Dia da Amazônia: Agrofloresta ou extração ilegal de madeira?

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No Dia da Amazônia  não há muito o que comemorar no Brasil. Diariamente, se vê notícias sobre o desmatamento e o excesso de queimadas. Em 2020, os focos de incêndio na região atingiram a marca de  63 mil, segundo denuncia hoje a Anistia Internacional. Já  os desmatamentos aumentaram 43 por cento entre agosto de 2019 e julho de 2020, em relação a igual período do ano passado, deixando 9.205 quilômetros quadrados de florestas destruídas. De acordo com dados do Inpe (Instituto de Pesquisas Espaciais), foram 1.045 quilômetros quadrados de florestas perdidas, no último mês de agosto. Mas ao invés de lutar pela preservação da Amazônia, o Ministério do Meio Ambiente se preocupa mais em defender a grilagem, a mineração em terras indígenas e a boicotar o trabalho de ongs e fiscais de órgãos do próprio governo que agem em defesa da maior floresta tropical do mundo. Mas convém lembrar aquela velha e conhecida frase, segundo a qual a floresta rende mais dinheiro em pé do que transformada em mercadoria, muitas vezes extraída de forma criminosa. Nas redes sociais, circulam sempre imagens de balsas navegando com grande quantidade de árvores degoladas, a maior parte de origem clandestina.

Nesta semana, foi apreendida em Pernambuco uma carga vinda do Pará, que não tinha nota fiscal nem DOF (Documento de origem florestal), que são  obrigatórios e mostram a origem da mercadoria. A apreensão foi na BR-110, no Sertão de Pernambuco. A mercadoria saíra de Moju (no Pará) e iria para Caruaru (PE), a 130 quilômetros do Recife. Eram 46 metros cúbicos que, segundo a PRF, dariam para fazer 46 casas populares . Se a madeira clandestina circulou por percurso tão longo livremente, dá para imaginar as perdas que ali acontecem diariamente nas clareiras no meio das matas. Dá até arrepios só de imaginar as cenas de árvores caindo, muitas vezes para ceder lugar ao gado. Olhem só  (em vídeo da PRF), o tamanho do caminhão que fez longo percurso com madeira clandestina sem ser “incomodado” por quase 2 mil quilômetros. Realmente, não dá para entender.  Será que não tem outro jeito de fazer a floresta ser rentável sem destruí-la?

O WWF-Brasil está divulgando um estudo realizado no Acre em que agrofloresta mostra lucratividade equivalente até ao dobro do que renderia o mesmo espaço plantado com a soja, o que comprova que “o desenvolvimento econômico no bioma, com a geração de emprego e elevação de qualidade de vida pode ser obtido com a floresta em pé”.  O que, claro, seria o ideal. Até porque não só o Brasil, mas o mundo precisa de pulmão. A experiência foi realizada na Reserva Extrativista Chico Mendes, que fica no município de Xapuri, Acre. E resultou de parceria entre o WWF-Brasil, a Universidade Federal do Acre, Embrapa e a Secretaria de Meio Ambiente do Acre. “A agrofloresta pode gerar benefícios superiores nas dimensões social, ambiental  e econômica”. Foram testados dois modelos diferentes em duas áreas de solo distintas. Enquanto um deles  empatou com o rendimento médio anual da soja, o outro obteve o dobro de lucratividade, comprovando que o desenvolvimento econômico no bioma, com geração de emprego e elevação de qualidade de vida, pode ser obtido com a floresta em pé.

Segundo Edegar de Oliveira Rosa, diretor de conservação e restauração do WWF-Brasil, “este estudo mostra que existem outras alternativas de desenvolvimento para a Amazônia e ocupação  de áreas já abertas, que conciliam o clima, e todo o seu potencial de produção, com um sistema com funções similares à da floresta nativa.  Segundo o WWF-Brasil, os dois sistemas produtivos estudados provaram  que são viáveis não apenas técnica e financeiramente, mas também bastante atrativos como alternativa de investimento. Acrescenta Edegar:

 Além dos benefícios ambientais, o sistema  de agroflorestas é mais inclusivo, fortalece a economia local e a segurança alimentar. Precisamos sair da lógica do desmatamento para pecuária. A floresta vale muito mais em pé e existem modelos melhores para ocupar as áreas já desmatadas”.

  O novo Código Florestal, de 2012, autoriza agricultores familiares a utilizar sistemas agroflorestais para restauração florestal das Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal com fins econômicos. As duas agroflorestas analisadas foram implantadas em 2015 na Comunidade Altamira, Seringal Nova Esperança. Um projeto ocorreu em área degradada e compactada, com sinais de erosão e presença de plantas indicadoras de solos ácidos e pobres em nutrientes, como o sapé (Imperata brasiliensis). O segundo  fica em área de vegetação secundária em estágio inicial de regeneração (capoeira nova). Nas duas áreas, árvores nativas convivem com produtos agrícolas, como fruteiras e tubérculos. Em ambas, a lucratividade foi maior para os nativos do que o plantio de soja que vem provocando grandes desmatamentos na região.

Segundo dados do Cadastro Ambiental Rural – CAR, o Estado do Acre possui um passivo ambiental de 302.177 hectares, dos quais 117.983 estão localizados em pequenas e médias propriedades. Ou seja, as agroflorestas possuem enorme potencial de restauração desses passivos nas áreas de agricultura familiar e agroextrativista, possibilitando agregar geração de renda na atividade. A porção leste do Estado do Acre, região em que se localiza a Resex Chico Mendes, faz parte do chamado “Arco do Desmatamento”, uma área que apresenta os maiores índices de desflorestamento da Amazônia brasileira.  “Mas a Resex mantém 90% de sua cobertura florestal e corrobora com a tese de que as áreas protegidas funcionam como barreiras”, lembra a WWF-Brasil. Como se vê, a agrofloresta pode ter ação tão transformadora  na Amazônia, como foram para o Sertão as cisternas que garantem água para as populações da caatinga e que as ajudaram a conviver com as secas periódicas.

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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Foto e vídeo: PRF / Divulgação

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