Ebomi Cici é um patrimônio vivo

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Uma figura, a Ebomi Cici, que esteve em Pernambuco no final de semana, para contar histórias e encantar plateias. Vovó Cici, como é mais conhecida, já foi abordada aqui no #OxeRecife por diversas vezes, devido à sua bondade, sabedoria,  experiência de vida e ao poder que tem de levar todos que a ouvem a um clima de total encantamento. Conviveu durante muitos anos com Pierre Verger (1902-1996), a quem ajudou a catalogar e legendar nada menos de 11 mil fotografias captadas pelas lentes do antropólogo francês, em suas viagens pela África e pela América Latina. Verger era etnógrafo, antropólogo e fotógrafo jornalista.

Ele viajou por mais de 20 países, mas em 1946 optou por morar no Brasil, radicando-se na Bahia, onde virou sacerdote yorubá e adotou o nome religioso de Fatumbi.  Dedicou quase toda a sua vida aos estudos da diáspora africana (devido ao comércio de escravizados), às religiões afroderivadas espalhadas pelo mundo e também aos fluxos culturais e econômicos entre o continente africano e os demais. “Na África, Fatumbi pesquisou também os retornados (escravizados e ex escravizados), e eram muitos no Benin e na Nigéria”, conta Cici, que acaba de voltar de uma viagem à África.  No Benin, impressionou-se com a riqueza da família Souza, descendente de Francisco Félix de Souza, brasileiro, que se radicou naquele país, onde passou a ser o maior traficante de seres humanos de sua época.

“Ainda hoje, a família tem plantações a perder de vista: abacaxi, mamão, banana, dendê, madeira, fortuna acumulada com o dinheiro do comércio de escravos”, lembra.  Cici conta que se decepcionou um pouco com o que viu naquele país. “Pensava que todos os africanos eram iguais. Eles podem não ser racistas, mas são classistas, e uns escravizam aos outros”, reclama. Em Salvador, onde ela reside, existe a Fundação Pierre Verger, que zela pela herança do pesquisador e preserva sua memória. Vovó Cici é como se fosse um patrimônio vivo da Fundação, na qual responde pelo braço social, atendendo a centenas de crianças em situação de vulnerabilidade, no Espaço Cultural Comunitário.

Ao mesmo tempo que ocorrem as lições de cidadania, a griô transmite conhecimentos sobre a cultura da  Mãe África para a meninada, contando histórias pela ótica dos nossos ancestrais. Foi isso que ela fez aqui em Olinda, também, onde conversou com plateias atentas durante três dias, no Sebo da Casa Azul, na Rua Treze de Maio. No primeiro dia, uma pequena reunião entre amigos, onde foi recebida pelo violino de Aglaia Costa (ver vídeo abaixo). Cici teria uma só roda de conversas com o público no sábado, mas uma turma extra foi necessária devido à demanda. Pois, além de tudo, a griô é uma grande contadora de histórias, e magnetiza o público por onde passa para relatá-las, levando todos a um estado de encantamento.

Tudo sob a ótica das lendas, dos deuses, dos costumes e personagens yorubanos. Em sua recente viagem à África, Cici fez alguns dos caminhos percorridos por seus ancestrais, viu como os deuses de todas as religiões se aproximam e voltou ainda mais sábia.  À plateia atenta, mostrou os diversos significados das tranças africanas (símbolos de status na Nigéria), as histórias dos orixás, as danças para cada um, os diversos tipos de samba – de roda, de viola, duro – e as semelhanças entre alguns instrumentos musicais utilizados no Brasil e na África. Por fim, lançou uma pergunta sobre os negros, cuja resposta diz ter aprendido nos Estados Unidos, não na África: “Qual a diferença entre preto e negro?” E respondeu: “Preto é uma cor, negro é uma raça”. Segundo Cici, há nada menos de 92 classificações diferentes de negros. Haja sabedoria! Um verdadeiro patrimônio vivo, essa Cici.

Veja o vídeo em que Aglaia Costa, com seu violino, saúda Cici:

 

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Texto, foto e vídeo: Letícia Lins / #OxeRecife

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