada ao Muhne em 1996. “O que faz parte do acervo da Fundaj nós fazemos questão de compartilhar com o público.”
A exposição “Elas: onde estão as mulheres nos acervos da Fundaj?” é um exercício de autocrítica institucional e um aceno para um horizonte de mudanças, que propõe reflexões sobre o que é ser mulher na sociedade”, diz Márcia Ângela Aguiar, Presidenta da Fundaj. Todo o acervo é proveniente de aquisições e doações de entidades e coleções pessoais, em sua maioria sob a guarda do Centro de Estudos da História Brasileira (Cehibra) e do Museu do Homem do Nordeste (Muhne). Como não poderia deixar de ser, as três curadoras são mulheres: Sílvia Barreto é chefe do Serviço de Estudos Museais do Muhne; Sylvia Couceiro é coordenadora do Centro de Documentação e Pesquisa (Cdoc) do Cehibra (Centro de Estudos da História Brasileira); e Cibele Barbosa é pesquisadora e historiadora do Cehibra. A expografia também é assinada por uma mulher, a cenógrafa e diretora de arte, Séphora Silva.
Nos links abaixo, você confere algumas mulheres que fizeram ou fazem história.
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Serviço:
Abertura da Exposição Elas
Data: 15 de agosto de 2024
Horário: 17 horas
Local: Museu do Homem do Nordeste
Endereço: Avenida Dezessete de Agosto, 2187, Casa Forte, Recife
Entrada gratuita
Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Fundaj e Letícia Lins/ #OxeRecife