Exercício de tiro em área de ocorrência de baleias jubarte em Pernambuco preocupa ambientalistas

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No século passado, elas faziam a festa de grupos econômicos japoneses, sendo caçadas aos montes, no Brasil. Mais precisamente na costa da Paraíba, onde eram exploradas não só para venda de carne, óleo e até dos ossos, que eram moídos e transformados em adubo. As baleias serviam, também, para atrair turistas.  Porém o “turismo” não era para observar os cetáceos no mar. Ao contrário. Os visitantes ficavam em uma arquibancada, para assistir o sangrento espetáculo em que as gigantes eram retalhadas em alguns minutos, após a captura. Estive lá, como repórter do então poderoso Jornal do Brasil. Indignada com o massacre – foram nove baleias pescadas em um só dia – escrevi uma reportagem que deu muito o que falar. Que rendeu cartas e mais cartas dos leitores. Todas contra a matança. Felizmente, o bom senso prevaleceu. E a pesca da baleia passou a ser proibida desde 1986. Uma vitória para as gigantes do mar, que hoje vêm de longe dar o ar da graça em águas tépidas brasileiras. Muitas vezes para acasalar. Outras, para parir.

Agora, as baleias voltam a enfrentar ameaças. Pelo menos, nos  próximos dias. É o que dizem os ambientalistas, que estão solicitando à Marinha do Brasil que não faça exercícios de tiro no Nordeste do Brasil no mês de agosto.  Eles recomendam que estes só ocorram depois de novembro na área em questão. A ação estava prevista para acontecer no Arquipélago de Alcatrazes, no Litoral Norte de São Paulo. Porém foi suspensa para não prejudicar o período de reprodução de fragatas, aves marinhas também conhecidas como piratas-do-mar. E também para não impor prejuízos a mamíferos marinhos que ali acorrem nessa época. Resultado: A operação foi transferida para Pernambuco, à altura do Litoral Sul. E justamente no período do ciclo reprodutivo das jubartes, que é de junho a novembro.

Segundo os especialistas,  bombardeios trazem risco às baleias porque esses mamíferos (como os golfinhos) utilizam o som como o principal meio de orientação no ambiente marinho. Assim, podem ser afetadas pelos ruídos ou mesmo por ondas de choque ocasionadas pelas explosões, havendo inclusive risco de virem a óbito. A Capitania dos Portos já enviou comunicado confirmado a operação de 23 de agosto para comunidades pesqueiras e populações praieiras. E a preocupação é grande com o que possa ocorrer com as gigantes do mar.

Segundo Instituto Baleia Jubarte, exercício de tiro pode prejudicar acasalamento e reprodução dos mamíferos marinhos

Segundo o comunicado sobre os exercícios de tiro de 2022, eles devem acontecer “na Zona Marítima defrontante ao Estado de Pernambuco, a uma distância em torno de 32 milhas da linha de costa do Cabo de Santo Agostinho, no limite Norte e em torno de 42 milhas de São José da Coroa Grande no limite sul do Estado”. No documento, a Marinha alerta para “ativação de área perigosa” e “exercício de tiro real sobre alvo de superfície”. O mesmo documento, especifica a área da operação em latitude e longitude. De acordo com a Capitania, o horário será das 8h até 18h do dia 23 de agosto.  Ou seja, dez horas de bombardeios. Há alguns dias, foi observado um grupo de baleias, incluindo filhote, na praia de Boa Viagem, Zona Sul do Recife.

Preocupados com as consequências da Operação, ambientalistas enviaram – através do Instituto Baleia Jubarte –  um ofício (05/22) ao Comandante da Marinha do Brasil, Almir Garnier Santos, no qual alertam sobre as possíveis implicações  dos exercícios de tiro para a conservação das baleias, em especial da baleia jubarte, nas águas do Nordeste brasileiro. Eles pedem que a operação só ocorra após o período de frequência dos animais no Nordeste brasileiro. Ou seja, depois de novembro. O Instituto Baleia Jubarte trabalha desde 1988 com a pesquisa e a conservação das baleias jubarte no Brasil, em parceria direta com as autoridades públicas. Foi graças às ações de conservação desenvolvidas no país que a espécie veio se recuperando do período em que era caçada, a ponto de ter sido retirada da lista de espécies ameaçadas em 2014. Hoje estima-se que mais de 20.000 jubartes frequentam o Litoral do Brasil de junho a novembro para acasalar, dar à luz e amamentar os filhotes. Com o crescimento da população de baleias jubarte, elas têm se espalhado pelo litoral do Brasil, reocupando antigas áreas de ocorrência. Sua presença tem sido comum no litoral de São Paulo e por todo o litoral da região Nordeste.

Conforme os ambientalistas, Pernambuco também é área de reprodução das baleias jubarte. Lembram que  recentemente houve encalhe de filhotes mortos no porto de Suape, no último dia 08 de agosto. E em Olinda, no dia 14 de agosto. Segundo os ambientalistas, os exercícios de tiro impõem ameaça às baleias “no período mais crítico de suas vidas”. Eles dizem entender plenamente “a importância da realização dos exercícios de tiro real como parte da estratégia de manutenção de nossa Marinha sempre preparada a defender a jurisdição pátria”, porém  solicitam  que os exercícios “possam ser realizados em pleno acordo com as necessidades de conservação e a proteção conferida aos cetáceos pelas normas federais, em particular a Lei 7.643/1987 que estabelece sua proteção integral.” Citam, ainda,  “o Decreto 6.698/2008 que declara as águas jurisdicionais brasileiras como santuário de Baleias e Golfinhos, bem como atendendo a nossas obrigações internacionais junto à Comissão Internacional da Baleia e a Convenção de Espécies Migratórias”.

E complementam: “Assim, sendo coerente com a medida de adiamento dos exercícios em Alcatrazes, nós respeitosamente vimos recomendar que o exercício planejado para o litoral de Pernambuco seja postergado para depois de 30 de novembro, quando se encerra a temporada reprodutiva das baleias jubarte em nossa costa. Além disso, gostaríamos de sugerir que se evite o planejamento de exercícios de tiro em águas brasileiras de 01 de junho a 30 de novembro, evitando assim o período de reprodução das baleias jubarte (Sudeste e Nordeste) e franca (Sul)”. Ficamos inteiramente à disposição da Marinha, ademais, para colaborar naquilo que estiver ao nosso alcance no sentido de subsidiar com o máximo de informação possível as operações que envolvam potencial impacto sobre nossos cetáceos. Desde já gratos por sua honrosa atenção e providências que couberem, colhemos o ensejo para enviar nossas Atenciosas Saudações, Eduardo Freitas Moraes de Camargo Presidente Instituto Baleia Jubarte

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 Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Instituto Baleia Jubarte

 

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