A cada dia, gosto mais dos passeios a pé, realizados na nossa cidade. São roteiros didáticos e divertidos. Sejam com o Grupo Caminhadas Domingueiras, com o MeninXs na Rua ou mesmo com o Olha! Recife, que é um programa oficial e gratuito, com direito a cicerone e que é destinado a quem deseja conhecer melhor a chamada Veneza Brasileira. No último dia 20, tivemos mais uma edição das Domingueiras. Coordenador do grupo, Francisco Cunha nos mostrou como é rica e diversificada arquitetura do Recife. Por exemplo: No bairro do Derby, em um pequeno trecho, encontramos exemplares de três tipos de arquiteura: neocolonial, eclética, art déco e moderna.
Vamos conferir o que a gente viu, ali bem pertinho da Praça do Derby e do Rio Capibaribe? Naquele pequeno perímetro, nossa primeira parada foi no casarão onde funciona o Memorial de Medicina, sede da antiga Faculdade de Medicina do Recife (foto acima). A casa, concluída em 1927, tem a assinatura do engenheiro italiano Giácomo Palumbo, “um eclético típico”, segundo nosso arquiteto guia. O casarão, com 3.491 metros quadrados foi tombado em 1986. Mas segundo a Fundarpe, o prédio “é um dos poucos exemplares da arquitetura neocolonial no Recife”. O estilo, inspirado nas construções sacras e civis do período colonial, é voltado para a arquitetura de raízes. O seu pátio interno lembra o de algumas igrejas. Mas o exterior, tem mistura de estilos. Há quem ache que o Memorial é eclético. Cunha é um deles.
Eclético ou neocolonial, o Memorial merece ser visitado. É um lindo prédio. Quase vizinho, fica o Pavilhão Luís Nunes, antigo Pavilhão de Verificação de Óbitos da Faculdade de Medicina do Recife. É uma das obras assinadas no Recife pelo arquiteto Luís Nunes (1909-1927), e tem muita importância para a história da nossa arquitetura. É um dos primeiros edifícios modernistas erguidos na década de 1930, no Brasil, sob influência da arquitetura de Le Corbusier (1887-1965). O suíço, naturalizado francês, é tido como uma das figuras mais importantes, talvez a mais importante, da arquitetura moderna. O Pavilhão, felizmente é tombado desde 1984, o que significa dizer que não pode ser destruído. Hoje o Pavilhão é sede do Instituto dos Arquitetos do Brasil/ Pernambuco.
Ainda lá, bem pertinho, encontramos o Edifício Ullysses Pernambucano, onde funciona a Fundação Joaquim Nabuco. Este, que passou recentemente por reforma, foi construído no estilo Art Déco, movimento artístico que surgiu em meados da segunda década do século passado. O prédio foi erguido em 1930, para funcionar como escola de aprendizes artífices (onde se aprendia atividades como alfaiataria, carpintaria, marcenaria, serralharia, etc). Possui vitrais do alemão Heirich Moser, piso com ladrilhos cerâmicos e um jardim interno. É lá que funciona o Cinema da Fundação. Ele representa uma transição entre o estilo praticado na época – o ecletismo – e o que dominaria depois, pelas décadas seguintes, o modernista. O Ullysses Pernambucano, da Fundaj, é considerado Imóvel Especial de Preservação desde 1996. Ainda bem.
Leia também:
Na rota dos velhos casarões
Imóveis em ruínas nas Graças
Casas modernistas ganham mobilização
Hotel do Parque sem memória
Bonde virou peça de museu e trilhos somem das ruas do Recife sem memória
Que saudade da Rua Nova
Quem passa nessa calçada, no Centro?
Praça Fleming e o Recife sem memória
Moradores cuidam da Praça Fleming
O cuidador da Praça Fleming
Serviço:
Memorial de Medicina – Rua Amauri de Medeiros, 206, Derby
Pavilhão Luis Nunes – Rua Jenner de Souza, 130
Edifício Ullysses Pernambucano/ Fundaj – Rua Henrique Dias, 609, Derby
Texto e fotos: Letícia Lins/ #OxeRecife
O prédio da antiga Faculdade de Medicina, hoje memorial da Medicina, no Derby, a meu ver deve ser classificado, grosso modo, como pertencente ao “gênero” eclético, muito embora seja também considerado neocolonial, ao que faz crer, com mais influências ou características “hispânicas” do que “brasileiras”. Talvez o arquiteto Giácomo Palumbo, grego com cidadania italiana e formado pela Escola de Belas Artes de Paris, tendo chegado ao Recife em 1918, tenha sido influenciado pela pregação neocolonial bem intensa da época, e tenha tentado projetar o prédio com essas características (o projeto, tudo indica, deve ser de 1925). A pregação neocolonial vinha do Rio de Janeiro sob a forte influência argumentativa de José Marianno Filho que a fez vitoriosa ao praticamente definir esse estilo como o “oficial” da Exposição Internacional do Centenário da Independência em 1922. Palumbo projetou a faculdade logo em seguida ao projeto que fez para o Palácio da Justiça, este, sem dúvidas, totalmente eclético (o projeto deve ser de 1924, um ano antes da faculdade, portanto). Mas, com o objetivo de jogar mais luz sobre essas questões, estou projetando para breve uma caminhada exclusivamente dedicada ao estilo neocolonial na nossa cidade onde os exemplos são poucos e dispersos. Mas vamos fazer!
Você sempre nos ensinando, Francisco!